Práticas de resiliência e transformação em comunidades ribeirinhas amazônicas


"Lucileyde Feitosa Sousa

Fundação Universidade Federal de Rondônia,
Departamento Acadêmico de Geografia, Porto Velho, RO, Brasil.
ORCID: 0000-0003-2627-0925

Nelson Rego

Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Instituto de Geociências, Porto Alegre, RS, Brasil.
ORCID: 0000-0002-1690-0615

Recibido: 2 de abril de 2024. Aceptado: 24 de julio de 2024.

Resumo

O artigo expõe e reflete sobre práticas desenvolvidas por duas comunidades de ribeirinhos da Amazônia, no município de Porto Velho, Rondônia, e sobre projeto universitário de pesquisa, ensino e extensão que observa e interage com essas práticas. As comunidades de São Carlos e Cavalcante, à semelhança do conjunto das comunidades ribeirinhas na Amazônia Legal, sofrem pressões movidas por ocupações ilegais de terras públicas, desmatamento predatório, garimpagem e outros impactos sobre seu modo de vida associado à natureza. Além dessas agressões, as duas comunidades são continuamente desassistidas por políticas públicas, no sentido da carência na acessibilidade a serviços de saúde, educação e outros requisitos básicos. Os ribeirinhos manifestam práticas de resiliência e, junto aos pesquisadores, eles têm desenvolvido diálogos que tratam de questões acerca desse quadro adverso, vertendo suas compreensões para a forma de ações com intenção transformadora.

Palavras-chaves: Impactos socioambientais. Políticas públicas. Diálogo. Ação.

Practices of resilience and transformation in amazonian riverside communities

Abstract

This article reveals and reflects on practices developed by two riverside communities in the Amazon, in the municipality of Porto Velho, Rondônia, and on a university research, teaching and extension project that keeps track of and interacts with these practices. The communities of São Carlos and Cavalcante, like all riverside communities in the Legal Amazon, are under pressure from illegal occupations of public lands, predatory deforestation, mining and other impacts on their nature-related way of life. In addition to these attacks, the two communities are continually unassisted by public policies, in the sense of a lack of accessibility to health services, education and other basic needs. Riverside dwellers demonstrate resilience practices and, together with researchers, they have advanced in conversations that address issues surrounding this adverse situation, translating their understandings into actions with the intent of transforming this situation.

Keywords: Socio-environmental impacts. Public policy. Conversation. Action.

Prácticas de resistencia y transformación en comunidades ribereñas amazónicas

Resumen

El artículo describe y reflexiona sobre las prácticas desarrolladas por dos comunidades ribereñas de la Amazonia, en el municipio de Porto Velho, Rondônia, y sobre el proyecto universitario de investigación, enseñanza y extensión que observa e interactúa con dichas prácticas. Las comunidades de São Carlos y Cavalcante, al igual que el conjunto de las comunidades ribereñas en la Amazonia Legal, enfrentan presiones movidas por ocupaciones ilegales de tierras públicas, deforestación depredadora, minería y otros impactos sobre su modo de vida vinculado a la naturaleza. Además de estas agresiones, ambas comunidades son continuamente desasistidas por políticas públicas, en el sentido de que carecen de acceso a servicios de salud, educación y otros requisitos básicos. Los ribereños manifiestan prácticas de resiliencia y, junto con los investigadores, han desarrollado diálogos que abordan los asuntos relativos a esta situación adversa, vertiendo sus entendimientos en forma de acciones con intenciones transformadoras.

Palabras clave: Impactos socioambientales. Políticas públicas. Diálogo. Acción.

Introdução

Os objetivos deste artigo são expor e refletir sobre práticas desenvolvidas por duas comunidades de ribeirinhos amazônicos e sobre o projeto Práticas de Resiliência e Territórios de Comunicação nas Comunidades Ribeirinhas, no Município de Porto Velho, Rondônia. Quanto ao expositivo, buscaremos contribuir para comunicar – tornar visíveis – as precárias condições socioambientais em que vivem as populações ribeirinhas enfocadas, assim como suas práticas de resiliência e de diálogos formuladores de ações. Quanto ao reflexivo, nossa intenção é associar a exposição do quadro a uma abordagem conceitual que relacione a geografia à educação, pois a interrelação teórica e prática entre essas duas áreas constitui o cerne do projeto.

Desde 2021, vêm sendo desenvolvidas atividades marcadas por três motivações. A primeira, conhecer e acompanhar as condições de vida das populações ribeirinhas em Porto Velho, continuamente desassistidas por políticas públicas, no sentido da carência na acessibilidade a serviços de saúde, educação e outros requisitos básicos. A segunda motivação deriva do contato diário que constata que a pesquisa sobre essa realidade amazônica contribui para transformá-la, ao evidenciar que as práticas de resiliência, diálogo e ação que estão a caracterizar as comunidades ribeirinhas podem subsidiar reformulações de políticas públicas. O contato frequente que sustenta a constatação dessa possibilidade situa-se em trabalho de ensino, pesquisa e extensão realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rondônia (UNIR), aos quais unem-se pesquisadores de outras instituições. A terceira motivação é agregar pesquisadores por meio do diálogo com diferentes instituições do ensino superior e da educação básica, promovendo essa rede de pesquisa e mobilização educacional em prol de populações ribeirinhas da Amazônia, contribuindo para a prática da cidadania.

O projeto concilia grupo pequeno com diversidade de áreas de conhecimento – geografia, educação, jornalismo, direito. A equipe é composta pela presença de professores e estudantes de graduação e pós-graduação e por egressos da UNIR. Os pesquisadores mantêm-se atentos à condição de que o trabalho com populações ribeirinhas requer a compreensão de que sua vivência do tempo pode ser diferenciada em relação à qual estamos habituados. O principal risco seria o da insensibilidade não perceptiva do viver sem pressa. A falta de sintonia bloquearia a compreensão dessa cultura que se expressa num cotidiano no qual não é preciso “correr pela vida”, pois a vida já está dada no modo ecológico da relação social com a natureza.

No entanto, é a perda gradativa dessa vida que também se apresenta no contexto ribeirinho – perda constatada em aceleração no seu dia a dia. Tanto a perda quanto o modo tradicional de viver são temas do diálogo processado entre ribeirinhos e pesquisadores.

A perda está vinculada ao que Navarro e Pineda (2009) caracterizam como embate ambiental entre o mundo vivo – humano e não humano – e a fase atual do avanço dos processos de expulsão territorial de povos e de acumulação capitalista na América Latina. No centro desse embate está a contradição entre capitalismo e natureza, com a lógica da acumulação conduzindo a apropriação da natureza por duas vias: 1) como objeto a ser conhecido e mensurado por ciências fundadas sobre um viés estritamente instrumental, do qual são afastadas perspectivas conjuntivas do social, do natural e do valor da vida; 2) como matéria-prima, cuja extração desconsidera a complexidade dos ecossistemas e as consequências para as vidas humanas e não humanas atingidas por modos predatórios de apropriação. Nesse processo, a natureza passa a ser percebida por um viés que a desnaturaliza, tornando-a não mais que mercadoria e recurso para produção de mais mercadorias num sistema que gradativamente tende a concentrar não apenas renda, propriedade territorial e poder de decisão, mas também a produção da subjetividade, a partir de centros que formam a visão sobre o “distante”, sobre o outro que não é o dominante, sobre o “primitivo” e “atrasado”.

Harvey (2005) observa que a fase avançada do capitalismo global reproduz processos anteriores da acumulação originária que caracterizou sua história. Desse modo, há um predomínio da acumulação por expropriação nas últimas fronteiras incorporadas ao avanço territorial do capitalismo global, o que afeta sobremodo ecossistemas e populações indígenas e camponesas na América Latina. Sobre os territórios dos “primitivos”, entra em ação o capitalismo de face antiga a serviço dos estágios superiores da globalização dita a mais moderna. Assim, a expulsão à força de populações indígenas e camponesas é efetivada para que a acumulação se realize por meio da apropriação e mercantilização de terras. Os direitos comunais de propriedade são substituídos por direitos de propriedade privada e, em apoio à privatização, são introduzidas políticas e legislações que passam a implantar e a regular a supressão de acessos a bens naturais antes compartilhados, assim como a mercantilização da força de trabalho e a supressão de formas alternativas indígenas e camponesas para a produção e o consumo, chegando, no extremo, a engendrar novas formas de escravismo.

Em resposta às consequências da mercantilização da vida, disseminam-se, na América Latina, manifestações populares que expressam enfrentamentos às agruras advindas da expropriação de terras e do trabalho, da contaminação de solos e terras, da rapinagem dos recursos naturais e dos bens coletivos. Tais manifestações se expressam tanto na forma de movimentos organizados e de grande abrangência escalar quanto sob o aspecto da multiplicidade de resistências pontuais, a partir de questões específicas de suas respectivas comunidades, apresentando graus variados de mobilização e abrangência. A expansão dos conflitos socioambientais na América Latina é caracterizada por Svampa (2017) como relacionada a interesses divergentes quanto a questões de acesso e controle ao território e seus bens naturais, sendo a disputa travada entre atores sociais com grande assimetria de poder. Assim, sendo questão na qual, para uns, o interesse está no acréscimo de acumulação, enquanto, para outros, é colocada em perigo a própria vida, a constatação da assimetria de poderes entre os envolvidos remete ao exame da dimensão política mais abrangente:

Dichos conflictos expresan diferentes concepciones sobre el territorio, la naturaleza y el ambiente; así como van estableciendo una disputa acerca de lo que se entiende por Desarrollo y, de manera más general, por Democracia. Ciertamente, en la medida en que los múltiples megaproyectos tienden a reconfigurar el territorio en su globalidad, no sólo se ponen en jaque las formas económicas y sociales preexistentes, sino también el alcance mismo de la Democracia, pues aquellos se imponen sin licencia social, generando fuertes divisiones en las poblaciones y una espiral de criminalización y represión de las resistencias. (Svampa, 2017:80)

Para Navarro e Pineda (2009), em síntese, o que a expansão dos conflitos socioambientais coloca em evidência é a contradição básica entre capitalismo e natureza, pois os ciclos de reprodução da natureza não coincidem com a aceleração da reprodução ampliada do capital, o que conduz a uma degradação do biológico, concebido como objeto e recurso sobre o qual incidem os interesses da acumulação. Em resposta, surge uma política da vida:

La autoconvocatoria de los afectados se da, principalmente, ante la reacción espontánea que generan los procedimientos antidemocráticos, irregularidades e ilegalidades, presentados, en la mayoría de los casos, por los gobiernos que buscan apresurar decisiones fundamentales para la implementación de los proyectos de desposesión. (Navarro e Pineda, 2009:94)

Considerando essa política da vida e, em específico, as populações amazônicas às quais se direciona o projeto Práticas de Resiliência e Territórios de Comunicação nas Comunidades Ribeirinhas, no Município de Porto Velho, Rondônia, destacamos a importância do dialógico, caracterizado por Sousa (2014) como uma zona de respeito mútuo e, em decorrência, confiança, na qual o pesquisador não se esquiva do cuidado preventivo relacionado a possíveis consequências de sua investigação, compreendendo que sua relação com os outros foi estabelecida dentro de um contexto sócio-histórico que pode conter tensas contradições.

Os objetivos inicialmente expostos para a escrita deste artigo são derivados dos objetivos do projeto de pesquisa e extensão. O objetivo central do projeto de pesquisa é compreender as práticas de resiliência desenvolvidas pelas duas comunidades ribeirinhas no contexto de expansão dos conflitos socioambientais na Amazônia – práticas de resiliência nas quais a dimensão comunicacional vem ganhando importância, conforme será refletido no corpo deste texto. O objetivo da extensão é estabelecer de modo institucional a continuidade de trocas inicialmente demandadas espontaneamente pelos moradores das comunidades aos pesquisadores. Tais trocas referem-se à construção conjunta de instrumentos didáticos que tenham por temas as questões das comunidades e sejam produzidos a partir do diálogo dos pesquisadores com as comunidades e para as comunidades. As trocas referem-se também à demanda das comunidades aos pesquisadores para que estes permaneçam em interação de pesquisa com a população, pois a relação dialógica favorece a dimensão comunicacional das práticas de resiliência tanto internamente às comunidades quanto na comunicação destas em outras escalas. O que iniciou a partir de um interesse de pesquisa se tornou demanda por prosseguimento do diálogo entre universidade e comunidades ribeirinhas e, assim, surge a necessidade de sustentar a continuidade das trocas por meio de constituir institucionalidade extensionista para o que se manifestou espontaneamente no decorrer de fases anteriores dos contatos. Os pesquisadores buscam a observação participante que visa amalgamar prévios interesses de pesquisa com aberturas para o que não fora previamente concebido e que se apresenta ao longo da interação dialógica. Assim, para os pesquisadores, podem surgir metas inicialmente não concebidas e a partir de demandas apresentadas pelos ribeirinhos, que, na confiança construída, compreendem que não apenas eles podem atender aos interesses dos pesquisadores, mas, reciprocamente, os pesquisadores podem atender a solicitações.

Breve caracterização da área e de seus conflitos

A Amazônia Legal foi instituída pela Lei 1.806, de 6 de janeiro de 1953, com a finalidade de estabelecer uma delimitação para políticas econômicas e de soberania territorial (BRASIL, 2023). A região inclui os estados de Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Roraima e Rondônia e porções dos estados de Maranhão, Mato Grosso e Tocantins (Figura 1). Nela, encontram-se três biomas, Amazônia, Cerrado, Pantanal, sendo a floresta amazônica o bioma que recobre a maior parte da região, cuja área ultrapassa os 5,2 milhões de km² e corresponde a aproximadamente 61% do território (Amazônia 2030, 2024). Os habitantes da Amazônia Legal totalizaram 28,1milhões em 2020, com densidade demográfica de 5,6 habitantes por km², correspondendo a 13% da população brasileira, e produto interno bruto de R$ 613,3 bilhões, representando 8,7% do PIB do Brasil (Amazônia 2030, 2024). São díspares as condições de vida dessa população, indo desde extratos de alta renda em grandes centros urbanos até contingentes pauperizados nesses mesmos centros, como também populações ribeirinhas distribuídas de maneira esparsa ao longo dos principais rios e de seus afluentes e igarapés.


Figura 1. Amazônia Legal. Fonte: IBGE, Cartas e mapas, 2024.

Para as populações ribeirinhas, os cursos d’água, com suas variadas dimensões, são as vias de comunicação que conectam povoados e cidades de hierarquias diversas, possibilitam acesso a recursos naturais e a bens e serviços produzidos pela sociedade. Contudo, para essas populações, o acesso aos serviços públicos é precário na maior parte das vezes.

O município de Porto Velho, na margem direita do rio Madeira, apresenta área de 34.096 km2, com aproximadamente 460 mil habitantes (IBGE, 2023). O projeto é desenvolvido nas comunidades de São Carlos e Cavalcante (Figura 2), sendo intenção ampliar as ações a outras localidades, com base na experiência adquirida nas duas iniciais comunidades ribeirinhas que acolheram nossa presença e proposta interativa.


Figura 2. Localização de São Carlos e Cavalcante. Autora: Nathany Blank.

Na Amazônia Legal, as comunidades ribeirinhas enfrentam pressões causadas pela ocupação ilegal de terras públicas e pelos desmatamentos predatórios. É comum a ocupação privada e ilegal de terras públicas por meio de invasões patrocinadas por fazendeiros, que contratam milícias de pistoleiros para assegurar a posse, muitas vezes deflagrando conflitos que resultam em assassinatos de lideranças e trabalhadores ligados aos movimentos sociais. Após algum tempo de uso econômico da terra, os “empreendedores” obtêm junto ao Estado a regularização fundiária da área ocupada, na qual, em grande parte das vezes, desenvolvem atividades prejudiciais ao meio ambiente, como desmatamentos, queimadas em larga escala, pastagens e monoculturas, que expõem o solo à erosão decorrente das volumosas chuvas equatoriais e tropicais, causando perdas massivas deste. Diante do esgotamento e da perda de solos, é prática comum entre os fazendeiros repetir o processo, avançando sobre novas terras. Um discurso de dupla face “legitima” o avanço predatório: 1) trata-se de produzir riqueza “nacional” onde “nada” era produzido; 2) a natureza que sustenta a mais exuberante floresta do planeta é “inesgotável”.

Com base nos dados de censos agropecuários, Oliveira (2020) demonstra a crescente concentração fundiária no Brasil, expressa pela relação inversa entre o menor número de grandes propriedades com finalidade de acumulação capitalista e a maior quantidade de hectares a elas subordinados, comparativamente ao maior número de propriedades associadas à produção camponesa de alimentos e o menor número de hectares disponíveis a estas. Nos dados do último censo agropecuário, de 2017, constata-se o recorde dessa relação invertida: aproximadamente 253,5 milhões de hectares pertencentes à agricultura capitalista, não necessariamente voltados à produção alimentar, concentrados sob o domínio de 809 mil propriedades, enquanto 4,3 milhões de propriedades camponesas dispunham de somente 80 milhões de hectares. Em referência às recentes conjunturas do governo federal, que se entendeu do segundo semestre de 2016 até o final de 2018 e do governo federal subsequente, iniciado em 2019, Oliveira (2020) destaca a celeridade com que foram efetivadas medidas governamentais para regularizar a posse ilegal de grandes extensões de terras públicas em favor de usurpadores, especialmente no período com início em 2019:

Depois que passou este curto governo de dois anos, iniciou outro em 2019, eleito para quatro anos, que tratou de empossar no cargo de secretário especial da Secretaria Especial de Assuntos Fundiários – SEAF/MAPA, ninguém mais ninguém menos do que Luiz Antônio Nabhan Garcia, que se apresentou com um currículo onde se encontrava o cargo que ocupava antes de assumir a Secretaria: ‘Presidente da União Democrática Ruralista – UDR – Brasília – DF – período: 30 de março de 2013 a 31 de dezembro de 2018’. Essa pessoa é a responsável pelas ações do governo federal atual com relação às medidas fundiárias. É uma espécie de ‘raposa tomando conta do galinheiro’. (Oliveira, 2020:13)

Quanto ao processo histórico no qual a recente conjuntura referida por Oliveira está ancorada, Prieto enfatiza o imbricamento entre o Estado e a usurpação capitalista de terras, que, no Brasil, ganhou o nome de grilagem:

Ressalta-se que, historicamente, os proprietários de terra — e progressivamente a burguesia durante o século XX —, por meios próprios e a partir dos legisladores e operadores do Direito que os representavam no bloco de poder que domina o Estado, não se contentaram em apenas impossibilitar determinadas classes e povos de pertencer à esfera legal e considerada legítima da sociedade de direitos. Estes elevaram suas próprias classes aliançadas à condição única de se valer das leis e da primazia política do funcionamento das engrenagens do Estado e dos privilégios sociais de garantia de direitos. Trocando em miúdos, os objetivos desse aliançamento que dirige o Estado capitalista no Brasil são: juridicamente, legalizar a grilagem de terras e, socialmente, legitimá-la. Trata-se, assim, não só de garantir leis que transfigurem grilos em propriedades privadas capitalistas, mas de produzir a ideologia da legitimidade social do sujeito proprietário (os assim chamados conquistadores, desbravadores, donos, pioneiros e/ou bandeirantes) e da inviolabilidade da propriedade adquirida pelo suposto fruto do trabalho, do merecimento e do esforço pessoal ou familiar. Esse processo produz a figura do proprietário, oculta a história de genocídios e grilos operados e institui os que reivindicam a posse da terra para trabalho e moradia como invasores. (Prieto, 2020:133)

O quadro nacional adverso às pequenas agriculturas familiares ganha nuances variadas conforme os caracteres regionais presentes no território brasileiro e, simultaneamente, as agressões atingem não apenas os camponeses, mas também os indígenas. Na vasta região amazônica, à usurpação de terras públicas e ao desmatamento predatório associado a esta, soma-se o forte impacto do garimpo ilegal sobre os modos de vida vinculados à natureza mantidos por ribeirinhos e indígenas. Tais agressões não precisam acontecer dentro dos limites onde se assente determinada comunidade para que os malefícios sejam sentidos; as consequências socioambientais do que é cometido nas cercanias acabam por atingir a totalidade dos povos da floresta.

As comunidades de São Carlos e Cavalcante habitam, respectivamente, em terras de várzea, na margem esquerda do Rio Madeira, e em terras firmes, na margem direita e na proximidade do rio. De águas claras no período das vazantes e cor barrenta nas cheias, o rio é essencial às vidas de pescadores, barqueiros, extrativistas e suas famílias, que vivem em pequenos grupos espalhados no ambiente florestal e fluvial que circunda os povoados. Ambas as comunidades se caracterizam por fluxos frequentes de pessoas ao centro de Porto Velho, quando necessitam comprar artigos comerciais ou em busca de serviços bancários, médicos e outros. O deslocamento de São Carlos ao centro urbano do Município de Porto Velho demanda de cinquenta a noventa minutos de voadeira1, dependendo da potência do motor, ou duas horas de ônibus, atravessando a ponte e seguindo por estrada de terra, na qual se apresenta o dilema de ou fechar as janelas e suportar o calor extenuante ou abrir as janelas e suportar a poeira. Para os moradores de Cavalcante, os deslocamentos demandam trinta minutos a mais de voadeira ou as mesmas duas horas de ônibus, nas mesmas condições de estrada.

São Carlos é um distrito com população aproximada de 2.100 habitantes, segundo dados colhidos pelos pesquisadores junto à Unidade Básica de Saúde. A comunidade se situa vizinha à Reserva Extrativista do Lago do Cuniã e, na margem oposta, está a foz do Rio Jamari, afluente do Rio Madeira, razão pela qual o povoado é também conhecido como São Carlos do Jamari. O distrito tem sua formação histórica ligada aos ciclos da borracha, quando o abastecimento era realizado por navio a vapor. Hoje, segundo relatos dos moradores e dados fornecidos pelo Napra (2024), Núcleo de Apoio à População Ribeirinha da Amazônia2, as atividades da comunidade são caracterizadas pela pesca tradicional, pela agricultura de subsistência (na várzea e nas terras firmes) e pelo extrativismo, com destaque para a castanha e o açaí. Uma parcela da população é composta por funcionários públicos dos setores de educação e saúde. Há também moradores que se dedicam a comércios, como mercearias. Por ocasião da enchente de 2014, a área da comunidade foi considerada inapropriada para habitação pela Defesa Civil de Porto Velho, devido à contaminação do solo por mercúrio e outros elementos utilizados no garimpo ilegal e transportados pela elevação das águas. Contudo, a população resistiu à cogitação de mudança proposta pelo poder público e reconstruiu suas casas, mantendo-se em seu mesmo local de vida cotidiana, fato que evidencia dois aspectos reveladores de contradição: o elo afetivo ao lugar e a dificuldade de encontrar alternativas de fato favoráveis para onde habitar.

A comunidade de Cavalcante está rodeada pela Floresta Nacional de Jacundá, sendo constituída por cerca de 800 habitantes, segundo depoimentos locais. O povoado está localizado em um antigo seringal e parte de seus moradores veio oriunda de São Carlos, após a grande inundação de 2014. Por ocasião do evento, populações ribeirinhas das comunidades vizinhas abrigaram-se na localidade de Cavalcante, situada nas terras firmes, e, após a descida das águas, várias permaneceram, dando origem ao povoado. Tal como em outras comunidades ribeirinhas, em Cavalcante, os habitantes pescam, coletam na floresta, cultivam e mantêm pequenos negócios, sendo comum que uma mesma pessoa desenvolva duas ou mais dessas atividades, ajudando a compor a renda familiar, conforme relatos dos moradores aos pesquisadores, o que é corroborado pelo Napra. De modo ainda mais perceptível que em São Carlos, a população de Cavalcante sobrevive desassistida pelo poder público. Em Cavalcante não há escolas, sendo que São Carlos, na outra margem do Rio Madeira, é o principal destino para o qual os escolares se deslocam diariamente. Também não há Unidade Básica de Saúde em Cavalcante e, novamente, é o distrito de São Carlos que recebe os moradores da outra margem que necessitem de atendimento médico.

Em ambas as comunidades, observa-se a população desprovida de serviços básicos, como as carências no acesso à água potável, redes de esgoto, transporte público fluvial e coleta de resíduos sólidos. A garimpagem demonstra de modo notório comentário anterior, sobre uma agressão não precisar ser praticada dentro de determinada área para que efeitos nefastos sejam sentidos. Assim, em São Carlos e Cavalcante, a exemplo de tantas comunidades ribeirinhas amazônicas, constata-se a poluição hídrica decorrente do derramamento de óleos nas atividades garimpeiras, com a consequente contaminação dos lençois freáticos por agentes químicos transportados pelas águas. Instaura-se o quadro paradoxal de populações que habitam à beira do maior sistema fluvial planetário e subexistem com seu acesso à água potável gravemente comprometido, conforme vários registros midiáticos, a exemplo da reportagem realizada por Cruz (2023).

As adversidades são acentuadas pela usurpação de terras, que, de modo similar aos efeitos do garimpo ilegal, não precisam ocorrer diretamente em determinado local para gerarem consequências nefastas a esse local, pois o desflorestamento predatório ocasiona uma perda de biodiversidade que se refletirá em todo o bioma regional, assim como as violências por disputas de posses também se refletirão em expulsões territoriais, deslocamentos populacionais e tensões sociais disseminadas.

Ao longo do tempo, as políticas públicas têm se mostrado insuficientes e até mesmo débeis para reverter o quadro de carências e acirramento de agressões na Amazônia. Por vezes, não apenas débeis, mas, sim, cúmplices, conforme observado no âmbito da política federal nos anos de 2019, 2020, 2021 e 2022, quando foi consentida a conivência governamental a desflorestamentos predatórios, garimpos ilegais e genocídio de populações indígenas.

Em Rondônia, as políticas públicas têm se mantido insuficientes tanto para prover o acesso a serviços básicos quanto para conter o quadro de tensão social decorrente de agressões a populações ribeirinhas e indígenas por processos ilegais de ocupação. Conforme pesquisa promovida pela Comissão Pastoral da Terra (2023), Rondônia foi o estado brasileiro com o maior número de pessoas assassinadas em consequência de conflitos territoriais rurais em 2022. Gadelha Júnior (2019) observa que as retiradas de comunidades de seus ambientes – sejam causadas por ações ilegais e violentas ou por remanejamentos promovidos por sucessivos governos – produzem não apenas deslocamentos espaciais, mas danos à economia de subsistência adaptada ao ecossistema.

Resiliência

Em face do exposto, o projeto Práticas de Resiliência e Territórios de Comunicação nas Comunidades Ribeirinhas no Município de Porto Velho, Rondônia, busca compreender a dinâmica comunicacional que os habitantes de São Carlos e Cavalcante estabelecem face às carências e às agressões socioambientais. Nessa dinâmica, eles resgatam a convivência que sempre mantiveram com a água e a floresta, desenvolvendo diferentes habilidades ligadas ao extrativismo florestal (destaque para a castanha e o açaí) e às atividades de pescaria, caça, construção de embarcações de madeira, técnicas de plantio nas várzeas e nas terras firmes (destaque para a mandioca e a produção de farinha). Com isso, os ribeirinhos contrapõem seu tradicional modo de viver adaptado ao ecossistema ao modo invasor e antagônico. Em relação ao tradicional, eles concebem que estão associados seus ritmos temporais, suas feições espaciais e suas formas de inclusão societária. Ao modo invasor, eles identificam a devastação e o acirramento de carências e exclusões.

Os ribeirinhos amazônicos são caracterizados por Silva e Silva (2002) como um povo com origem nos migrantes advindos da Região Nordeste do Brasil durante os ciclos da borracha no século XIX, portanto, anteriores às grandes correntes migratórias para a Amazônia ocorridas a partir da segunda metade do século XX. Esse povo se reproduziu a partir de divisões familiares e, assim, apresenta fartas ramificações de parentesco. Ao mesmo tempo, miscigenaram-se amplamente com as populações indígenas, formando a cosmovisão que Silva e Silva caracterizam como marcada pela onipresença das águas e da floresta, com sua economia familiar e comunitária intrinsecamente ligada à pesca, à coleta, à agricultura de subsistência e às lidas com madeiras. Sousa (2014) enfatiza a cultura que se desenvolveu, a poética singular de seu imaginário transmitido e recriado nas gerações pela oralidade, e que manifesta o modo de vida adaptado ao ambiente.

Procuramos compreender as populações ribeirinhas imersas não apenas na natureza amazônica, mas na contradição planetária socioambiental referida por Porto-Gonçalves (2017), na qual formas societárias periféricas e não hegemônicas são atreladas ao sistema econômico e político hegemônico. Os “de baixo” fornecem importantes aportes à acumulação apropriada pelos “de cima”, num circuito produtor de desigualdades e de pressões sobre o cotidiano e de invisibilidades para os que sofrem as agruras.

O propósito de comunicar e refletir sobre as práticas de resiliência nas comunidades ribeirinhas nos leva a formular duas principais questões investigativas: como é a comunicação que as comunidades ribeirinhas estabelecem sobre os riscos socioambientais que atingem seus lugares de vida? Quais ações as comunidades realizam para enfrentar e superar os riscos?

Face a essas perguntas, constatamos que a comunicação entre os ribeirinhos assume uma dimensão de resiliência diante das agressões. A comunicação mobiliza e agrega as comunidades. Externamente, busca romper a invisibilidade à qual os não hegemônicos são relegados. Diferentes modos de mídias podem ajudar na divulgação das vozes ribeirinhas, fomentando mobilizações e solidariedades que ligam o que é interno às comunidades ao externo em variadas escalas. O projeto procura auxiliar na divulgação das vozes ribeirinhas.

Tais vozes ajudam a contrapor uma cultura de valores a outra cultura de valores. Nesse embate, recorremos a Claval (2007) para lembrar que a cultura corresponde não apenas a comportamentos, conhecimentos e saberes enfeixados em valores, transmitidos e recriados pelas gerações, mas também a modos de relações das sociedades com a natureza por esses modos transformada. A defesa de práticas socioambientais manifestadas pelos ribeirinhos ganha dimensão de resiliência e de elo afetivo aos seus lugares de vida – afetivo e simultaneamente afirmativo da disposição de luta para manterem seus territórios.

Compreender a condição humana pressupõe examinar os contextos históricos e geográficos das relações sociais, dedicando observação atenta, ao invés de negligência, às práticas vividas, às linguagens locais e às ressignificações processadas por povos acerca de seus lugares e de seu modo de estar no mundo. Essa perspectiva enfeixa dados da história que produzem o espaço, compreendendo como vazia de substância a narrativa que omita a respectiva produção espacial. Santos (2007) destaca cidadania e cultura como processos integradores de significações múltiplas e contraditórias, remetendo à compreensão do viver como movimento des/equilibrado entre pressões opostas e em constante busca de soluções provisórias em meio a práticas sociais. A cultura fornece sentidos para efetivar o pertencimento do indivíduo a grupos que, por sua vez, podem ou não estender o sentimento de pertença a determinados contextos espaciais. Face à subordinação de todos os espaços à acumulação capitalista, os elos afetivos de indivíduos e grupos a seus lugares passam a constituir eixo central para pensar os embates sobre as finalidades às quais a produção do espaço atende: crucialmente, espaços para a vida ou para a acumulação? A cultura, pois, vem participar de modo fundamental das disputas pelos sentidos da produção do espaço. A comunicação das resiliências do povo ribeirinho traz de maneira acentuada cores, sons, cheiros e todas as sensações vibráteis do espaço vivido e dos sentimentos que formam as comunidades e, ao mesmo tempo, são formados nas comunidades. Comunicar alegrias associadas ao afeto pelo lugar e disposição para a disputa territorial efetivam-se como integrantes do exercício da cidadania.

As populações ribeirinhas amazônicas são possuidoras de uma cultura singular que, para o olhar atento de Claval (2009), merece ser acolhida por pesquisas acadêmicas e olhares da mídia não somente pela notória dimensão ambiental, mas igualmente pelos valores e práticas com os quais os ribeirinhos podem inspirar o necessário repensar sobre o mundo hegemonizado por uma irracional acumulação que processa devastação e desigualdades em tal monta que está a produzir riscos extremos para grandes conjuntos da humanidade e para a biodiversidade. Os bens simbólicos do povo ribeirinho mediam relações entre as pessoas e relações das comunidades com a natureza, sendo transmitidos e reconfigurados pelas gerações – e aí também está o processo em disputa, a temporalidade em que se processam as reconfigurações. No ritmo do viver que se harmoniza com o tempo da natureza e está enraizado na cultura dos ribeirinhos? Ou no frenesi da acumulação hegemônica que, de fora para dentro e de cima para baixo, avassala povos, impõe perdas naturais irreversíveis e esgarça o tecido cultural que sustenta a vida cotidiana? Quem determina as temporalidades? Quem determina o uso e a produção do espaço? Quem determina o que e para quem?

Krenak refere-se ao conflito nestes termos:

Como justificar uma humanidade se mais de 70% estão totalmente alienados do mínimo exercício de ser? A modernidade jogou essa gente do campo e da floresta para viver em favelas e em periferias, para virar mão de obra em centros urbanos. Essas pessoas foram arrancadas de seus coletivos, de seus lugares de origem, e jogadas nesse liquidificador chamado humanidade. Se as pessoas não tiverem vínculos profundos com sua memoria ancestral, com as referências que dão sustentação a uma identidade, vão ficar loucas neste mundo maluco que compartilhamos. (Krenak, 2019:14)

Essa perspectiva do conflito subsidia nossa compreensão da resiliência dos ribeirinhos como luta pelo direito do exercício de ser. Adotamos a concepção de resiliência conforme apresentada por Mendonça (2019), referente à resposta de indivíduos e grupos que conseguem gerar para si condições novamente favoráveis após sofrerem grave impacto natural ou social. Compreendemos a resiliência ribeirinha como um universo de afetos que se mobilizam diante de ameaças ao direito do exercício de ser. A luta é tanto para preservar quanto para recuperar o que foi perdido, e é tanto para defender quanto para avançar, pois a preservação só será possível se a vida ribeirinha se comunicar com o mundo, se conseguir sensibilizar o mundo circundante e, em alguma medida, transformá-lo. Nesse caminho de mão dupla, a vida ribeirinha também se reconfigura na relação com o mundo.

Ao exercício de ser expresso por Krenak, associamos o proposto por Nuñez, Urrutia e Benwell (2023) para uma política das coisas, referidas não segundo definições estanques sobre o que são, como se fossem sempre as mesmas e assim o fossem para todos, mas compreendidas no movimento em que sempre vão sendo na rede vibrátil e multifacetada das relações entre todos os humanos e todos os seres. A resiliência desenvolvida pelas comunidades ribeirinhas traz o elo afetivo ao lugar para o centro de uma política para a vida acolhedora de diferentes exercícios de ser. Assim, o lugar é entendido como um modo singular segundo o qual a trama material e simbólica do mundo se apresenta. Os lugares podem ser pensados como identidades ao mesmo tempo diferenciadas e interconectadas de uma totalidade em movimento – o lugar feito com um modo singular de conter a totalidade na qual está contido.

Adotamos igualmente as proposições de Rego (2010) acerca de três nexos entre educação e um olhar geográfico. Ele propõe esses três nexos como um explicitamento de sentidos discernidos como subjacentes em diversas práticas de movimentos sociais urbanos e agrários, assim como na educação popular em situações de ensino formal e não formal. Passamos, em seguida, a associar esses três nexos à compreensão da resiliência manifesta pelos ribeirinhos.

Diálogo e ação

O primeiro dos nexos refere-se à relação entre dois sentidos associados ao termo “meio”, que denota tanto o que está em torno de um ponto tomado como referência quanto o que está entre dois ou mais pontos. Rego propõe que o meio em torno remete ao conjunto articulado de relações que contextualizam material e simbolicamente a existência, condicionando o modo de ser de indivíduos e coletivos, enquanto o meio entre remete às mediações que situam indivíduos uns frente aos outros, como relações familiares, escolares e de trabalho. Um conjunto de meios entre é parte constitutiva de algum envolvente meio em torno, assim como cada meio entre é condicionado pelo contexto material e simbólico do meio em torno em que se situa. Rego enfatiza a possibilidade de elencar problemas e questões de um meio em torno como suportes para processos educacionais de meios entre em situações formais e não formais de educação. Isso implica valorizar temas e a cultura específica do mundo mais proximamente vivido, num diálogo que pode gerar pesquisas e ações relativas a problemas e questões do meio em torno. Por sua vez, o diálogo pode resultar – e frequentemente resulta – em retornos do que foi refletido no meio entre para o meio em torno, transformando-o em alguma medida. Essa consequência valoriza a perspectiva que indivíduos e grupos formam a respeito do mundo que está à sua volta e condiciona suas existências.

Desse modo, as circunstâncias encontradas no meio em torno simbólico e físico podem ser temas de diálogos e ações entre os envolvidos numa comunidade. O meio em torno inclui o conjunto de elementos físicos, tanto naturais quanto artificiais, e as relações dos indivíduos e grupos com esses elementos físicos também são mediadas pelas relações simbólicas estabelecidas pelos meios entre, por exemplo, ações baseadas em pensamentos e sentimentos relacionados ao ambiente. No diálogo e na ação, há uma tomada de consciência dos envolvidos a respeito de sua força de cidadania, pois processam um progressivo deslocamento da atenção sobre o tema conversado para a atenção sobre o próprio ato de dialogar que sustenta ações coletivas. Trata-se, assim, de um aprendizado sobre a capacidade de ação dos envolvidos, aprendizado que se efetiva na realização de esforços para melhorar as condições do espaço que contextualiza as existências, ao mesmo tempo em que os autores desses esforços também se transformam ao exercerem a participação para a transformação de seus espaços de vida.

Entendemos como exemplos esclarecedores de relações do meio entre com o meio em torno as manifestações de ribeirinhos sobre questões de seu cotidiano. Seu diálogo com os pares no interior das comunidades e com interlocutores externos (pesquisadores) forma um meio entre que faz da floresta, da água e da política pública as questões do meio em torno que se apresentam na conversação, na qual exercitam cidadania ao prepararem ações referentes tanto ao que repudiam quanto à defesa do que lhes é seu bem. Sousa (2022) compila essas manifestações na forma de apontamentos críticos: 1) a brutal contradição entre viver na maior bacia hidrográfica do planeta e a ausência de acesso à água potável de qualidade em um ambiente de crescente contaminação hídrica; 2) viver à beira dos caminhos fluviais e, no entanto, estar relegado ao semi -isolamento pelo serviço de embarcações motorizadas, que passam mais tempo em manutenção do que em funcionamento e, quando em operação, apresentam falhas; 3) viver na maior de todas as florestas, louvada nas mídias como bem universal, porém viver sob o paradoxo de esse mesmo bem ser convertido em atração para expropriadores e crimes ambientais que se misturam a violências contra indígenas e ribeirinhos. Esses são exemplos de eixos de conversação que mobilizam atitudes no meio entre para ações comunitárias relacionadas ao meio em torno.

O que fazer? A pergunta emerge forte no diálogo entre participantes que buscam conquistar o governo de suas próprias vidas e de seu mundo. Para isso, constroem compreensões sobre o contexto social de suas vidas e re/educam-se. Para o processo de compreender, o olhar geográfico tem muito a contribuir de modo decisivo.

O segundo nexo proposto por Rego é constituído por noções relativas à interpretação. Em ensaio produzido na forma de diálogo, Rego, Suertegaray e Heidrich (2001) aproximam a compreensão do espaço vivido à interpretação de um texto. Um texto somente “fala” mediante uma leitura e esta é indissociável das condições da interpretação realizada por um leitor. O texto é o que está oferecido como manifesto, camadas diversas do manifesto serão lidas de modos diversos por diferentes leitores. Por decorrência, a própria noção do que possa ser lido como um texto varia conforme o leitor. Se texto é aquilo que pode ser lido, então texto não é apenas aquilo costumeiramente definido como texto, mas aquilo perante o qual um leitor exerce a sua capacidade de leitura. Assim, por exemplo, a paisagem numa fotografia pode ser considerada texto e não apenas a página escrita que descreva e comente essa paisagem. Se a paisagem na fotografia pode ser texto, então o próprio espaço que foi apreendido na forma de paisagem pode também ser texto – texto em mutação para os olhos de leitores também em mutação. O segundo nexo proposto por Rego (2010) enfatiza que, no encontro entre olhar geográfico e processo educacional, um texto a ser lido é o meio em torno e essa leitura elegerá os fatos do mundo mais proximamente vivido como fatos a serem interpretados. Interpretar é condição necessária à ação proposta como reflexiva, que acontece quando os participantes realizam o movimento de retornar a atenção para eles mesmos, tomando consciência de sua força ao se interessarem por aprender não apenas sobre o tema conversado, mas também sobre a sua capacidade de agir com base na compreensão e no acordo construídos em diálogo. A consciência de sua capacidade liga-se com a consciência de que tanto agem sobre o mundo em seu redor quanto são mediados nas relações entre si e com outros pela formação – educação – que os constituiu nesse mesmo mundo proximamente vivido que passam a transformar.

Ações relacionadas ao futuro dos jovens são exemplo dessa leitura de mundo observada em ambas as comunidades. Para vários dos pais, estudar ainda não se tornara requisito para eles melhor se situarem socialmente quando jovens, tal como agora está posto para os filhos – a vida de antes estava mais circunscrita à comunidade ribeirinha. Na memória dos avós, mais se acentua essa diferença em relação aos dias de hoje. Em sua leitura, o atual requisito da escolaridade apresenta uma contradição: se ela significa acesso a possibilidades mais amplas para o situar-se na sociedade, a necessidade de cursar séries escolares é também a marca incontornável do avanço do mundo “de fora” sobre o anterior modo de viver ao qual estavam adaptados e que ainda buscam preservar. Sobre o mundo de agora lhes trazer simultânea e contraditoriamente as agressões e a escola, a escuta de suas falas indica um movimento de apropriação da escolaridade: suas crianças e jovens necessitam estudar para situar-se de maneira mais favorável na sociedade mais ampla e à qual o destino das comunidades está irreversívelmente ligado; suas crianças e jovens necessitam estudar para compreender a história amazônica dentro da história brasileira e mundial e defender o modo de vida ribeirinho das agressões, mostrar aos “de fora” os valores que o seu povo tem a inspirar ao mundo em risco.

Conforme os registros de Sousa (2022) sobre o cotidiano das comunidades, essa leitura de mundo embasa ações como reivindicar ao mesmo tempo transporte escolar fluvial e melhorias para as duas escolas públicas de São Carlos e implantação de escola em Cavalcante, pois as carências acentuam tanto a evasão quanto migrações familiares para as periferias dos grandes centros urbanos regionais, áreas que, apesar de pauperizadas, são atendidas por serviços. Na sequência da escola básica, as comunidades reivindicam melhor acesso à internet e à oportunidades para ensino profissionalizante a partir de seus próprios locais de vida. Na perspectiva de pais e avós ribeirinhos, tais oportunidades passarão a competir contra as tentadoras e enganosas facilidades do garimpo ilegal e de outras alternativas ilícitas às quais os jovens estão expostos. Consideramos essas ações reivindicatórias como exemplos elucidativos do enlace entre o diálogo promotor de leituras sobre o meio em torno e encaminhamentos de parciais respostas para a crucial pergunta sobre o que fazer.

O terceiro nexo discernido por Rego nesses processos é a presença da razão dialógica, no sentido de que diversas vias de pensamento criadas através da história estão interiorizadas no pensamento e se tornaram constitutivas da interpretação do mundo pelo humano, isto é, tornaram-se inseparáveis do exercício interpretativo. A etimologia do termo “dialógico” contém as noções simultâneas de embate e entendimento. O prefixo “di” guarda o sentido de dualidade, em palavras como “dicotomia”. O prefixo “dis” remete a afastamento, em palavras como “dissemelhança”. O “dia” em “dialética” e “diálogo” concentra a ideia de interação entre opostos. O termo “lógico” é derivado de “logos”, que remete a uma ordenação que busca encontrar coerência entre dados apreendidos pela consciência, o que pode ser significado como a busca por princípios que perpassam a multiplicidade aparentemente caótica dos fenômenos, vinculando as manifestações a princípios, ou seja, formulando um sistema – uma razão. Assim, o termo “dialógico” diz respeito ao embate entre diferentes razões. O diálogo não pressupõe o acordo como uma assegurada consequência, o acordo é uma possibilidade.

A razão dialógica remete ao exame da razão contida nas diferentes manifestações em embate, identifica que tais razões estão ancoradas na história e interiorizadas em leituras de mundo. Observamos essa tomada de consciência principalmente no diálogo com os idosos das comunidades ribeirinhas. Com palavras simples e que falam de vivências cotidianas, eles estão a nos dizer o que podemos verter na forma da sentença de que o drama se situa no embate entre duas cosmovisões interiorizadas nas pessoas de um lado e doutro, pessoas que levam consigo divergentes modos de estar no mundo. Os idosos recordam a infância e o início de seu contato com “nós”, o de fora, o outro, e retrospectivamente elaboram a consciência de que as suas trajetórias transcorreram no drama de, por contraste, darem-se conta de quanto a vida é valor que ordena o mundo ribeirinho e que esse não é o valor que predomina no mundo invasor do seu. O valor que ordena o mundo de nós outros é sintetizado pelos ribeirinhos com uma negativa – não é a vida – e uma afirmativa – é o dinheiro. Nesse embate entre duas razões antagônicas, compreendemos que os idosos de hoje têm um sentido de urgência que eles não receberam dos antepassados no mesmo grau com o qual entregam o alerta aos filhos e netos e à comunidade.

Unida aos dois nexos anteriores, a razão dialógica reforça a compreensão de que diferentes interpretações se apresentam no embate e diferentes poderão ser as propostas de ações derivadas de interpretações conectadas a interesses, por sua vez, conectados a visões de mundo, por sua vez, conectadas a diferentes modos de estar-se situado nas interseções entre classe social, gênero, raça/etnia e relações territoriais. Essa compreensão não necessariamente traz por consequência exortações à tolerância, mas, certamente, o reconhecimento de que racionalidades diferentes tornam-se constitutivas da condição humana e, assim, em processos de forte apelo interpretativo, ocorrerão manifestações de racionalidades interiorizadas e possivelmente divergentes.

O diálogo abre para o indeterminado. É de uma obviedade gritante dizer que as chances para que aconteçam acordos crescem quando o diálogo é movido para adiante pela intenção de agir em função de problemas sofridos em comum. Contudo, a percepção dessa óbvia necessidade pela relação horizontal é exatamente o que é obstaculizado por processos de dominação que hiper acentuam a verticalidade do hegemônico que, desde cima, ordena funcionalidades para as vidas dos “de baixo” e opera no sentido de lhes retirar a resiliência que se alimenta na atenção de olhar e escutar os que vivem ao lado. Essa atenção no olhar e escutar pode ser parcialmente proposta em termos de fazer das questões do meio em torno temas para diálogo no meio entre participantes voltados a desenvolverem leituras interpretativas de “textos” do vivido com a intenção de chegar a acordos para ações. Eles se transformarão ao transformarem seu lugar de vida. Eles transformarão seu lugar de vida ao se transformarem.

Emerge entre os ribeirinhos um conjunto de pautas interligadas e relacionadas à preservação ambiental, saneamento, saúde, educação, trabalho, tecnologia, segurança, transporte. Observamos que, na medida em que formulam suas pautas, processam graduais mudanças de atitude perante à sociedade e o Estado. Por exemplo, desiludidos de esperar por respostas governamentais às reivindicações apresentadas, passam à intenção de eles próprios bancarem a perfuração de poços artesianos profundos para o abastecimento de água potável. Em comunidades caracterizadas pela economia praticada no cotidiano baseada em trocas e ainda tênues relações monetarizadas, como acumular fundos financeiros para contratar a perfuração de poços? Possibilidade aventada no meio entre consiste em oferecerem programações para turismo de baixo impacto, aproveitando os atrativos situados no ambiente florestal e fluvial que circunda suas comunidades. Na alternativa, identificamos uma dupla face: afastamento em relação ao Estado, aproximação em relação à sociedade. Em ambas as faces, identificamos movimentos que convergem a partir de posições opostas. Em relação ao Estado, o fim da atitude de espera guarda seu oposto, a interação de outro modo: as comunidades esboçam se mobilizar para eleger seus representantes à câmara de vereadores. Em relação ao mais amplo, à sociedade, esta deixa de ser percebida apenas como o urbano para o qual os riberinhos se deslocam e passa a ser pensada como o urbano que pode vir até eles conhecer seu ambiente, seu modo de vida, seus valores – a visita dos outros passa a ser aventada como elo de solidariedade e possível fonte de recurso para solucionar questão importante.

Indicativo ainda mais evidente dessa processual mudança está na crescente indignação contra a contínua ausência de respostas efetivas do Estado acerca do quadro relacionado à drogadização, alcoolismo, prostituição, violências contra a mulher e sintomas depressivos que atingem a juventude exposta à perigosa combinação entre poucas promissoras expectativas para a vida e a proximidade do dinheiro circulante associado ao garimpo ilegal e ao desmatamento predatório. O que fazer? As respostas gradativamente elaboradas no dia a dia envolvem novamente a convergência de movimentos opostos: desistir de esperar por ações do Estado, promover diálogos e ações comunitárias de prevenção e de amparo a vítimas, buscar alternativas para que as expectativas dos jovens para a vida se mostrem mais favoráveis, e relacionar-se de forma mais incisiva com o Estado a partir de pautas estabelecidas pelos ribeirinhos.

Esse processo vai constituindo as comunidades ribeirinhas como territórios de comunicação, onde o diálogo com vistas à ação afirma um modo de situar-se na vida em oposição a outro modo que ameaça a vida. No gradativo adensamento dos contatos entre os pesquisadores e os ribeirinhos, consolidaram-se pontos de atenção sobre o modo de realizar a interação dos pesquisadores com as duas comunidades. Foram estabelecidos como princípios:

Sempre manter presente a consciência de que a cultura ribeirinha precisa ser conhecida a partir dela mesma. Considerar que o prévio estudo de artigos científicos e a busca de subsídios com pesquisadores que trabalham no tema são requisitos imprescindíveis, mas não suficientes, pois a ausência de atenção às singularidades negligenciaria a sensibilidade necessária para a compreensão de que motilidades e dinâmica de cada comunidade não são redutíveis ao que conceitos analíticos descrevem sobre a cultura que perpassa diferentes lugares amazônicos. É teoricamente e empiricamente sustentável a afirmação sobre traços gerais que caracterizam essa cultura, porém há também a multiplicidade e a força do que é próprio do lugar. Não estar atento a essa dimensão seria reproduzir o apagamento que representações homogeneizadoras exercem sobre as diferenças.

Estabelecer relações interpessoais pautadas nas vivências expressas pelas comunidades. Os pesquisadores devem estar atentos para não sobrepor seus juízos de valor previamente formulados ao que se manifesta nas falas do lugar; os pesquisadores não estão na comunidade para transmitir seus conceitos acadêmicos aos ribeirinhos, mas para aprender sobre a cultura e o modo de vida do outro, atitude indispensável para fundamentar a progressividade nas interações. O pesquisador está a estabelecer contato com um cotidiano diverso em ritmo, expectativas e símbolos daquele ao qual está acostumado; necessita imergir nesse ambiente onde a oralidade predomina de modo muito acentuado na produção do social. Para isso, é preciso que fale menos e escute e aprenda mais.

Desenvolver práticas de escuta e de escrita reflexivas, objetivando o retorno da pesquisa para as comunidades. Condição necessária para a progressividade da interação entre pesquisadores e comunidades é compreender como a cultura ribeirinha estabelece sua relação com a natureza ao mesmo tempo em que desenvolve repertório linguístico de significados indissociáveis a essa relação. Torna-se imprescindível o cuidado do pesquisador no modo de expressar pela escrita seus registros e interpretações do que escutou na oralidade, considerando que a capacidade de escrita marca sua posição na relação com os ribeirinhos, e que estes, no processo dialógico em curso, manifestam a expectativa de que a interação entre os dois “universos” produza comunicações dos anseios e saberes das comunidades para a sociedade que, em várias escalas imbricadas, lhes é externa, envolvente, agressora e irremovível – e promissora, a depender do curso da história produtora do espaço, processo no qual a comunicação é um fator em disputa.

Nesse diálogo, ribeirinhos e pesquisadores elaboraram um plano de comunicação, que inclui conteúdos e meios. A finalidade do plano foi definida como a de dar forma a ações a serem empreendidas pelas comunidades – ações de defesa política e reivindicatória e de subjetivação de corações e mentes com a exposição do modo lento de viver em harmonia com a natureza. No entanto, a prática evidenciou aos envolvidos que, antes do manifestar-se para além da comunidade, processam-se tomadas de consciência interna quanto ao que fazer relacionado às questões do lugar. Isto é, o processo confirmou a dimensão da autoeducação posta em andamento por indivíduos e coletivos quando os participantes dialogam sobre o lugar de vida com a intenção de definirem ações. As linhas para os conteúdos são as até aqui referidas – atividades produtivas, renda, educação, saúde, condições do habitar, perspectivas de vida para a juventude; todos os temas enfeixados pelo crucial embate entre perder ou conservar a posse do território e o modo de vida ameaçado pela aceleração que assimila e subordina tempo e espaço como recursos para a acumulação praticada por outros. Os meios são os possíveis para a divulgação dos conteúdos resultantes do diálogo de ribeirinhos e pesquisadores: blogs, rádios, TVs, jornais, revistas, sites especializados em divulgação científica, eventos acadêmicos, livros e periódicos nacionais e internacionais vinculados a variadas áreas do conhecimento, assim como a criação de instrumentos didáticos que tenham por temas as questões das comunidades e sejam produzidos conjuntamente com os ribeirinhos e para os ribeirinhos.

O diálogo vem acontecendo ao longo do tempo, sendo difícil precisar uma data fundadora, pois se trata de uma ação iniciada antes de um primeiro ato de formalização institucional na universidade. O que começou aos poucos agregou pessoas e ganhou corpo. A formalização do plano de comunicação é recente e, ainda que tenham ocorrido ações comunicacionais anteriores, o primeiro produto midiático elaborado após a definição do plano (e que nesse sentido o representa) é o portal ConectAmazônia (2022), dedicado tanto à base de interesse constituída por ações de comunidades específicas quanto aos povos da floresta e ao ambiente amazônico, com suas seções intituladas: Saúde, Educação, Meio Ambiente, Cultura, Inovação e Sustentabilidade, Colunistas e Podcasts. A iniciativa inspira-se em concepções educacionais etnográficas, conforme expressas por André (2012), assim como em práxis relacionadas aos povos ribeirinhos, como as refletidas por Amaral (2017), e em compreensões da cultura local, a exemplo dos estudos de Loureiro (1995, 2008).

Considerações finais

Por meio da observação participante e do diálogo, compreendemos que se delineam visões mais conjuntivas das relações das comunidades com a sociedade e o Estado a partir da abordagem de problemas de aparência tópica, mas que, ao serem discutidos com o propósito de busca de ações, vão sendo concebidos como partes interligadas de um todo social em que perspectivas ambientais, políticas, econômicas e culturais passam a ser apreendidas imbricadas: agir a partir de uma é agir em relação a todas.

As apreensões dos ribeirinhos sobre as contradições envolvidas vão processando compreensões conjuntivas: não se trata apenas de compreender o mundo circundante, mas compreender que o mundo se faz presente com suas contradições dentro das comunidades e que as comunidades, por diminutas que pareçam na comparação, tem algo a inspirar ao mundo.

Eles nos ensinam sobre resiliência, preservação e almejar um futuro para as novas gerações. Eles nos ensinam sobre a necessidade social da educação que busca melhorar pessoas e lugares com o diálogo investigativo sobre os entornos que contextualizam as vidas, em todas as escalas.

Espera-se que a contínuação do projeto possa subsidiar a formação de estudantes de geografia e áreas de conhecimento afins, expandindo o conhecimento sobre as populações ribeirinhas da Amazônia e contribuindo para as suas práticas de resiliência e de transformação, que encontram no diálogo entre os “de dentro” e os “de fora” um meio imprescindível para construir necessárias políticas públicas.

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Lucileyde Feitosa Sousa / lucileyde.sousa@unir.br

Professora no Departamento de Geografia da Universidade Federal de Rondônia, Brasil. Licenciada em Geografia, Doutorado e Pós-Doutorado em Geografia.

Nelson Rego / nelson.rego@ufrgs.br

Professor no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. Bacharel em Geografia, Doutorado e Pós-Doutorado em Educação.


1. Embarcação leve com casco de metal e motor na popa, muito utilizada no transporte fluvial na Amazônia.

2. Organização privada sem fins lucrativos, com sede em Porto Velho.