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"Ana Maria Hoepers Preve
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Brasil.
Ana Paula Nunes Chaves
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Brasil.
Flaviana Gasparotti Nunes
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Brasil.
A Rede Internacional de Pesquisa Imagens, Geografias e Educação, desde o ano de 2009, aglutina um conjunto de instituições e pesquisadores que desenvolvem seus trabalhos com foco nas imagens como potência para as mais amplas experiências espaciais contemporâneas. Atualmente, a Rede conta com dez polos distribuídos em diferentes regiões do Brasil e da América Latina,1 e seu interesse está em experimentar –em todos os fazeres acadêmicos, desde projetos de pesquisa a projetos de extensão e ensino– a possibilidade de rasurar o entendimento dado para a imagem no contexto da geografia e da educação. Rasurar o entendimento hegemônico da imagem significa problematizar a imagem como elemento restrito a comunicar uma informação a priori estabelecida por outros, quando não, a ilustrar um conteúdo por vezes já dado como certo, como geralmente ocorre em contextos da sala de aula ou em livros e recursos didáticos.
As pesquisas da Rede se traduzem na experimentação com as imagens como elemento expressivo e instaurador de sentidos e percepções que proporcionam uma potencialização de pensamentos sobre o espaço. Para além da imagem propriamente dita, o que está em jogo é a educação do olhar no trabalho com as imagens, pois partimos do pressuposto que as imagens também nos educam quando instauram condições para outros sentidos, sensibilidades e pensamentos espaciais. Pela via dessas experimentações, o poder dado comumente às imagens de apenas informar, ilustrar e comunicar se enfraquece. O enfraquecimento desse sentido maior tem nos permitido estar mais perto de variações estéticas e da experimentação de novas formas de expressão nas linguagens cartográfica, fotográfica e videográfica, assim como no cinema, na pintura e no desenho.
Por estarmos inseridos no contexto de uma prática cultural de pensamento que coloca a imagem como elemento informativo e de reprodução da realidade já dada, a busca por outras possibilidades de análise caminha na tensão e na deriva com essa concepção maior dada à imagem. O sentido político no trabalho com as imagens se afirma no processo agenciador de pensamentos e traz à baila a força de outros pensamentos possíveis, capazes de provocar derivas minoritárias na ciência geográfica e em seus processos educativos. O sentido de menor aqui utilizado não significa inferior, nem necessariamente anteposição mecânica às forças dominantes, mas, sim, aquilo que diante do estabelecido e convencionado enquanto elemento maior, e institucionalizado, tem a força de escapar, de rasurar, de provocar tensões e buscas por outros sentidos, ações e pensamentos (Deleuze y Guattari, 1995, 2003).
Nos trabalhos da Rede a abordagem da imagem possui trilhas diferenciadas que mutuamente se enriquecem a partir da problematização de seu modelo usual. Assim, buscamos ampliar as abordagens da imagem, ou seja, fazemos uso de estratégias metodológicas e conceituais para questionar e tensionar os sentidos da imagem restritos à informação e representação do real. A imagem não ocupa um lugar de neutralidade e, tampouco, é encarada como uma simples ilustração. Lemos as imagens como objetos construídos que apresentam seus recortes da realidade, seus próprios focos e destaques, os quais nos autorizam a ver coisas, e excluir outras tantas (Rose, 2013; Azevedo, 2014). O exercício está em pensar a imagem para além da própria imagem, portanto, nossa tentativa anseia instaurar sentidos espaciais que nos afetam e conduzam o pensamento para outras possibilidades.
As discussões que originaram os textos deste dossiê tiveram origem no V Colóquio Internacional A educação pelas imagens e suas geografias, realizado em novembro de 2017 na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Brasil. O evento congregou pesquisadores dos polos da Rede do Brasil, Argentina e Colômbia, e teve como propósito pensar uma linha de fuga às representações espaciais e suas reverberações com a educação e com o pensamento geográfico.
A imagem de capa do dossiê provém de uma de nossas experimentações na oficina Geografias em deriva (Barbosa, 2019), resultado dos trabalhos do Polo Florianópolis. Durante a oficina realizada no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, tínhamos um barco a vela desenhado por pacientes internos como forma de deslocamento no território manicomial e prisional. O barco, nos trabalhos deste Polo, é a imagem daquilo que materializa ou que dá concretude aos deslocamentos nos planos extensivo e intensivo do território. A representação do barco, em sua forma mais simples, desloca os navegantes de um ponto a outro no território, de um tema a outro, de um pensamento a outro. No decurso dos trabalhos do Polo, o barco torna-se um meio disponível a deslocamentos. O barco a vela leva, lentamente, alguma coisa para outro lugar a depender da força dos ventos nele incidente. Como a força dos ventos que movimenta o barco, entendemos que podemos levar as imagens a escaparem dos postulados já estabelecidos de pensar o espaço –como abstrato, fechado, estático e definido– de informação documental ou ilustração comprobatória. Em outras palavras, fazer escapar as imagens de seus lugares habituais de significação e uso é, também e, sobretudo, fazer escapar dali a linguagem onde esta obra ganhou existência, alargando as potencialidades de estas linguagens comporem outras maneiras de expressar o espaço e a vida que se dá através/com/no espaço.
Por esse caminhar de ideias, a proposta deste dossiê resulta das reflexões disparadoras presentes nas conferências do evento, as quais ansiaram perspectivar analiticamente as possíveis aproximações entre a educação visual e o pensamento espacial contemporâneo. Cada um dos cinco textos que compõem o dossiê, a seu modo, tece conexões sobre a imagem em suas interfaces com a geografia, especificamente, com as representações espaciais. Não se trata apenas de explorar o potencial metodológico, em interpretar a imagem enquanto informação e representação do espaço, mas, sobretudo, ir além do processo de comunicação e admitir caminhos outros possíveis para pensar a imagem como instauradora e produtora de novas realidades.
O texto Tropas de imagens partilham o (não) saber geográfico: territórios contestados de poder, de Wenceslao Machado de Oliveira Junior, da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), problematiza os diversos territórios de poder nos quais as imagens atuam, desde pinturas, desenhos e charges às fotografias presentes em livros didáticos de geografia.
Sob o ponto de vista cartográfico, o texto Cartografias (in/im)possíveis: O Ilha, de Gisele Girardi, da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), problematiza um grupo de mapas de varetas de ilhéus do Oceano Pacífico. A autora recupera traços de uma imaginação espacial presentes nos exemplares sobreviventes e nas reconstruções atuais destes mapas. A partir daí, busca problematizar como o Ocidente subjugou saberes e pensamentos e consolidou isso em mapas ou, nos dizeres de Doreen Massey (2008), como os mapas ocidentais tiraram a vida do modo como imaginamos o espaço.
Em Formação docente e experimentações curriculares com imagens de África(s), Ìnia Franco de Novaes da Escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia (ESEBA/UFU), a partir dos aportes teóricos da Filosofia da diferença, mobiliza a imagem como um campo de resistência, descortinando outras perspectivas de pensamentos e sensações singulares.
No texto Arte, ativismo e educação: experiências de colaboração e justiça ambiental, Elisa Dassoler, documentarista e integrante do grupo de pesquisa Poéticas do Urbano, explora as artes visuais, os ativismos políticos e as práticas educativas em dois projetos realizados pelo coletivo britânico PLATFORM.
Para finalizar, o texto Entre imposibilidades y deseos: la fotografía, un dispositivo para aprehender e imaginar lo espacial, de Verónica Carolina Hollman, pesquisadora no Consejo de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET) na Universidad de Buenos Aires (UBA), traça uma genealogia –bastante arbitrária, como salienta a autora– de uma série de impossibilidades que a fotografia, enquanto técnica, tem apresentado e que em distintos momentos históricos a imaginação conseguiu solucionar. Tal exercício permitiu abrir outras possibilidades de interpretação, inclusive, aquelas inesperadas.
#Bibliografia
»Azevedo, A. (2014). Cultura visual: as potencialidades da imagem na formação espacial do mundo contemporâneo. Geografares, Edição Especial, 07-21.
»Barbosa, C. (2019). Geografias em deriva. Trabalho de Conclusão de Curso. Licenciatura em Geografia, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis.
»Deleuze, G. y Guattari, F. (1995). Mil Platôs – capitalismo e esquizofrenia, Vol. 1. Rio de Janeiro: Editora 34.
»Deleuze, G. y Guattari, F. (2003). Kafka – para uma literatura menor. Lisboa: Assírio e Alvim.
»Massey, D. (2008). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
»Rose, G. (2013). Sobre a necessidade de se perguntar de que forma, exatamente, a Geografia é “visual”? Revista Espaço e Cultura, 33, 97-206.
Ana Maria Hoepers Preve / anamariapreve@gmail.com
Professora no Curso de Geografia e no Programa de Pós-Graduação em Educação da FAED/UDESC. Atualmente faz Estágio Pós-Doutoral na FE/UNICAMP. Pesquisadora da Rede Internacional de Pesquisa Imagens, Geografias e Educação.
Ana Paula Nunes Chaves / ana.chaves@udesc.br
Professora Adjunta do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina-UDESC, com mestrado em Geografia na linha de pesquisa Geografia em Processos Educativos, na Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC, e doutorado em Educação na linha de pesquisa Filosofia da Educação, na Universidade de São Paulo-USP. Pesquisadora da Rede Internacional de Pesquisa Imagens, Geografias e Educação.
Flaviana Gasparotti Nunes / flaviananunes@ufgd.edu.br
Licenciada, Mestre e Doutora em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil. Professora Associada (Nível 3) da Universidade Federal da Grande Dourados, Brasil. Realiza pesquisas e possui publicações sobre ensino de Geografia, linguagens e formação de professores. Pesquisadora da Rede Internacional de Pesquisa Imagens, Geografias e Educação.
1 Para saber mais, acesse www.geoimagens.net