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Renan Ribeiro Moutinho
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, Rio de Janeiro, Brasil
renan.moutinho@cefet-rj.br
Recepción: marzo 2021.
Aceptación: junio 2021.
O presente artigo investiga as mudanças nas abordagens acadêmicas e jornalísticas sobre o funk carioca no transcurso das três primeiras décadas de produções bibliográficas sobre esse gênero musical (1980-2000). O artigo está dividido em três seções que correspondem às três décadas analisadas, o que possibilita o exame de problemas inerentes à abordagem do funk carioca como um gênero musical oriundo de uma cena musical específica, o baile funk e a proposição de sua historiografia a partir de um conjunto de trabalhos acadêmicos selecionados. A metodologia de trabalho partiu de pesquisa bibliográfica exploratória em bancos de dados específicos como a Plataforma Sucupira a fim de compor a primeira fase, revisão de literatura, de pesquisa doutoral sobre os processos criativos de um conjunto de sujeitos que compuseram a primeira década de desenvolvimento do funk carioca (1989-1999). Os resultados deste artigo apontam para a consolidação de um campo específico de estudos acerca do funk carioca e a expansão de sua abrangência de um âmbito local (Rio de Janeiro) para um nível nacional (Brasil).
Palavras-chave: funk carioca, baile funk, estado da arte, revisão de literatura, pesquisa exploratória
Este artículo investiga los cambios en los enfoques académicos y periodísticos del funk carioca en el transcurso de las tres primeras décadas de producciones bibliográficas sobre este género musical (1980-2000). El artículo se divide en tres apartados que corresponden a las tres décadas analizadas, lo que permite examinar los problemas inherentes a la aproximación al funk carioca como género musical proveniente de una escena musical concreta, el baile funk y la proposición de su historiografia en un conjunto de trabajos académicos seleccionados. La metodología de trabajo se inició con una investigación bibliográfica exploratoria en bases de datos específicas, como la Plataforma Sucupira, con el fin de componer la primera fase, una revisión de la literatura, de la investigación doctoral sobre los procesos creativos de un grupo de sujetos que componen la primera década de desarrollo de el funk carioca (1989-1999). Los resultados de este artículo apuntan a la consolidación de un campo específico de estudios sobre el funk carioca y la expansión de su alcance de un nivel local (Río de Janeiro) a un nivel nacional (Brasil).
Palabras clave: funk carioca, baile funk, Estado del arte, revisión de literatura, investigación exploratoria
This article investigates the changes in academic and journalistic approaches to carioca funk in the course of the first three decades of bibliographic productions on this musical genre (1980-2000). The article is divided into three sections that correspond to the three decades analyzed, which makes it possible to examine the problems inherent in the approach to carioca funk as a musical genre coming from a specific musical scene, the baile funk and the proposition of its historiography from a set of selected academic papers. The work methodology started from exploratory bibliographic research in specific databases such as the Sucupira Platform, in order to compose the first phase, a literature review, of doctoral research on the creative processes of a group of individuals who made up the first decade of development of the funk carioca (1989-1999). The results of this article point to the consolidation of a specific field of studies about funk carioca and the expansion of its scope from a local level (Rio de Janeiro) to a national level (Brazil).
Keywords: Funk carioca, funk party, state of art, literature review, exploratory research
O surgimento do funk no Brasil ocorreu entre o final da década de 60 e o início da década de 70, o que correspondeu ao contexto histórico e político da Ditadura Militar brasileira (Essinger, 2005; Vianna, 1988). No interior deste cenário político-histórico, a trajetória de importação do gênero musical funk dos Estados Unidos para o circuito cultural brasileiro ocorreu sob os auspícios da indústria cultural nos moldes do que já havia ocorrido na década de 50 com o Rhythm and Blues (Burnim e Maultsby, 2015) e o Rock ‘n’ Roll (Oliveira, 2018, p. 38) e na década de 60 com o Soul (Burnim e Maultsby, 2015; Essinger, 2005).
Nesse mesmo contexto político-histórico, as letras das composições de artistas diretamente ligados ao soul e ao funk como James Brown (Oliveira, 2018; Vianna, 1987), transmitiram pela diáspora negra os ideais estéticos e políticos do Movimento dos Direitos Civis de negros norte-americanos. A influência dessas ideias em um grupo de jovens negros no Rio de Janeiro, ávidos por discutir os seus processos raciais e sociais, originou a criação de uma cena cultural específica que viria a ser conhecida por cena Black Rio (Essinger, 2005; Oliveira, 2018). Dentro dessa cena, os bailes black coexistiram com outros tipos de bailes e reuniões de lazer realizados na cidade do Rio de Janeiro, como foi o caso dos hi-fi’s suburbanos1 (Oliveira, 2018) e, posteriormente, dos Bailes da Pesada, com a especificidade da predileção de seus produtores por uma sonoridade e uma atitude funk (Sousa, 2009).
Entre o final da década de 70 e o início da década de 80, irrompeu uma nova influência de ordem política, tecnológica e sonora advinda dos Estados Unidos –o Movimento Hip-Hop (Essinger, 2005; Vianna, 1990). Por consequência, uma nova cena musical, posteriormente conhecida como cena funk carioca, começou a ser desenvolvida com características que lhe diferenciavam da cena Black Rio gestacionada na década de 70, quanto à sonoridade e quanto ao compromisso político ligado à negritude (Essinger, 2005; Palombini, 2008). Em meados da década de 80, essa nova cena tornou-se o objeto de interesse do antropólogo Hermano Vianna e resultou na elaboração de sua dissertação de mestrado intitulada “O Baile Funk Carioca: Festas e Estilos de Vida Metropolitanos” no Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1987. Esse trabalho inaugurou o interesse acadêmico especificamente sobre a cena funk carioca e a análise de uma nova forma de socialização e de constituição identitária da juventude negra, suburbana, favelada e pertencente às classes menos abastadas do Rio de Janeiro.
Partindo desse trabalho de Vianna na década de 80, as pesquisas que foram desenvolvidas posteriormente passaram a explorar aspectos que surgiram ao longo do desenvolvimento da cena funk carioca nas décadas de 90, 2000 e de 2010. Dentre esses aspectos, pode-se citar: a) as particularidades e o impacto dos bailes funk no contexto cultural e no circuito de lazer do Rio de Janeiro (Essinger, 2005; Herschmann, 1997; Vianna, 1990); b) as características dos sujeitos que o frequentavam (Cecchetto, 1997; Guimarães, 1995; Macedo, 2003); c) a relação entre esta cena e a indústria cultural (Caetano, 2015; Herschmann, 1998 e 2000; Mizrahi 2010; Salles, 1996; Vianna, 1988; 1990); d) os conflitos oriundos da dinâmica social entre a cena funk carioca e o poder público (Cymrot, 2011; Essinger, 2005; Facina, 2013; Facina e Passos, 2018; Herschmann, 1998; Lopes, 2008; Lopes, 2017; Novaes, 2016; Palombini, 2012; 2013; Vianna, 1990); e) a proposição de sua historiografia (Cáceres et al., 2014; Paula, 2007; Laignier, 2013; Lopes, 2010; Sá, 2007; Vianna, 1987); f) o desenvolvimento de seus subgêneros (Laignier, 2013; Lopes, 2010; Palombini, 2008; 2009; Paula, 2007; Russano, 2006); g) a sua relação com a música eletrônica (Palombini, 2009; Sá, 2007); h) a sua relação com a diáspora negra (Cáceres et al., 2014; Essinger, 2005; Facina e Lopes, 2012; Lopes, 2010; Palombini, 2008; Vianna, 1990); i) a sua relação com manifestações culturais brasileiras como a capoeira, o maculelê e o samba (Amaral, 2008; Cáceres et al., 2014; Lopes, 2010; Miranda, 2011; Pedro, 2015; Sá, 2007; Severiano, 2008), j) os aspectos de sua produção (Essinger, 2005; Herschmann, 2000; Michailowsky, 2017; Novaes, 2017; Palombini, 2016; Vianna; 1990) e k) a análise específica de alguns dos seus aspectos sonoro-musicais (Cáceres et al., 2014; Laignier, 2013).
O objetivo específico desse artigo é apresentar um estado da arte de pesquisas sobre o funk carioca baseado em uma seleção de produções acadêmicas e jornalísticas desenvolvidas e publicadas no transcurso de três décadas (1980-2000). O recorte temporal selecionado2 permite delinear o desenvolvimento de diferentes problemáticas acerca do baile funk e do funk carioca desde o primeiro trabalho dedicado ao fenômeno dos bailes funk na cidade do Rio de Janeiro (Vianna, 1987), até o início do que pode ser considerado o estabelecimento de um campo de estudo específico sobre o funk carioca dentro da musicologia a partir da segunda metade da década de 2000.
A utilização de pesquisa exploratória como ferramenta metodológica principal nesse artigo coaduna com o que assinala Martins (2000, p. 30) quanto a uma estratégia de “abordagem adotada para a busca de maiores informações sobre determinado assunto”. Silva Júnior (2012, p. 461) complementa que a “pesquisa exploratória, através do levantamento bibliográfico, leitura e análise de documentos, pode levantar um novo problema que será esclarecido através de uma pesquisa mais consistente”.
A presente pesquisa exploratória foi realizada entre os meses de julho de 2017 e setembro de 2019 a partir dos bancos de dados disponíveis virtualmente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do Catálogo de Teses e Dissertações do Portal de Periódicos e de Pesquisa no Portal Academia.Edu.3 O primeiro banco de dados permitiu a pesquisa em dissertações e teses cadastradas na Plataforma Sucupira pelos respectivos programas de pós-graduação, enquanto os bancos de dados seguintes permitiram ampliar o escopo desta pesquisa exploratória para trabalhos publicados em periódicos revisados por pares, capítulos de livro, partituras, fontes jornalísticas e biográficas. Esse levantamento permitiu um panorama das produções acadêmicas sobre o funk carioca no transcurso de um período específico de três décadas (1980-2000).
A dissertação de mestrado intitulada “O baile funk carioca: festas e estilos de vida metropolitanos”, defendida por Hermano Paes Vianna no curso de Antropologia Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 19874 foi o primeiro e provavelmente o mais influente5 dos trabalhos que inauguram o interesse acadêmico pela manifestação cultural funk carioca e, mais especificamente, pela etnografia destes bailes. O foco desse trabalho foi compreender um novo tipo de baile6 que reunia milhares de pessoas no subúrbio carioca em meados da década de 1980.7 Como conclusões, o autor identifica a predominância suburbana dessa manifestação cultural (Vianna, 1987, p. 50) e do aparente desinteresse da indústria cultural fonográfica por essa cena musical.
O autor continuaria discutindo parte das conclusões apresentadas no trabalho supracitado em artigo publicado na Revista Estudos Históricos de 1990 intitulado “Funk e Cultura Popular”. No trabalho, o autor continua se referindo ao funk carioca como uma extensão do funk norte-americano ou como um tipo de hip-hop nova iorquino (Vianna, 1990, p. 247), embora tenha se aprofundado em discutir o conceito de autenticidade do funk dentro do bojo da cultura popular. Essa problematização é realizada a partir do próprio conceito de cultura popular pensada de forma contrastante entre o que é feito pelo povo/para o povo e o que é consumido pela grande maioria desse povo. Com essa defesa, o autor transparece a perspectiva de que, apesar do funk carioca não ser uma produção do povo (carioca), é consumido pela sua grande maioria:
É preciso questionar as teorias que pensam a indústria cultural como uma instituição absolutamente coerente que busca transmitir um conjunto de valores pré-estabelecidos (os valores da “classe dominante”) através de todos seus produtos. Como mostra o caso do funk carioca, existem produtos bem diversos colocados no “mercado cultural”, que podem ser consumidos de maneiras diferentes por grupos sociais diferentes e que podem circular (até mesmo internacionalmente) por caminhos pouco convencionais, independentes dos grandes meios de comunicação de massa (Vianna, 1990, pp. 249-250).
Apesar de o autor, em seu argumento, citar o recém-lançado álbum do Dj Marlboro como exemplo de desprestígio pela gravadora Polygram no lançamento do disco Funk Brasil em detrimento do álbum Burguesia, do roqueiro Cazuza na mesma época (Vianna, 1990, p. 249), o foco da crítica de Vianna está no descompasso entre o que é reconhecido como “sucesso” pelas gravadoras de maior proeminência na indústria cultural e pelo que realmente é objeto de fruição pela juventude carioca. Curiosamente, o álbum do DJ Marlboro não é citado como um caso de produção musical nacional, mas como uma replicação de sucessos internacionais que fomentavam a cena funk carioca até então. A ausência desse dado parece contribuir mais para o argumento do autor sobre a ausência de autenticidade no funk carioca do que para um fato histórico que lhe estava sendo contemporâneo. De todo modo, Hermano Vianna inicia uma historiografia do funk carioca com esses dois trabalhos ao evidenciar tanto o surgimento de um novo tipo de baile, o baile funk, quanto para ressaltar o lançamento de um álbum que propunha um novo gênero musical, o funk.
Em 1996, a jornalista musical Luiza Salles organiza um livro autobiográfico pela Editora Mauad sobre o DJ Marlboro, citando-o como um dos DJs mais conhecidos e controversos da cena funk carioca. Após 16 anos ativos como DJ de baile e, àquela época, também produtor e dono de equipe, a Big Mix, o conteúdo do livro buscou explorar o autodeclarado protagonismo do DJ na constituição do que viria a ser conhecido como funk carioca a partir de suas declarações pessoais, dos depoimentos de familiares, de amigos e de companheiros de sua vida profissional. Para além de um livro meramente biográfico, esta obra também se propôs a discutir fatos paradigmáticos para a história do funk carioca até então, caracterizando-o como uma manifestação musical especificamente brasileira dentro de uma manifestação cultural homônima (funk). Sob o ponto de vista de uma historiografia do funk carioca iniciada por Vianna (1987), o livro de Salles (1996) coloca o Dj Marlboro como protagonista do nascimento de um gênero musical novo para a cena musical dos bailes funk e ressalta uma perspectiva que viria a ser objeto de discussão em trabalhos posteriores sobre a cena funk carioca.
A começar pelo subtítulo do livro, “O funk no Brasil”, a manifestação musical funk carioca é abordada quanto à sua origem norte-americana (Salles, 1996, p. 32), ao “Projeto Funk Brasil” que originou em três meses o seu primeiro disco autoral pela Polygram denominado “Funk Brasil” (Salles, 1996, pp. 67-72); as diferença que caracterizavam o “Funk dos bailes” e o Funk norte-americano (Salles, 1996, p. 70); a viagem do Dj Marlboro para os Estados Unidos atrás de discos e que resultou em uma inesperada amizade com o grupo Two Live Crew (Salles, 1996, pp. 49-55); a bateria eletrônica (modelo Boss DR-110) que ganhou de Hermano Vianna (Salles, 1996, pp. 63-64) em meados da década de 80; a sua trajetória como produtor de Rap Popular Brasileiro (Salles, 1996, p. 64) e o seu papel como criador de músicas dentro desse emergente gênero musical (Salles, 1996, p. 73).
No período de lançamento desse livro, a segunda metade da década de 1990, o DJ Marlboro já gozava de certa fama na cena funk carioca em virtude do já citado lançamento do álbum Funk Brasil I em 1989, mas também em virtude da sua participação na mídia radiofônica como apresentador dos programas Top Mix da Rádio Manchete (entre finais da década de 908) e dos programas que lhe foram sucessores, caso dos programas Big Mix na rádio FM O dia e depois na rádio RPC FM no decorrer da década de 90. Nesses programas, o artista promoveria os álbuns lançados em série após o Funk Brasil I, os Funk Brasil: II (1990), III (1991) e Especial (1994). Além disso, o DJ Marlboro utilizava a presença na mídia para promover os artistas que ele mesmo havia lançado ou produzido à época.
Um desses artistas, o Mc Batata, faria tanto sucesso com a sua música Feira de Acari (1990)9 na cidade do Rio de Janeiro que sua música alcançaria projeção nacional após ser incluída na trilha sonora da novela Barriga de Aluguel de Glória Perez, exibida pela TV Globo ainda na primeira metade da década de 90 (Essinger, 2005). Inclusive, o início da participação de quatro anos do DJ Marlboro como DJ residente no programa Xuxa Park da TV Globo em 1994 colaboraria para a ampliação do alcance do funk carioca para todo o Brasil10 (Ribeiro, 2018).
Em outras palavras, o protagonismo de Marlboro é enfatizado na narrativa do livro de Salles (1996) com contornos que o colocam como o mais influente de todo um gênero musical na medida em que não discute a participação de outros personagens que também tiveram um lugar de destaque dentro da cena funk carioca. Esse é o caso, por exemplo, do trabalho do DJ Grandmaster Raphael na Equipe Furacão 2000, o qual rivalizava a preferência e a hegemonia da cena funk carioca com a Big Mix do DJ Marlboro e com as outras equipes presentes na cena musical daquele período como a Cashbox, A Gota e muitas outras.
As disputas históricas entre as equipes de som no Rio de Janeiro originaram-se no contexto da realização dos bailes funk ainda na década de 70 (Essinger, 2005). Essa rivalidade se desdobrava, por exemplo, pela própria ocupação espacial de uma equipe em determinado clube no subúrbio da cidade, perpassava pela seleção de músicas a serem tocadas por discotecários próprios e se dava na disputa pela apresentação do equipamento de maior potência sonora. No final da década de 70, a disputa também se daria no início do lançamento de LPs por equipes (Vianna, 1987), caso da Soul Gran Prix, Dynamic Soul, Black Power e Furacão 2000. Dali em diante, as equipes continuariam a lançar álbuns e artistas próprios com características que demonstrariam cada vez mais a intensa interação entre o funk carioca, a sociedade carioca e os reflexos do racismo estrutural na segregação espacial da cidade do Rio de Janeiro.
O advento dos festivais de galeras (Essinger, 2005, p. 98) no início da década de 1990 exemplificou uma tentativa de “solução” estimulada pelo próprio governo do Estado do Rio de Janeiro para um dos principais problemas enfrentados à época por funkeiros: a perseguição estatal às estratégias de sociabilização desses jovens. O governo do Estado, interessado em coibir o que considerava atos de violência em bailes pela cidade (Essinger, 2005) incentivou a Equipe Furação 2000 a estimular que os jovens cariocas produzissem letras autorais, que seriam avaliadas em um festival a ser produzido pela própria Furação 2000. Apesar da prática de cantar versões em português das músicas em inglês nos Bailes não ser uma novidade à época (Essinger, 2005; Vianna, 1987), a reunião desses jovens em galeras que representavam as suas comunidades representava uma inovação na cena funk carioca.
No ano de 1995, o doutorado em educação de Maria Eloisa Guimarães intitulado “A escola, a galera e o narcotráfico” inaugurou o interesse acadêmico especificamente pelas implicações do fenômeno e, particularmente, pela interação entre as galeras e as escolas do entorno de suas comunidades. A autora aponta, por exemplo, que os entrevistados recorriam à categoria funkeiro para diferenciar-se dos membros das galeras11 em função da associação dos últimos com a violência e com o narcotráfico. Com o mesmo interesse de pesquisa, a pesquisadora Fátima Regina Cecchetto identificou a elaboração do que denominou por lúdico e ethos guerreiro na socialização masculina entre os integrantes de galeras funk em estudo etnográfico realizado em bailes funk na zona Norte do Rio de Janeiro em 1997. Esse trabalho viria a ser publicado no livro “Galeras cariocas: territórios de conflitos e encontros sociais”, de Hermano Vianna e, um ano depois, na publicação de sua dissertação de mestrado intitulada “Galeras funk carioca: o baile e a rixa”. Além disso, a pesquisadora identificou que os bailes funk se diferenciavam em três categorias constituídas a partir de diferentes níveis de presença ou ausência de brigas: os bailes de comunidade, em que não existiam brigas entre galeras; o de corredor, no qual as galeras se confrontavam em brigas divididas por territórios, conhecidos como “lado A” e “lado B” e o baile normal, em que as brigas eram mais rigidamente controladas pelos organizadores.
Apesar dos trabalhos de Guimarães (1995) e de Cecchetto (1997) discutirem os festivais de funk com letras em português e da organização dessa juventude sob o codinome galeras como oriundos de uma interação entre a cena funk carioca e a sociedade da época, as autoras não se aprofundam nos reflexos dessa nova forma de produção musical sob o ponto de vista da elaboração da própria identidade do gênero musical. Inclusive, esse enfoque na interação entre o funk carioca e a sociedade ao invés do aprofundamento específico nas características do baile e do novo gênero musical que estava sendo concebido naquele período, continuaria a ser observado em trabalhos posteriores sobre o funk carioca do final da década de 1990.
Em 1998, a tese de doutorado “Invadindo a cena urbana nos anos 90 – Funk e hip-hop: Globalização, violência e estilos de vida juvenis na cultura brasileira contemporânea”, de Michael Herschmann, discute principalmente o funk como uma manifestação popular jovem capaz de criar uma forma de inserção dessa juventude no mercado cultural de massa. As reverberações sociopolíticas de semelhante estratégia são comparadas com o mesmo movimento feito pela juventude do hip-hop em São Paulo, o que estabelece uma conexão entre as duas manifestações e o seu potencial mobilizador dentro da juventude. No final da década de 90, essa juventude que constituía a cena funk carioca convivia com uma intensa produção cultural que agitava os subúrbios (Vianna, 1987), que estava presente de forma consistente na mídia televisiva e radiofônica (Herschmann, 1998; Ribeiro, 2018; Salles, 1996) e que vinha sendo constantemente perseguida por uma trajetória de entrelaçamentos conflituosos com o poder público e com a sociedade carioca (Herschmann, 1998). Se por um lado o baile funk era reconhecido como “atividade cultural de caráter popular” pela Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro desde 1996,12 os seus artistas já começavam a chamar a atenção judicial para o conteúdo de suas músicas. Esse foi o caso da convocação, em 1995, dos Mcs Junior & Leonardo para depor na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) acerca da suposta apologia ao crime organizado de seu Rap das Armas (Essinger, 2005; Cymrot, 2011).13 Essa perseguição se agravaria com maior intensidade nos anos seguintes com a instauração de Comissões Parlamentares de Inquéritos (Cáceres et al, 2014) e com a promulgação de leis proibitivas ao universo do funk carioca.14
Em 1998, o DJ Luciano da Zona Oeste do Rio de Janeiro produziu a faixa Rap da Vila Comari no álbum intitulado “DJ Lugarino apresenta os melhores da Zona Oeste”. Nesse trabalho, o produtor mixou o tamborzão,15 um beat percussivo com atabaques inspirado em um outro beat presente no contexto do funk carioca desde a primeira metade da década de 1990, sob os beats conhecidos como Volt-Mix (faixa 808 Beatapella Mix do single 8 Volt Mix - DJ Battery Brain, 1988) e a versão dub da música Light Years Away (1983) do grupo nova-iorquino Warp 9, também conhecida dentro da cena funk carioca como Melô da Macumba ou Melô da Macumba 1.16 O Rap da Vila Comari (1998) foi o primeiro registro do que viria a ser batizado como tamborzão ainda em finais da mesma década e estabeleceria um novo paradigma sonoro para as produções de funk carioca na medida em que consolidaria a influência de práticas culturais brasileiras como a capoeira e o maculelê em produções dessa cena musical.17
No entanto, a mudança de sonoridade ainda não viria a ser objeto de estudo acadêmico nessa década ou na década seguinte, a de 2000, em que se pese o avanço significativo quanto à narrativa historiográfica da cena funk carioca pelos seus próprios autores em livros jornalísticos como o de Essinger (2005) e pela ampliação de áreas acadêmicas como a de Letras e de Psicologia interessados em adensar o espectro de compreensão sobre os elementos que compõe a cena funk carioca. Dentre esses elementos, pode-se citar os aspectos da produção musical do funk carioca (Essinger, 2005), a possível relação com a música eletrônica (Palombini, 2009; Sá, 2007) e a primeira abordagem propriamente dentro da Musicologia (Russano, 2006).
A primeira metade da década de 2000 contempla a publicação de dois livros jornalísticos com enfoques distintos sobre o funk carioca. O primeiro deles é o livro “Dj Marlboro na terra do funk – Bailes, bondes, galeras e MCs” da jornalista Suzana Macedo, em 2003. No livro, a narrativa do protagonismo do DJ Marlboro para a cena funk carioca é mais uma vez desenvolvida. Isso ocorre na medida em que o artista é colocado para comentar fatos que vinham ocorrendo na trajetória do funk carioca até então como a competição entre o funk carioca e o fenômeno da axé music pela preferência popular (Macedo, 2003, p. 86) na segunda metade da década de 1990 e a interação conflituosa entre as galeras, os bondes e os MCs com a sociedade carioca no mesmo período. Além disso, o DJ Marlboro também aborda o progressivo desenvolvimento do subgênero proibidão, um subgênero de funk associado à narrativa da violência a partir de dentro das favelas do Rio de Janeiro, de forma articulada com o aumento da perseguição aos Mcs e ao funk carioca como um todo por mecanismos de repressão e censura desenvolvidos pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro.
O segundo livro, lançado no ano de 2005 é o livro jornalístico “Batidão – Uma história do Funk” do jornalista Silvio Essinger. No livro, o autor retoma a historiografia dos bailes funk iniciada pelo trabalho de Vianna (1987) e a expande quanto às influências musicais e estéticas que compuseram a história do funk carioca até então. O objetivo do autor é costurar uma rede de personagens, grupos musicais e de gêneros que constituíram a história do gênero musical. O resultado do trabalho é uma narrativa que privilegia detalhes quanto a biografias e exemplos musicais obtidos em entrevistas, pesquisas de campo e do posterior trabalho de montar o quebra-cabeça dos entrelaçamentos que repercutiriam na sonoridade do funk carioca ou, ao menos, nas influências sonoras que compuseram a trajetória de diferentes cenas musicais no Rio de Janeiro.
Em um primeiro momento, o autor diferencia a cena black music da década de 1970 (Essinger, 2005, p.17) da cena funk carioca identificada a partir da década de 1980. Esta diferenciação ocorre a partir da apresentação dos fatores políticos, estéticos e comerciais que influenciaram o surgimento de bailes de música dançante e de uma cena black que se relacionava com a movimentação identitária promovida pela negritude norte-americana dos anos 60. O soul de James Brown era porta-voz de uma explosão de orgulho negro que reverberava pelos vinis importados dos Estados Unidos e que era transmitido pela onda das rádios cariocas (Essinger, 2005, p. 17). No entanto, a identificação desse gênero musical com um processo de consciência negra só viria a acontecer a termo a partir do encontro entre Mr. Funky Santos e Dom Filó no finado Astória Futebol Clube, na Zona Norte do Rio de Janeiro, no início da década de 70 (Essinger, 2005). Esses personagens seriam fundamentais para a compreensão da diferença entre os bailes black com temática estético-musical ligada à valorização da raça negra e os outros bailes que também tocavam o soul e outros gêneros norte-americanos como o rock e que não possuíam uma elaboração ideológica em torno da realização dos seus encontros, como os Bailes da Pesada. Do contexto da cena black Rio, surgiriam as primeiras equipes de som como a Soul Grand Prix e a Black Power que viriam a se multiplicar pelo subúrbio do Rio de Janeiro e que influenciariam determinantemente a circulação da sonoridade black por toda a cidade (Essinger, 2005, pp. 23-24).
O início da década de 1980 assistiria à influência do Movimento Hip-Hop de Nova York no Rio de Janeiro e no mundo em termos de novas possibilidades de criação vocal como o rap entoado por MCs sobre uma base ou sobre um beat, de técnicas de criação musical como o break e o loop, além de uma nova dinâmica para os bailes com a constituição de uma estética identificada com a arte urbana (Essinger, 2005, p.57). Desse movimento, o autor sublinha um dos pais-fundadores da cultura hip-hop, Afrika Bambaataa (Essinger, 2005, p. 60) e a sua composição musical Planet Rock para enfatizar o surgimento e a importância do gênero que viria a ser conhecido como electro-funk para o funk carioca:
Foi coisa do outro mundo. As batidas do funk deram lugar a um ritmo reto, eletrônico, como o do Kraftwerk, só que executado por uma moderna bateria eletrônica, a TR-808, da Roland. Além dos diversos timbres eletrônicos, chamava a atenção o som profundo de bumbo que a TR conseguia produzir – a base do hip-hop que formava, e, é claro, a dos batidões do funk carioca [...] (Essinger, 2005, p. 61).
Esse gênero musical criado no mesmo período histórico que outros dois gêneros também afro-americanos como o house e o techno de Detroit (Essinger, 2005, p. 61; Burnim; Maultsby, 2015) passaria a ser consumido nos subúrbios do Rio de Janeiro e seria progressivamente batizado por funk (Essinger, 2005, p. 62). A partir de um continuum dentro da sonoridade eletrônica, o autor também cita os gêneros musicais freestyle18 e o Miami Bass como presentes na constituição do início do movimento funk no Brasil. Nas palavras do DJ Marlboro:
[...] a gente chamava aquilo de funk porque nós vínhamos dos bailes funk, que tocavam funk mesmo. Aí veio aquela música eletrônica, que chamávamos de funk porque não havia outra denominação. (...) passou ali no meio daqueles funks naquele momento e a gente começou a chamar de funk (Essinger, 2005, p. 92).
Em outras palavras, a expressão “funk” aglutinava um conjunto de gêneros musicais eletrônicos dançantes presentes nos programas de rádio e nos alto-falantes das equipes de som que embalavam milhares de pessoas nos bailes funk realizados no subúrbio da cidade do Rio de Janeiro em meados da década de 80 (Essinger, 2005, p. 64).
Ainda neste livro, uma segunda importância do pesquisador Hermano Vianna para a historiografia do funk carioca é evocada no transcurso do episódio em que o antropólogo presenteia o DJ Marlboro com uma bateria eletrônica Boss DR-110 nos anos finais da década de 198019 (Essinger, 2005, p. 81). Com esta atitude, segundo o autor, o pesquisador teria contribuído para a elaboração do primeiro álbum de funk carioca elaborado até então, o Funk Brasil I, na medida em que as bases rítmicas das músicas do álbum viriam a ser programadas pelo DJ Marlboro na bateria eletrônica recém-presenteada. Além disso, o álbum lançado pela Polygram teria permitido o início de um processo de nacionalização (pp. 82 e 95) da sonoridade do funk carioca à proporção que incorporava práticas que já vinham ocorrendo no baile funk, como o canto de letras em inglês no formato de paródias em português (os melôs, faixas 4, 5, 6 e 7) e no canto falado do rap (faixa 3).
Nesse mesmo contexto de nacionalização do funk, o autor cita o álbum Super Quente do Dj Grandmaster Raphael lançado meses depois que o álbum do Dj Marlboro pela gravadora CID (Essinger, 2005, p. 95). No álbum, o DJ Grandmaster Raphael também inclui músicas em português e apresenta inovações em relação ao álbum que o precedeu como, por exemplo, o recurso estilístico que viria a ser conhecido como neurótico e o procedimento de utilizar melodias de cantigas infantis com novas letras. A programação das baterias e, consequentemente, da estruturação rítmica também ficaria a cargo do Dj Grandmaster Raphael e da sua Equipe Super Quente.
Nos capítulos que se seguem, o autor prossegue em sua jornada de narração de fatos paradigmáticos na história do funk carioca a partir da década de 1990 como, por exemplo, os festivais de galera (Essinger, 2005, p. 98), as montagens (Essinger, 2005, p. 110), a utilização da base Volt-Mix e de outras bases importantes para os primeiros anos de funk carioca (Essinger, 2005, p. 111), a reação da sociedade carioca e da mídia jornalística aos crescentes e numerosos bailes funk carioca (Essinger, 2005, pp. 117-119), os arrastões nas praias da Zona Sul do Rio de Janeiro (Essinger, 2005, pp. 123-124), a suposta ligação com o tráfico de drogas (Essinger, 2005, p. 134), a ascensão de duplas de Mcs com sucessos na TV Globo (Essinger, 2005, p. 159) e fatos que buscam ilustrar a intensa e conflituosa dinâmica entre o funk carioca e a sociedade carioca em um primeiro momento e posteriormente em todo o território nacional.
No âmbito acadêmico, o funk carioca passaria de objeto de interesse dos domínios das áreas da Antropologia Cultural, da Educação e da Comunicação para as áreas de Letras, Ciências Sociais, Psicologia e, finalmente, para a área de Música. O primeiro trabalho a analisar propriamente a estrutura musical do funk carioca, e a inaugurar o interesse da etnomusicologia e da musicologia pelo funk carioca foi a dissertação de mestrado intitulada “Bota o fuzil pra cantar: o funk proibido no Rio de Janeiro” de Rodrigo Russano em 2006. A ênfase desse trabalho foi para o subgênero de funk carioca denominado pelo autor de proibido, o qual o autor descreveu como um dos “estilos” pertencentes ao funk carioca (Russano, 2006, p. 6). Nesse trabalho, o autor parte de etnografia de quatro bailes funks, a análise de cinco20 CD-Roms21 (CDs) adquiridos no Mercado Popular da Uruguaiana e no Camelódromo da Saens Peña e de duas entrevistas com Wagner Domingues Costa, conhecido como Mr. Catra (1968-2018).
Sob o escopo teórico dos conceitos de “mundos artísticos” (Becker, 1982), o autor constrói o argumento de que o funk proibido não é só apologia à violência e ao uso de drogas como sustenta o poder legislativo para defender a sua criminalização. Segundo o autor, o funk proibido faz emergir os embates entre o asfalto e a favela, instrumentalizando-se como ferramenta de representação, visibilidade e de poder face à exclusão social que jovens negros favelados percebem na sociedade carioca (Russano, 2006, p. 37). A trajetória do artista Mr. Catra até então é utilizada pelo autor para sustentar o seu argumento de que uma transição entre o funk proibido, sinônimo de produto a ser consumido de forma ilegal, para o “funk consciente” (Russano, 2006, p. 33) estaria em curso. Em outras palavras, os artistas que desejassem se incorporar ao sistema da indústria cultural deveriam modificar o conteúdo das letras, excluindo a apologia deliberada a facções e a prática criminosa em detrimento do conteúdo de crítica social aceita pelo establishment, cerne do que seria “funk consciente”.
A análise dos CDs ocorre em duas etapas: a análise das letras, relacionando os seus conteúdos com a sociedade e a análise musical, na qual o autor procurará discorrer sobre a capa, a embalagem das mídias e sobre a estrutura musical a partir de transcrições em partitura. Ao analisar o conteúdo das letras das mídias selecionadas, o autor identifica que o conteúdo predominante nos primeiros álbuns com apologia às facções, e à violência diminui consideravelmente nos dois últimos CDs. Nesses últimos, o autor identifica conteúdos românticos, eróticos, humorísticos e mesmo faixas sem uma mensagem direta em que ocorre apenas a simulação de uma situação de confronto bélico a partir do uso de samples de tiros e de ameaças sem direcionamento específico. Por fim, o autor caracteriza o progressivo crescimento do que denominou por “bandido romântico”, isto é, o indivíduo que exerce um poder “apaixonado” e de forma positiva pelo ambiente da favela, com ênfase na exaltação dos seus feitos para a comunidade e da sua ligação respeitosa com o Cristianismo.
A estética dos CD’s revela uma confecção artesanal replicada de forma caseira (Russano, 2006, p. 56), o que se reflete também na forma em que os CD’s eram distribuídos pelos produtores e obtidos pelo público final22. Normalmente organizados em formas de coletâneas gravados ao vivo nos bailes de favela, esses álbuns apresentavam o nome de cada faixa e os nomes dos artistas participantes dos álbuns sem, no entanto, oferecer maiores informações sobre a data e o local em que foram gravados. A ausência de maiores informações em relação aos produtores e distribuidores condiz com a estratégia de manter a circulação dos álbuns em um circuito restrito, o qual se comunicava a partir de códigos particulares.
Segundo o autor, o funk proibido possui como características: 1) “o uso de diálogos antes das músicas” (Russano, 2006, p. 60); 2) a reprodução pelos Mcs de um código moral comprometido em disseminar os valores defendidos e compartilhados pela bandidagem que representa; 3) a necessidade de “travestir a realidade por meio do espírito carnavalesco” (Russano, 2006, p. 67) bakhtiniano com a utilização de paródias de músicas norte-americanas (Russano, 2006, p. 64) e ou de canções folclóricas, prática que teria iniciado com o samba carioca (Russano, 2006, p. 65) e viria a ser utilizado também pelo forró de Luiz Gonzaga (Russano, 2006, p. 66); e 4) adaptação da mesma melodia em dois contextos: o midiático, sem palavrões ou violência e o proibidão, apologista do tráfico (Russano, 2006, p. 65).
O autor selecionou duas melodias, as faixas 10 do disco G3 e Amigos e a faixa 19 do disco proibidão 13 C.V + R.L. Vermelhão e a grade da faixa 8 desse último álbum para a análise musical. Dentre as considerações gerais sobre as músicas analisadas, o autor cita que as músicas são organizadas em uma “cama”, reunida em um “arranjo” único com a “batida” (a estrutura rítmica de acompanhamento) variada pela utilização de samples e na qual é cantada a “música”. O autor, no entanto, não problematiza a utilização desses conceitos para analisar o funk carioca, articulando-os com um único referencial analítico da musicologia, o tratado sobre construção harmônica de Flo Menezes (2002). A utilização desse repertório analítico permitiu que o autor determinasse o quanto o material de funk proibido analisado se afastava da “norma esperada” dentro de uma lógica musical eurocentrada para uma obra musical no que se refere a alturas dentro de tonalidades definidas, ornamentação contrapontística e conformação harmônica propriamente dita. Por consequência, o autor apenas descreve eventos musicais sem se aprofundar nos fenômenos que levaram ao desenvolvimento daquelas faixas musicais como tais. A abordagem não permitiu, por exemplo, conhecer ou refletir sobre possíveis gêneros musicais dos quais o funk proibido poderia ter sido derivado ou sobre técnicas que pudessem ter sido utilizadas para a sua produção. Contudo, não se pode negar que o trabalho de Russano (2006) apresentou a primeira abordagem do funk carioca com referenciais teóricas da musicologia apesar de problematizar o subgênero de funk carioca conhecido como proibidão pressupondo-se que já tivesse sido feita uma abordagem dos elementos que configuram o funk carioca como gênero independente com os referenciais da Musicologia. Como vimos, no entanto, o que havia até então era o trabalho jornalístico de Sílvio Essinger (2005) e um debate, no meio acadêmico, que continuava a tratar o funk carioca principalmente como uma manifestação cultural oriunda de gêneros musicais da cena black dos anos 70 como o funk e o soul.
No ano seguinte, em 2007, o artigo “Funk carioca: música eletrônica popular brasileira?!” da pesquisadora Simone Pereira de Sá aprofunda a abordagem do funk carioca como um tipo específico de música eletrônica23 pertencente à música eletrônica de pista24 (Sá, 2007, p. 2). A investigação da autora sobre novas práticas de discotecagem no Brasil a levaram a aprofundar uma discussão iniciada em uma troca de mensagens ocorrida entre os DJs Dolores e por um usuário chamado Caio na lista de discussão virtual Pragatecno (Sá, 2007, p. 2) especificamente sobre a “dimensão eletrônica” do funk carioca. Nesse artigo, a autora também inicia uma discussão sobre reapropriação no funk carioca conforme uma “circularidade cultural” observável a nível global em outros gêneros musicais como o rock norte-americano e a Jovem Guarda (Sá, 2007, p. 7) e como característica típica para a compreensão dos gêneros musicais eletrônicos (Sá, 2007, p. 11).
No contexto de circularidades e reapropriações, a autora propõe uma historiografia para o funk carioca baseada nas trocas culturais entre esse gênero e os gêneros de outros países como o funk e o Miami Bass norte-americano. A primeira fase coincidiria com a cena black Rio na década de 70 e a posterior manutenção dessa cena nos subúrbios cariocas do início da década de 80 (Sá, 2007, p. 7). A segunda fase, por sua vez, teria sido marcada pela entrada do Miami Bass no Brasil entre meados da década de 80 até o final desta década. Para a autora, o processo de nacionalização do funk (Sá, 2007, p. 10) teria se iniciado com a bateria eletrônica dada de presente ao DJ Marlboro por Hermano Vianna e teria se intensificado a partir do processo de criação dos melôs em processo “oficializado” pela gravação do Melô da Mulher Feia:
A partir deste momento, as letras em português vão sendo apresentadas nos bailes até que, já́ em ٩٣ ou ٩٤, as equipes só tocam músicas com letras “cem por cento nacionais”. A nacionalização se dá́ em cima da batida sonora do Miami Bass e da prática do sampler –a prática de pegar-recortar-copiar-misturar que, sob influência do rap, tornou-se característica da música eletrônica (Sá, 2007, p. 11).
Em outras palavras, uma “apropriação criativa, que resulta num produto obviamente híbrido” (Sá, 2007, p. 9) teria acontecido na adaptação de letras em inglês com sentido totalmente diverso do original mantendo-se apenas a sonoridade das palavras e as versões instrumentais das bases dessas músicas. Todavia, a autora não aborda as músicas que já existiam desde os finais da década de 80 e que foram desenvolvidas por outros processos de criação sem melôs ou bases provindas de LPs norte-americanos como a faixa Entre nessa onda presente no Funk Brasil I (1989) ou a faixa Bananeira Rap, do álbum Super Quente (1989). Além disso, a autora não cita a importância de beats utilizados como bases paradigmáticas (Moutinho, 2020) para a história do funk carioca como o single Volt-Mix (808 Volt Mix, do DJ Battery Brain, 1988) e o electro-funk Light Years Away do grupo Warp 9 (1983).
Nesse trabalho, a autora descreve a terceira fase para o funk carioca como o momento em que o gênero invade “espaços distintos de seus bailes de origem” (Sá, 2007, p. 12) como desfiles de moda, o festival de música Tim Festival e em uma progressiva presença nos circuitos de música eletrônica europeus e dos Estados Unidos (Sá, 2007, p. 14). A autora atribui a entrada do funk carioca nesses circuitos em virtude de sua aproximação com o electroclash25, o qual lhe confere “legitimidade cultural” no circuito de música eletrônica mundial:
Subitamente, aquelas músicas gravadas toscamente, especialmente quando cantadas por mulheres que combinam humor e ironia falando do que gostam em matéria de sexo passam a “fazer sentido”, pois remetem ao universo musical –não só em termos de sonoridade como quanto às temáticas e uma certa postura de palco, com roupas colantes e danças provocantes– de Miss Kittin, Peaches, etc (Sá, 2007, p. 14).
A afirmação da autora sobre um suposto caráter amador (gravações toscas) e hiperssexualizado do funk carioca parece reduzir todo um gênero musical a uma caricatura a fim de explicar a alocação do funk carioca como um gênero musical exótico na “difícil e sofisticada cena inglesa na virada dos anos 90 para 2000” (Sá, 2007). Além disso, a autora não aborda a influência do electrofunk nos períodos anteriores de elaboração do funk carioca e que já haviam sido descritas por personagens como o próprio Dj Marlboro em livros e em entrevistas durante o período de publicação daquele trabalho (Essinger, 2005).
Ainda no ano de 2007, a tese de doutorado intitulada “O SLA Funk de Fernanda Abreu” de Paula (2007, p. 70) apresenta uma outra proposição de atualização da historiografia do funk carioca.26 No trabalho, a autora propõe três ciclos para o funk carioca denominados respectivamente como: primeiro ciclo, “fase black power” ou soul-funk (entre as décadas de 1960 e 1980); segundo ciclo, gang funk (ao longo das décadas de 1980 e 1990) e terceiro ciclo, new funk (entre 1990 e 2000) ou new funk carioca (Paula, 2007, p. 61). Para a autora, a fase black power se caracterizaria pelo aparecimento do funk no Brasil, a fase gang funk seria caracterizada pela inclusão da “violência como temática principal” (Paula, 2007, p. 65) e a fase new funk carioca a partir de uma mudança de paradigma em que “a violência diminui e o espaço fica aberto à liberação do sexo, da pornografia e da promiscuidade” (Paula, 2007, p. 70). Em suma, os ciclos descritos pela autora apontam para uma tentativa de segmentação segundo o critério do conteúdo lírico das obras sem, no entanto, abordar a natureza dos conceitos utilizados e tampouco em sustentar tais ciclos a partir do que diziam os próprios funkeiros e participantes daquele movimento.
Em seu trabalho, Paula (2007) discute o funk ora como uma manifestação do movimento hip-hop (Paula, 2007, p. 19) e ora como ritmo (Paula, 2007, p. 28) sem, em nenhum momento, caracterizar ou problematizar propriamente os termos utilizados. Além disso, a autora credita ao funk um processo de homogeneização da música no Brasil liderado pela indústria cultural sem considerar as discussões elaboradas por Vianna (1988; 1990) e Herschmann (2000) sobre a relação entre o funk carioca e a indústria cultural:
Essa “lavagem cerebral” de invasão do funk a tantos espaços faz com que ele se torne “moda” e atraia pessoas que só passam a produzi-lo ou consumi-lo com vistas ao “status” e à posição financeira proporcionados por essa música (Não que não haja quem aprecie esse ritmo musical. No entanto, há também quem utilize a “moda funk” apenas para lucrar). Assim, o Brasil passa pelo processo de avassaladora invasão dessa “moda” rítmico-linguístico- cultural que vem sendo conhecida como “funkinização” (Paula, 2007, p. 22).
Os limites entre as convicções pessoais da autora e a sua abordagem científica se confundem no trabalho na medida em que a autora realiza diversas afirmações que transparecem o seu juízo moral sobre o funk carioca a partir da utilização de adjetivos como “estranho”, “chocante” (Paula, 2007, p. 89), “absurdamente machistas (Paula, 2007, p. 90) e a supracitada “lavagem cerebral” supostamente realizada pelo funk carioca. Ademais, a autora realiza afirmações sem transparecer a sua fonte de pesquisa, como é o caso da afirmação de que os bailes funks são organizados por marginais para a venda de drogas (Paula, 2007, p. 88). Esse tipo de declaração em um trabalho científico sem as devidas fontes e referências colabora para a propagação de falácias sociais que só colaboram para a perseguição ao funk carioca e para a estigmatização de manifestações culturais ligadas e fruídas pelo povo negro e favelado, caso do funk carioca.
A busca por maior aprofundamento na historiografia do funk carioca levou o musicólogo Carlos Palombini a iniciar uma pesquisa sobre a relação entre os bailes black dos anos 70 e a sua correlação com os bailes funk da década de 80 (Palombini, 2008; 2009) no esteio da pesquisa realizada por Essinger (2005). Embora o autor discorra que a relação entre os bailes black e os bailes funk ainda não foi plenamente esclarecida (Palombini, 2008, p. 47), as suas investigações originam definições importantes para a narrativa do funk carioca como prática musical dentro da musicologia. Dentre elas, podemos citar a ratificação da diferença enunciada por Essinger (2005) entre o gênero musical funk norte-americano (majoritariamente presente na cena musical da década de 1970) e o funk carioca sob o ponto-de-vista musical e a definição de sete subgêneros de funk carioca nos termos do que vinha sendo utilizado até então:
Além do proibidão, também conhecido como funk proibido, rap de contexto ou funk de facção, os subgêneros musicais incluem o funk sensual (ou putaria), funk consciente, funk melody, funk de raiz, gospel funk e montagem (explorando a repetição rítmica de fragmentos vocais, como no início da house) (Palombini, 2008, p. 52).
Apesar de utilizar quatro outros sinônimos para caracterizar as mesmas temáticas, os subgêneros elencados por Palombini parecem se relacionar com quatro dos cinco subgêneros citados no trabalho de Paula (2007, p. 22) com exceção do “funk ecológico”. O funk proibidão é referido da mesma forma por ambos enquanto, respectivamente, o “funk erótico” de Palombini (2009) corresponde ao “funk sensual (ou putaria)” descrito por Paula (2007), o “funk consciente” ao “funk político”, “o funk romântico” ao “funk melody”, restando os subgêneros “funk de raiz”, “gospel funk” e “montagem” do primeiro e “funk ecológico” da segunda autora sem equivalentes aparentes. Vale ressaltar que Paula (2007) afirmou existirem tipos de funk com características regionais, como o funk baiano e o funk paulista, sem oferecer argumentos sobre as particularidades das categorizações propostas.
No ano de 2008, dois livros de caráter historiográfico sublinharam critérios de produção do funk carioca e o seu caráter de “mistura” com outros gêneros musicais. O primeiro deles é o livro “Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade”, de 2008, do historiador cearense Jairo Severiano. Nesse livro, o autor corrobora o que já havia sido narrado no livro de Essinger (2005) sobre a predileção dos produtores de funk carioca por sons graves na estrutura do funk carioca. Segundo o autor, “é possível que [o que] tenha motivado essa preferência [foi] a existência de certa afinidade entre o Miami bass, com suas frequências graves, e o som do surdo das escolas de samba” (Severiano, 2008, p. 455). No entanto, o próprio autor reconhece em entrevista publicada no mesmo ano27 que a intenção de apresentar o funk carioca em seu livro foi meramente para fins de registro histórico com base no livro de Essinger (2005) e nas obras que ele próprio selecionou como necessárias para compreender o funk carioca. O segundo livro é o “Alguns Aspectos da MPB” de Euclides Amaral (2008). Nesse livro, o autor discute o funk carioca dentro da dimensão de uma continuidade com o movimento funk da década de 70. No entanto, o autor estabelece diferenças que influenciaram a sonoridade do funk carioca em comparação com o funk oriundo dos Estados Unidos, como a relação com o Miami Bass (Amaral, 2008, p. 145), as “influências sofridas por gêneros brasileiros” (Amaral, 2008, p. 169), o “hibridismo de ritmos como maculelê, samba, rap (...)” (Amaral, 2008, p. 173) e as diferenças entre o rap e o funk carioca (Amaral, 2008, p. 107). No entanto, a narrativa do autor não permite identificar o que é opinião do autor ou o que é efetivamente oriundo de uma pesquisa científica apesar de eventualmente o autor citar trechos de livros que dialogam com os seus argumentos.
Os trabalhos realizados na década de 2000 sobre o funk carioca apresentam um interesse progressivo em caracterizar melhor o gênero musical funk carioca seja por um aprofundamento de sua historiografia (Essinger, 2005; Macedo, 2003; Paula, 2007; Palombini, 2008 e 2009; Sá, 2007), ou por uma evidenciação das nuances de seus subgêneros (Russano, 2006; Paula, 2007; Palombini, 2008 e 2009). A partir da segunda metade da década de 2000, o trabalho de Russano (2006) estabelece uma abordagem musicológica a um dos subgêneros do funk carioca, o funk proibido. A partir desse trabalho, torna-se possível delinear o início do estabelecimento de uma diferenciação entre o baile funk carioca e o funk carioca a partir de referenciais advindos da Musicologia e da Etnomusicologia ou de áreas que lhe são afins, como a Antropologia e a Sociologia.
Na década seguinte, os estudos sobre a cena funk carioca cresceram nacionalmente com destaque para a relação entre o funk e a diáspora negra na medida de uma continuidade de experiências (Laignier, 2013; Lopes, 2010) e na análise musicológica da ocorrência de variações na estrutura sonora do funk carioca (Cáceres et al., 2014; Laignier, 2013). Apesar dos avanços em termos de abordagens musicológicas ao funk carioca, algumas questões ainda permaneceriam em aberto, como: a) a influência de gêneros musicais afrodiaspóricos como os de origem afro-americana e afro-brasileira no contexto da cena funk carioca; b) a especificação da influência, dentro de dimensões estruturais, sonoras e de conteúdo temático, dos mesmos gêneros musicais na elaboração dos primeiros álbuns do funk carioca em 1989; c) a análise pormenorizada de um pressuposto presente na narrativa de produtores e personagens da cena funk carioca sobre uma possível ascendência africana de ordem rítmico-musical nos beats e, consequentemente, nas produções de funk carioca.
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Biografia
Renan Ribeiro Moutinho
É Professor Adjunto do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ). Doutor em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (PPGM/UNIRIO) com período sanduíche na The Hugh A. Glauser School of Music, Kent State University (USA) sob a orientação do Kazadi wa Mukuna. Mestre em Relações Étnico-raciais pelo PPRER/CEFET-RJ, Especialista em Educação Musical pelo Conservatório Brasileiro de Música (CBM/CEU) e graduado em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Pesquisa funk carioca, musicalidades afrodiaspóricas, música bantu, artes afrodiaspóricas e o diálogo entre as Relações Étnico-Raciais e o Ensino de Artes/Música. Pesquisador-fundador do GPEMUDA – Grupo de Pesquisa em Educações Musicais Urbanas da Diáspora Africana.
1 Sobre este tipo de baile, ver o relato do DJ Mamut em entrevista para o Canal Borracha Forte em fevereiro de 2019: https://www.youtube.com/watch?v=JUG50p_9k0U. Acesso em 15 de novembro de 2020.
2 É importante destacar que o presente artigo apresenta o recorte de uma pesquisa exploratória acerca do estado da arte do funk carioca de duração mais ampla, a saber: de 1987 até o ano de 2018. A complementação dessa pesquisa está prevista para ser publicada em um artigo específico em momento oportuno.
3 Disponível em https://www.academia.edu/. Acesso em 13 de maio de 2019.
4 Essa dissertação de mestrado viria a ser publicada em livro no ano seguinte, 1988, sob o título “Mundo funk Carioca” pela Editora Zahar.
5 Essa afirmação é compartilhada por Palombini (2008) e Lopes (2010) na medida da quantidade de trabalhos posteriores que referenciaram este trabalho de Vianna (1987), tornando-o obra basilar para a abordagem da cena funk carioca.
6 Encontros musicais em que os Djs tocavam música negra reuniam milhares de pessoas por final de semana (Vianna, 1987).
7 Segundo entrevista realizada pessoalmente com o Dj Marlboro, no primeiro semestre de 2018, junto com os pesquisadores Carlos Palombini e Dennis Novaes, este evento é decisivo para o surgimento das grandes equipes de som responsáveis por promover bailes de música negra e de cocota nos subúrbios do Rio de Janeiro. Dentre estas equipes, podemos citar cronologicamente: a Soul Grand Prix, a Cash Box, a Furacão 2000, dentre outras (Essinger, 2005).
8 Para mais informações, ver http://djgasparzinho.blogspot.com/2008/02/origem-do-funk.html. Acesso em 13 de maio de 2019.
9 Está música é a primeira faixa do álbum solo Conselho (Essinger, 2005). Para maiores informações, ver: https://www.discogs.com/MC-Batata-Conselho/release/3336203. Acesso em 14 de abril de 2019.
10 Sobre este assunto, ver 1) http://baixadafacil.com.br/colunistas/o-que-e-funk-2000.html e 2) http://linhacaatomica.blogspot.com/2016/04/dj-tubarao-entrega-apoio-da-globo-ao.html. Acesso em 13 de maio de 2019.
11 Designa um conjunto de jovens que se identificavam conforme o seu pertencimento à uma favela ou a uma comunidade específica no contexto da cidade do Rio de Janeiro.
12 Lei nº 2.518 de 02 de dezembro de 1996 de autoria do vereador Antônio Pitanga. Disponível em: https://mail.camara.rj.gov.br/APL/Legislativos/contlei.nsf/7cb7d306c2b748cb0325796000610ad8/538756f1277706e3032576ac007337da?OpenDocument#TOPO. Acesso em 14 de abril de 2020.
13 Para mais sobre este assunto, ver a dissertação de mestrado “A criminalização do funk sob a perspectiva da teoria crítica” (Cymrot, 2011).
14 Sobre este assunto, ver as seguintes legislações, ambas já revogadas: a): Lei nº 3.410/00 e Lei nº 5.265/08 (ALERJ, 2000).
15 Sobre esse ponto, ver Moutinho (2020).
16 Não confundir com o “Melô da Macumba 2” ou “Melô do Macumbão”, o electro-funk “This Jam” (1989) do grupo “Raw Dog” disponível no álbum Furacão 2000 (1991) e em:
https://www.youtube.com/watch?v=Y6jKC_cd4Sw. Acesso em 14 de janeiro de 2021.
17 Sobre este ponto, ver Moutinho (2020).
18 Segundo Essinger, o gênero passaria a ser conhecido como funk melody no Rio de Janeiro em função da sua diferenciação em termos de um “estilo mais pop e latino de Hip-Hop” (Essinger, 2005, p. 66).
19 Segundo Sá (2007, p. 10), a bateria eletrônica teria sido dada ao DJ Marlboro pelo antropólogo Hermano Vianna no ano de 1985.
20 Os cds são: 1) Proibidão 13 – CV + RL; 2) G3 e Amigos; 3) Menor do Chapa convida MC Frank; 4) Mc Sabrina; e 5) Neurótico 29.
21 Mídias de armazenamento digital conhecidas como Compact Disc Read-Only Memories.
22 Essa distribuição rudimentar e “paralela” à Indústria Cultural característica do funk carioca já havia sido abordada por Vianna (1990).
23 Essa perspectiva viria a ser compartilhada por artistas do funk carioca como pode ser observado em entrevista do Mr. Catra no Documentário Doc Mix (30’’) disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=xaZNWzKiO7U. Acesso em 14 de outubro de 2020.
24 Segundo a autora, “Por música eletrônica de pista entendo a música para dançar tocada por DJs para um público em espaços abertos (raves) ou fechados (clubs) – e cujo recorte cronológico remonta ao final dos anos 80, especialmente ao cenário londrino dos clubs e raves” (Sá, 2007, p. 2).
25 Segundo a autora, o electroclash seria um gênero de música eletrônica oriundo do electro surgido da década de 70 para a década de 80 em Nova York em que “o som mais sujo e primitivo e o retorno dos vocais são as marcas registradas dessa sonoridade” (Sá, 2007, p. 12).
26 Nesse trabalho, a autora também identifica diferentes subgêneros de funk carioca como o funk erótico, funk romântico, funk político e funk ecológico (Paula, 2007, p. 22), além de variações regionais no que denominou por “generalização deste ritmo musical” (Paula, 2007).
27 Para ler a entrevista completa: https://pedroalexandresanches.wordpress.com/tag/jairo-severiano/. Acesso em 14 de janeiro de 2021.