Estimativa da densidade de veículos em pelotões em rodovias de pista simples com faixas adicionais


"Ana Carolina Felício Bicalho

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.

Thais Berger Barbosa da Silva

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.

Juliângelo Kayo Sangi de Oliveira

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.

José Elievam Bessa Júnior

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.
ORCID: 0000-0002-1958-8794

Recibido: 3/3/2023. Aceptado: 14/12/2023.

Resumo

As análises de nível de serviço e de capacidade fornecem subsídios para a determinação da oferta em rodovias. O Highway Capacity Manual, que está na 7ª edição (HCM-7), é o principal documento para análise de capacidade e nível de serviço no âmbito mundial. Por esse motivo, devem ser realizadas adaptações para o local de aplicação, devido às peculiaridades do tráfego que variam com a localização, afetando os parâmetros comportamentais e veiculares. Nesse sentido, o presente trabalho teve, como principal objetivo, propor um método para estimar a densidade de veículos em pelotões (FD), uma medida de serviço usada para análise de rodovias de pista simples. O método proposto foi obtido a partir de dados de tráfego produzidos com um simulador, o Aimsun Next, que foi calibrado para condições locais. Para isso, dados de campo foram coletados em três segmentos de rodovias de pista simples com faixas adicionais, localizados na rodovia BR-040. Os resultados mostraram que o método desenvolvido nesta pesquisa produziu valores de FD mais próximos dos observados em campo do que com a utilização do método HCM-7.

Palavras-chaves: Highway Capacity Manual. Faixa adicional. Nível de Serviço.

Follower density estimation on two-lane rural highways with passing lanes

Abstract

The analyses of the level of service and the capacity provide subsidies to determine the supply of highways. The Highway Capacity Manual, in the 7th version (HCM-7), is the primary document for analyzing capacity and level of service worldwide. Therefore, adaptations must be made at the place of application due to traffic peculiarities that vary with the location, affecting behavioral and vehicular parameters. Thus, as its main objective, the present work had to propose a method to estimate the follower density (FD), a service measure used to analyze two-lane highways. The proposed method was based on traffic data produced with a simulator, the Aimsun Next, calibrated to the local conditions. For this, field data were collected on three two-lane highway segments with passing lanes located on BR-040 road. The results showed that the developed method in this paper produced FD values closer to those found in the field when compared to the values obtained with the HCM-7.

Keywords: Highway Capacity Manual. passing lane. Level of Service.

Introdução

As rodovias possuem um papel fundamental para qualquer país, uma vez que permitem a distribuição de bens e passageiros a longas distâncias. No Brasil, de acordo com CNT (2022), o modo rodoviário foi responsável por 65% do transporte de produtos e 90% do transporte de passageiros em 2022.

O nível de serviço de uma rodovia está relacionado com a qualidade de sua operação e retrata aspectos como a fluidez do tráfego, a possibilidade de mudar de faixa e o espaçamento entre os veículos. Esse conceito é muito útil para os analistas de tráfego e podem ser utilizados para avaliar diferentes níveis de congestionamentos, buscando-se levar em consideração a percepção dos usuários das vias. Sendo assim, os resultados das análises de nível de serviço fornecem subsídios para avaliação da qualidade de operação de rodovias existentes e para desenvolvimento de políticas de transporte (Demarchi e Setti, 2000; Choocharukul et al., 2004).

Sabe-se que o Highway Capacity Manual, ou HCM (TRB, 2022), é utilizado mundialmente como fonte para os métodos de análise de nível de serviço e capacidade. Entretanto, o HCM é aplicado na maioria dos estudos sem que haja uma adaptação prévia dos métodos para que se adeque às condições observadas localmente, uma vez que tanto os parâmetros comportamentais quanto os aspectos relativos ao tipo de veículo são elementos variáveis de acordo com o local em estudo. Nesse contexto, ao se aplicar a metodologia do HCM incorretamente, os resultados acerca do nível de serviço e da capacidade de determinado sistema viário podem ser imprecisos. Se a realidade não é retratada de maneira verossímil, há a possibilidade de o sistema viário ser subestimado e a análise incorreta implicará em gastos desnecessários com melhorias, enquanto, ao ser superestimado, haverá baixa implementação de melhorias importantes para um bom desempenho do sistema (Paula, 2006).

De acordo com Jain et al. (2021), a operação em rodovias de pista simples difere das rodovias de pista dupla em função da necessidade de os veículos utilizarem o sentido oposto para realizar ultrapassagens. Em casos em que as zonas de ultrapassagens proibidas são curtas, a qualidade operacional tende a ser tão ruim quanto se apenas houvesse zonas de ultrapassagens proibidas (Harwood et al., 2008; Harwood et al., 2010; Moreno et al., 2015). Essas manobras também podem ser realizadas por meio de faixas adicionais (de subida ou de ultrapassagens), o que ajudaria a melhorar a qualidade operacional dos segmentos de rodovias de pista simples.

As faixas adicionais, de acordo com a definição do HCM, em sua 7ª edição (TRB, 2022), são segmentos curtos, implantados na mesma direção do tráfego, e funcionam como um mecanismo para permitir que veículos mais rápidos ultrapassem veículos lentos. As faixas adicionais, portanto, são um importante artifício para a dispersão dos pelotões formados em função da presença de veículos mais lentos na corrente de tráfego, além de possuir um custo de implantação mais baixo do que, por exemplo, a duplicação da rodovia (Melo et al., 2003). A eficácia da faixa adicional está relacionada com o fluxo na direção analisada, a porcentagem de veículos pesados, o alinhamento vertical e horizontal e o comprimento da faixa adicional.

No Brasil, a respeito desse tipo de rodovia, os estudos de Utimura et al. (2007), Bessa Jr. (2015), Pereira e Bessa Jr. (2017), Bessa Jr. e Setti (2011, 2018), Silva (2019) e Oliveira (2021) concluem que a adoção do método previsto no HCM sem que haja adaptação às condições locais tende a subestimar o nível de serviço em rodovias brasileiras. Tal fato corrobora com a importância da adaptação do método, que pode contribuir para a correta alocação de recursos relacionados com a infraestrutura viária.

Na literatura, para avaliação de rodovias de pista simples, é possível identificar trabalhos fora do Brasil que propuseram abordagens exclusivamente desenvolvidas para o tráfego local, sem necessariamente adotar o método proposto pelo HCM. Exemplos podem ser vistos na Argentina (Maldonado et al., 2012), Índia (Penmetsa et al., 2015), Espanha (Moreno, 2020) e até nos Estados Unidos (Al-Kaisy et al., 2017). Muitos dessas pesquisas são desenvolvidas a partir de simuladores de tráfego (Washburn et al., 2018). Os parâmetros comportamentais presentes nesses softwares também estão relacionados com as condições locais de onde foram desenvolvidos. Dessa forma, a simulação de tráfego, com a devida calibração, torna-se indispensável para representar o comportamento dos usuários e o desempenho dos veículos de maneira a alcançar resultados próximos às observações de campo.

Com a vasta utilização do HCM para análise de rodovias de pista simples, o presente estudo propôs um método para estimar a densidade de veículos em pelotões (FD), a medida de serviço que é usada na 7ª versão do HCM (TRB, 2022) para avaliar rodovias de pista simples, com ou sem faixas adicionais. Outras pesquisas (Van As, 2004; Moreno et al., 2018; Bessa Jr. et al., 2018) indicaram que a FD é uma boa medida de serviço, em substituição principalmente a porcentagem de veículos em pelotões (PTSF) por ser muito difícil de ser obtida em campo (Bessa Jr. et al., 2017), que era utilizada no HCM para refletir a qualidade de serviço em rodovias de pista simples nas versões de 2000 (TRB, 2000), 2010 (TRB, 2010) e 2016 (TRB, 2016). Os trabalhos de Al-Kaisy e Freedman (2011), Silva et al. (2021) e Oliveira e Bessa Jr. (2022) são exemplos de pesquisas que avaliaram o impacto da presença de faixas adicionais em rodovias de pista simples avaliando-se a FD como medida de desempenho.

Neste trabalho, foram desenvolvidos experimentos de simulação de tráfego com o Aimsun Next (Aimsun, 2020) devidamente calibrado para condições brasileiras. O simulador foi escolhido por possuir submodelos comportamentais que permitem modelar rodovias de pista simples adequadamente, como o de desempenho veicular, o de car-following e o de mudança de faixas, incluindo a presença de faixas adicionais, de zonas de ultrapassagens proibidas e ultrapassagens utilizando a faixa de tráfego no sentido oposto. Os resultados de FD estimados com o método proposto foram comparados com aqueles encontrados em campo e com os valores obtidos com o HCM-7, tendo sido mais próximos do que foram observados nas rodovias observadas (BR-040). A seção a seguir mostra os principais detalhes sobre o método da 7ª versão do HCM para análise de rodovias de pista simples com faixas adicionais.

Método do HCM-7 para análise de rodovias de pista simples com faixas adicionais

O método do HCM-7 para obter o nível de serviço em rodovias de pistas simples com faixas adicionais é similar ao método voltado para segmentos sem faixas adicionais. O primeiro passo consiste em analisar o tipo de segmento que será estudado. É avaliado se o segmento contém restrição ou não de ultrapassagens, além de verificar a existência de faixa adicional de subida. É verificado, ainda, se o segmento está sob influência de faixas adicionais próximas. Os passos seguintes incluem a determinação da classe do alinhamento vertical (de 1 a 5) e do tipo de segmento (com restrição de ultrapassagem; sem restrição de ultrapassagem; ou com faixas adicionais). Esses passos são necessários para calcular as medidas de desempenho – a porcentagem de veículos em pelotões (PF), a velocidade média de viagem (ATS) e o fluxo de tráfego no sentido de análise (vd) para os 15 minutos mais carregados dentro da hora de análise – que compõem a formulação da medida de serviço, a densidade de veículos em pelotões (FD).

A FD consiste no número de veículos viajando em pelotões por quilômetro por faixa. Essa medida de desempenho é utilizada para demonstrar as oportunidades de os motoristas executarem ultrapassagens e expressa o desconforto de se trafegar em pelotões. Ela é dada pela seguinte equação:

(1)

Caso a ATS precise ser estimada, então é necessário usar as seguintes formulações:

(2)

com os coeficientes m e p sendo determinados em função da classe vertical do segmento viário, da velocidade de fluxo livre (FFS), da porcentagem de veículos pesados (HV), do fator de ajuste para as larguras da faixa de tráfego e do acostamento (fLS), do fator de ajuste para a densidade de acessos (fA), do comprimento do segmento (L) e do fluxo de veículos no sentido oposto ao de análise (vo).

Para estimar o valor de PF, que consiste no percentual de veículos que trafegam com headways iguais ou menores a um valor crítico de 2,5 segundos, é possível usar a seguinte equação:

(3)

No método proposto pelo HCM-7 para análise de trechos com faixas adicionais, são realizados passos adicionais com o objetivo de obter as medidas de desempenho que compõem FD no ponto médio do segmento com a faixa adicional. Sendo assim, deve ser calculada a demanda em cada uma das faixas do segmento com faixa adicional. Para isso, primeiramente, deve ser obtida a PropFlowRateFL, que é a proporção do fluxo de tráfego na faixa adicional, conforme a seguinte equação:

(4)

em que NUMHV é o número de veículos pesados no local. Deve-se, também, obter:

(5)

(6)

em que FlowRateSL corresponde ao valor do fluxo na faixa mais lenta e FlowRateFL corresponde ao fluxo na faixa mais rápida da faixa adicional. Também é calculada a porcentagem de veículos pesados em cada uma das faixas de tráfego pelas seguintes equações:

(7)

(8)

(9)

em que HVPropMultiplierFL é a proporção de veículos pesados na faixa mais rápida, definida pelo HCM-7 como 0,4. NUMHVSL é o número de veículos na faixa mais lenta e HVSL é a porcentagem de veículos na faixa mais lenta. Aplicando a combinação dessas equações e variáveis, obtêm-se a SinitFL, a velocidade média no início do segmento na faixa mais rápida, e a SinitSL, que é a velocidade média no início do segmento na faixa mais lenta. Dessa forma, é necessário obter os valores de velocidade média para o ponto médio da faixa adicional e isso é feito por meio de um fator de ajuste. As equações utilizadas nessa etapa são apresentadas a seguir:

(10)

(11)

(12)

em que SPLmidFL é a velocidade média no ponto médio da faixa mais rápida e SPLmidSL é a velocidade média no ponto médio da faixa mais lenta.

É necessário obter as porcentagens de veículos em pelotões em cada uma das faixas do segmento com terceira faixa. Da mesma forma da ATS, a porcentagem de veículos em pelotões também é obtida em cada uma das faixas no segmento com faixa adicional. A partir da aplicação de todas as equações acima, é possível, então, obter o valor da densidade de veículos no segmento. Essa densidade é uma média simples entre a densidade obtida na faixa mais lenta e na faixa mais rápida, da seguinte maneira:

(13)

em que todos os termos já foram previamente definidos e FL significa a faixa mais rápida (faster lane) e SL significa a faixa mais lenta (slower lane) da faixa adicional.

Além disso, uma análise realizada pelo HCM-7 é a verificação do impacto de uma faixa adicional próxima a faixa adicional de análise. Para essa etapa, são utilizadas duas equações:

(14)

(15)

em que %ImprovePF é o porcentual de melhora em relação a porcentagem de veículos em pelotões e %ImproveS é o percentual de melhora em relação a velocidade. A melhora verificada em ambos os parâmetros entra como um ajuste multiplicador no cálculo da densidade de veículos em pelotões ajustada para o segmento a jusante da faixa adicional, da seguinte forma:

(16)

Com os valores de FD calculados, encontra-se o nível de serviço verificado para o segmento analisado. Caso o trecho de análise seja composto por diversos tipos de segmentos, o valor da densidade de veículos é uma média ponderada dos valores da FD obtidos para cada subtrecho:

(17)

em que, FDi é a densidade de veículos do subtrecho, Li é a extensão do subtrecho e Lt é extensão total do trecho.

Método proposto

Para o desenvolvimento desta pesquisa, foram realizadas as etapas ilustradas no fluxograma da Figura 1, que são:

1.coleta de dados de tráfego: deve-se obter dados de tráfego, como velocidade média de viagem, fluxo de tráfego e porcentagem de veículos pesados, em segmentos de rodovias de pista simples com faixas adicionais brasileiras; deve-se agregar os dados de 15 em 15 minutos e usá-los tanto para calibração do simulador de tráfego escolhido quando para validar os modelos de tráfego propostos;

2.calibração de parâmetros comportamentais do Aimsun Next: utilização de um Algoritmo Genético para calibrar parâmetros comportamentais do simulador escolhido, o Aimsun Next, de modo que reproduzam adequadamente o comportamento do tráfego em campo; importante ressaltar que outros dados de entrada do simulador devem ser obtidos diretamente em campo, como aqueles relacionados com a distribuição do tempo de viagem e os voltados ao desempenho veicular;

3.simulação com o Aimsun Next: por meio do simulador recalibrado, devem ser simulados trechos hipotéticos da mesma forma como realizado no desenvolvimento do método do HCM-7 para análise de rodovias de pista simples sem faixas adicionais (Washburn et al., 2018); neste trabalho, os experimentos devem conter faixas adicionais;

4.geração de modelos para estimar FD em segmentos com faixas adicionais: por meio dos resultados de ATS e PF obtidos das simulações realizadas no item anterior, foi determinado o FD correspondente e gerados os modelos de tráfego para estimar essa medida de serviço de acordo com algumas variáveis explicativas;

5.estimativa dos valores de FD dos trechos selecionados: para os trechos observados em campo, deve-se estimar os valores de FD, por meio dos modelos encontrados no item anterior, para cada corrente de tráfego de 15 minutos observado em campo; e

6.comparação dos métodos para obter FD: deve-se comparar os valores obtidos com as modelos propostos em relação aos valores obtidos em campo e calculados com o HCM-7 sem adaptações; o intuito é validar os modelos propostos no item anterior.


Figura 1. Fluxograma com as etapas da pesquisa.

Figura 2. Perfil altimétrico e localização das faixas adicionais (Trecho 1).

Figura 3. Perfil altimétrico e localização das faixas adicionais (Trecho 2).

Figura 4. Perfil altimétrico e localização das faixas adicionais (Trecho 3).

Coleta de dados de tráfego

A coleta de dados de tráfego foi realizada por Silva (2019), que avaliou segmentos com e sem faixas adicionais. No que diz respeito aos trechos com faixas adicionais, que são objetos de análise deste trabalho, foram escolhidos três locais, todos presentes na rodovia BR-040, que realiza a conexão entre as cidades de Brasília (DF) e Rio de Janeiro (RJ). Os veículos que trafegam nesses locais normalmente utilizam a via para realizar viagens a grandes distâncias, não tendo sido observados comportamentos de motoristas que viajavam, por exemplo, para fazer turismo, o que faria a velocidade não ser um fator importante a ser considerado pelos usuários. A escolha dos locais também foi motivada por haver presença de faixas adicionais e pelo fluxo de tráfego observado não ser tão baixo, o que é comum em rodovias de pista simples. Dessa forma, a seleção dos trechos foi realizada de modo que fossem observadas diferentes configurações geométricas e de tráfego para serem utilizadas na calibração do simulador Aimsun Next.

Na coleta de dados de tráfego, não foram observados acidentes e as correntes de tráfego (de 15 minutos) foram coletadas em regime de fluxo não congestionado. Foram reunidas informações como velocidade, fluxo e porcentagem de veículos pesados, além de dados relacionados ao desempenho dos veículos. Foram levantados, ainda, informações sobre os alinhamentos verticais e horizontais dos segmentos, que são relevantes na obtenção das medidas de desempenho de interesse.

Os trechos observados possuíam cerca de 10 quilômetros de extensão, correspondentes aos seguintes marcos quilométricos da BR-040: i) Trecho 1: quilômetro 29 ao 39; ii) Trecho 2: quilômetro 96 ao 105; e iii) Trecho 3: quilômetro 288 ao 298. A caracterização geométrica dos segmentos pode ser vista nas Figuras 2 a 4, em que podem ser observados os perfis altimétricos e a localização das faixas adicionais ao longo dos trechos. Importante verificar que há rampas com declividades baixas, menores que 2%, mas também algumas rampas com declividades acima de 7%, onde estão localizadas as faixas adicionais. Segmentos com diferentes rampas, não somente em termos de declividade, mas também em relação aos comprimentos desses segmentos, são importantes para a realização da calibração do simulador de tráfego Aimsun Next. Isso ocorre sobretudo porque diferentes configurações geométricas impactam no comportamento dos caminhões brasileiros, que não possuem um bom desempenho veicular, fazendo com que o comportamento dos motoristas tenda a ser mais agressivo. Mais informações sobre os dados de tráfego coletados podem ser encontradas em Silva (2019) e em Oliveira (2021).

Calibração dos parâmetros comportamentais do aimsun next

Os parâmetros de calibração presentes em submodelos de microssimuladores de tráfego podem influenciar significativamente nos resultados obtidos. Sendo assim, foi necessário calibrar o software escolhido para desenvolvimento desta pesquisa, o Aimsun Next. Dados de tráfego da rodovia BR-040 foram coletados em Silva (2019) para realização da calibração e validação do simulador utilizado, o Vissim. Neste trabalho, o método de calibração utilizado assemelha-se com o realizado em Oliveira (2021) para o Aimsun Next, que avaliou segmentos de rodovias de pista simples sem faixas adicionais.

De acordo com Figueiredo et al. (2014), no Aimsun Next há uma categorização dos parâmetros de calibração de acordo com três grandes grupos, independentemente das redes a serem modeladas. Esses parâmetros podem ser: parâmetros globais, locais ou do tipo de veículo. Os parâmetros globais afetam todos os veículos, de qualquer tipo, ao dirigir em qualquer local da rede. Por outro lado, os locais são relativos a uma seção específica da via. Por fim, os parâmetros do tipo de veículo afetam todos os veículos especificados. As descrições desses parâmetros – globais, locais e relacionados com os tipos de veículos – podem ser encontrados no manual do usuário do Aimsun Next (Aimsun, 2020).

Nessa perspectiva, para que os resultados sejam representativos da realidade observada em campo, foram inseridos tanto os parâmetros relacionados ao desempenho dos veículos pesados quanto os outros parâmetros comportamentais do simulador. Portanto, no que diz respeito aos veículos pesados, foram inseridas, como input do Aimsun Next, as informações apresentadas na Tabela 1, por categoria veicular.

Tabela 1. Dados relacionados com o desempenho veicular de cada categoria veicular, inseridos no Aimsun Next.

Categoria

Área Frontal (m²)

Massa (kg)

Relação massa potência (kg/cv)

Relação massa/área frontal (kg/m²)

Média

Desvio padrão

Média

Desvio padrão

Média

Desvio padrão

Leves

5,39

9113

3418

58

22

1691

634

Médios

6,56

18190

6100

68

23

2773

930

Pesados

7,20

33994

10466

101

27

5409

1454

Extrapesados

7,96

55966

17296

128

40

7031

2173

Além disso, foi preciso realizar o ajuste dos parâmetros comportamentais do Aimsun Next. Inicialmente foi realizada a definição de quais deles seriam relevantes para a medida de desempenho a ser a analisada que, no caso da presente pesquisa, foi o tempo médio de viagem. Os parâmetros de calibração do Aimsun Next – que podem estar relacionados com os submodelos comportamentais de car-following, gap-acceptance e lane-changing – são difíceis de serem obtidos no campo, principalmente, pela dificuldade de mensurar seus comportamentos isoladamente. Além disso, existem em grande quantidade e requerem uma variedade de informações para, de fato, serem compreendidos e estimados.

Na literatura, são encontrados inúmeros parâmetros que podem ser calibrados de acordo com cada necessidade. Por esse motivo, para a efetiva calibração do modelo de simulação, se faz necessário o uso de algoritmos, visando viabilizar a calibração por meio da automatização de parte do processo. Neste trabalho, foram calibrados os seguintes parâmetros do Aimsun Next, que foram selecionados, por meio de uma análise de sensibilidade desenvolvida em Oliveira (2021), como sendo os mais significativos:

MINCHEADMCAR: headway mínimo entre os veículos líder e seguidor; considerado no cálculo da velocidade e na desaceleração veicular num dado instante;

NDECMCAR: desaceleração normal média do veículo líder, para automóveis;

SNSTVTFCTRDCD: fator de sensibilidade que altera a percepção da distância de visibilidade e, consequentemente, a agressividade na execução de uma manobra de ultrapassagem;

SPDIFMAX: valor máximo da diferença de velocidade entre os veículos líder e seguidor que determina se uma ultrapassagem é desejada;

SPDIFMIN: valor mínimo para a diferença de velocidade entre os veículos líder e seguidor que determina se há desejo por uma ultrapassagem;

DLTRSHLD: limite máximo de atraso provocado por um veículo líder, que também afeta o desejo por ultrapassagens;

RNKTRSHLD: posição máxima na fila em que os veículos ainda possuem alguma chance de ultrapassagem.

Neste trabalho, foi aplicado um Algoritmo Genético (AG) para calibrar o Aimsun Next considerando-se, isoladamente, os três segmentos de pista simples com faixas adicionais com dados coletados em campo. O objetivo é encontrar um conjunto de parâmetros de calibração que melhor represente o comportamento médio observado em campo, a fim de se modelar outras condições hipotéticas, necessárias neste trabalho. Assim, após aplicação do AG, em condições similares às aplicações do algoritmo em Oliveira (2021) – ou seja, 30 gerações e uma população de 10 indivíduos – foi identificado que os trechos se comportavam de forma diferente entre si.

A aplicação do AG envolvia a geração de soluções que eram categorizadas de acordo com a agressividade do conjunto motorista/veículo. O espaço de busca em função da agressividade pode ser visto na Tabela 2, bem como os valores default dos parâmetros escolhidos para calibração. Os melhores conjuntos de parâmetros de calibração obtidos pelo AG estão ilustrados na Tabela 3. Diante dos resultados obtidos para os parâmetros calibrados, verificou-se certa diferença no intervalo de busca para os três segmentos analisados. Cada um deles apresentou um grau de agressividade diferente, que se justifica pelas características geométricas bem distintas entre os trechos, tanto em relação ao perfil vertical como em relação à presença de faixas adicionais (Figuras 2 a 4).

Tabela 2. Valores default e espaço de busca dos parâmetros de calibração do Aimsun Next.

Parâmetro

Valor default

Espaço de busca em função do nível de agressividade

Baixo

Médio

Alto

Mínimo

Máximo

Mínimo

Máximo

Mínimo

Máximo

NDECMCAR (m/s2)

4,0

2,0

3,0

3,0

4,0

4,0

5,0

MINCHEADMCAR (s)

1,0

0,9

1,2

0,6

0,9

0,3

0,6

DLTRSHLD (s)

60,0

210,0

300,0

120,0

210,0

30,0

120,0

SPDIFMAX (km/h)

35,0

46,7

60,0

33,3

46,7

20,0

33,3

RNKTRSHLD

2,0

1,0

3,0

3,0

5,0

5,0

7,0

SPDIFMIN (km/h)

10,0

15,0

20,0

10,0

15,0

5,0

10,0

SNSTVTFCTRDCD

0,65

1,33

2,0

0,67

1,33

0,0

0,67

Nesse sentido, com o intuito de estabelecer o comportamento do motorista típico brasileiro para a realização das simulações e, em seguida, realização de experimentos de simulação para estimação de FD em segmentos com faixa adicional, foram escolhidos os parâmetros relacionados a um grau de agressividade alta. Esse comportamento mais agressivo foi identificado em outros trabalhos desenvolvidos no Brasil, voltados para a simulação de tráfego de rodovias de pista simples no contexto local (Silva et al., 2021; Silva et al., 2022; Oliveira e Bessa Jr., 2022).

Sendo assim, os valores a serem inseridos no Aimsun Next para dar continuidade ao trabalho são os do trecho da BR-040 entre os quilômetros 96 e 105. Importante dizer que os resultados da calibração produziram valores do tempo de viagem mais próximos do campo do que quando utilizados os parâmetros comportamentais default do simulador.

Tabela 3. Parâmetros calibrados obtidos por meio do AG.

Parâmetro

Trecho (km)

29-39

96-105

288-298

NDECMCAR

3,73

4,12

2,74

MINCHEADMCAR

0,84

0,31

1,04

DLTRSHLD

161,51

64,13

260,72

SPDIFMAX

42,23

24,45

51,78

RNKTRSHLD

4,66

5,57

2,62

SPDIFMIN

12,64

7,20

16,03

SNSTVTFCTRDCD

0,92

0,28

1,70

Simulação de tráfego no aimsun next

O modelo proposto nesta pesquisa para estimar a FD em segmentos com faixas adicionais foi desenvolvido a partir de simulações de tráfego em cenários hipotéticos, que são os mesmos realizados para desenvolver o método da 7ª versão do Highway Capacity Manual (HCM-7) para análise de rodovias de pista simples (Washburn et al., 2018). Seguindo essa premissa, foram simulados diversos cenários variando-se a inclinação e o comprimento do trecho em análise, conforme também realizado em Oliveira (2021) e ilustrado na Figura 5. No modelo simulado, foram inseridos detectores na seção com a faixa adicional de modo que eles ficassem posicionados em locais específicos: no início, no centro e no final do segmento de análise (o trecho central ilustrado na Figura 5, que possui comprimento variável). Esses detectores têm a finalidade de permitir o registro das medidas de desempenho dos variados cenários simulados.


Figura 5. Croqui dos trechos simulados.

Foram simuladas correntes de tráfego conforme os valores apresentados na Tabela 4, variando-se o comprimento do segmento com faixa adicional, a velocidade de fluxo livre, o fluxo de tráfego direcional, a porcentagem de veículos pesados e o fluxo de tráfego no sentido oposto. Foi também considerado o alinhamento vertical, definidos de acordo com a classe do alinhamento vertical, com o relevo mais desfavorável ocorrendo na classe 5, que é a mesma abordagem utilizada no método do HCM-7.

Importante mencionar que os valores encontrados na Tabela 4 são os mesmos utilizados nos experimentos de simulação usados no desenvolvimento do HCM-7 (Washburn et al., 2018). Essa escolha foi realizada para que o método proposto neste trabalho sirva de contraponto ao manual americano, baseando-se em experimentos de simulação similares.

Tabela 4. Parâmetros utilizados nas simulações de tráfego.

Variável

Valores utilizados

Comprimento do segmento (km)

0,8 - 1,6 - 3,2 - 4,8

Velocidade de fluxo livre (km/h)

72 - 80 - 89 - 97 - 105 - 113

Fluxo direcional (veic/h)

100 - 300 - 600 - 900 - 1200 - 1500 - 1800

Porcentagem de veículos pesados (%)

0 - 5 - 10 - 15 -20 - 25

Fluxo no sentido oposto (veic/h)

0

Classe vertical

1 - 2 - 3 - 4 - 5

Geração de modelos para estimação de FD em segmentos de rodovias de pista simples com faixas adicionais

Segundo o HCM-7 (TRB, 2022), a obtenção do nível de serviço de uma rodovia de pista simples deve ser realizada por meio da densidade de veículos em pelotões (FD, em veic/km), que é calculada em função da porcentagem de veículos em pelotões (PF), do fluxo de tráfego unidirecional (q, em veic/h) e da velocidade média de viagem (ATS, em km/h), conforme apresentado na equação (1).

Os resultados obtidos dos diversos cenários de simulação incluíam o registro dos valores de PF e de ATS. De posse dessas informações, uma série de modelos multilineares foram desenvolvidos para estimar a ATS em segmentos com faixas adicionais. As variáveis explicativas que tiveram correlação com ATS foram o fluxo de tráfego no sentido da análise, a porcentagem de veículos pesados (PHV), o comprimento da faixa adicional (L) e a velocidade de fluxo livre (FFS). A forma geral do modelo é ilustrada pela equação (18):

(18)

Os coeficientes da equação (18) variam de acordo com a classificação vertical e podem ser encontrados na Tabela 5, de acordo com a classe vertical da rodovia. Como a classe vertical é baseada no comprimento e na declividade dos segmentos viários (como pode ser visto na Tabela 7), é possível afirmar que o perfil dos aclives e declives dos segmentos viários influenciam nos parâmetros de calibração da equação (18). Essa abordagem de obter parâmetros de ajuste dos modelos de tráfego em função da classe da rodovia também é utilizada no método do HCM-7 para análise de rodovias de pista simples. Por essa razão, a mesma abordagem foi escolhida para aplicação neste trabalho.

A mesma metodologia foi realizada para a estimação da medida de desempenho PF. Foi realizada uma análise de correlação entre os valores de PF obtidos por simulação e as mesmas variáveis explicativas apontadas na equação (18), que foram q, PHV, L e FFS. No entanto, foi observado que somente o fluxo direcional q possui correlação com PF, o que pode ser explicado em função da PF ser uma variável dispersa e que pode apresentar certo grau de incerteza (Al-Kaisy et al., 2018). Sendo assim, a equação proposta para estimar PF possui o formato ilustrado na equação (19). Da mesma maneira que a equação de ATS, os valores de a’ e b1’ da equação (19) variam conforme a classe do alinhamento vertical do segmento, que variam entre 1 e 5. Os coeficientes são apresentados na Tabela 6.

(19)

Tabela 5. Coeficientes por classe da rodovia para estimar ATS.

Classe vertical 

Coeficientes

a

b1

b2

b3

b4

1

25,1112

-0,0146

-0,2815

0,7864

1,1554

2

56,0679

-0,0268

-0,6587

0,5069

2,0500

3

36,7571

-0,0176

-0,4698

0,6728

1,2198

4

38,8940

-0,0182

-0,5391

1,1127

0,6546

5

53,2654

-0,0219

-0,8400

-0,1130

0,5555

Tabela 6. Coeficientes por classe da rodovia para estimar PF.

 Classe vertical

a'

b1'

1

9,9628

0,0400

2

12,1911

0,0371

3

10,6306

0,0391

4

10,7628

0,0390

5

11,2356

0,0383

Obtenção de FD dos trechos observados

Nesta etapa do método proposto, o objetivo foi estimar a FD das correntes de tráfego dos três trechos com dados coletados em campo. O intuito foi validar os modelos desenvolvidos na etapa anterior, ao se comparar os valores de FD obtidos dessas relações propostas com aqueles valores encontrados em campo e por meio do HCM-7 sem calibração.

Os trechos foram segmentados de acordo com a presença de faixa adicional e quanto à inclinação e o comprimento dos subsegmentos, determinando, para cada um deles, a classe da rodovia (de 1 a 5), conforme Tabela 7 (Oliveira, 2021). Essa tabela possui exatamente o mesmo formato da tabela proposta no método do HCM-7 para análise de rodovias de pista simples. Os valores das classes presentes na Tabela 7 foram obtidos por Oliveira (2021), que traz uma adaptação do método voltado para segmentos sem faixas adicionais considerando-se as condições observadas no Brasil.

Tabela 7. Adaptação da classificação do alinhamento vertical do HCM-7, realizado em Oliveira (2021) (descidas em parênteses).

Distância (km)

Rampa (%)

≤ 1

> 1 ≤ 2

> 2 ≤ 3

> 3 ≤ 4

> 4 ≤ 5

> 5 ≤ 6

> 6 ≤ 7

> 7 ≤ 8

> 8 ≤ 9

> 9

≤ 0,16

1 (1)

1 (2)

2 (3)

2 (4)

2 (4)

2 (4)

2 (5)

2 (5)

2 (5)

2 (5)

> 0,16 ≤ 0,32

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

4 (5)

4 (5)

4 (5)

4 (5)

> 0,32 ≤ 0,48

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 0,48 ≤ 0,64

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 0,64 ≤ 0,80

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 0,80 ≤ 0,96

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 0,96 ≤ 1,12

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 1,12 ≤ 1,28

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 1,28 ≤ 1,44

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 1,44 ≤ 1,60

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 1,60 ≤ 1,76

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

> 1,76

1 (1)

1 (3)

2 (4)

3 (5)

4 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

5 (5)

Importante ainda mencionar que a classe 1 representa um segmento que impacta menos o tráfego dos veículos (sobretudo os caminhões), assim como a classe 5 impacta mais a fluidez dos veículos. As classes são obtidas em função do tamanho (em km) e da declividade (em percentual) dos segmentos. Os valores apresentados em parênteses são relacionados com as descidas, enquanto os que estão fora dos parênteses são relacionados com os aclives.

Comparação dos métodos de estimação da FD

Para avaliar os resultados de FD encontrados com os modelos propostos, foi realizada uma comparação dos valores obtidos com os modelos propostos, obtidos em campo e calculados com o HCM-7 sem adaptações (Figuras 6 a 10). Dessas figuras, é possível notar que, para todos os trechos, o modelo proposto a partir dos resultados da simulação de tráfego se aproximou do que foi observado no campo. Quando comparado aos resultados do método proposto no HCM-7 sem adaptações, os resultados de FD divergem do que é observado em campo, sobretudo para o trecho 2, que vai do km 96 ao km 105 da BR-040.

Os dados de FD presentes nas Figuras 6 a 10 foram avaliados por meio da aplicação do teste t-student para amostras pareadas (Tabela 8). Para os três trechos, no caso da análise entre os dados de campo e estimados pelo HCM-7 sem adaptações, a hipótese nula (H0), de que a diferença média entre os pares é igual a zero, foi rejeitada. Isso significa que há indícios de que os dados provêm de populações distintas, ou seja, os dados de campo não estão próximos dos dados estimados pelo HCM-7 sem adaptações. Por outro lado, a hipótese nula não foi rejeitada quando os dados de FD de campo foram comparados com os valores encontrados pelo modelo proposto neste trabalho; a exceção ficou por conta do trecho 2, cujas diferenças, de fato, podem ser vistas na Figura 7, embora, visualmente, não pareçam tão grandes.

Tabela 8. Resumo da análise estatística.

Conjuntos de dados testados

Teste t-student para amostras pareadas

sd

N

t crítico

t-stat

Rejeita H0?

Campo x modelo proposto (trecho 1)

0,15

0,28

10

2,262

1,65

NÃO

Campo x HCM-7 sem adaptação (trecho 1)

-1,40

1,27

10

2,262

-3,49

SIM

Campo x modelo proposto (trecho 2)

1,55

0,70

22

2,080

10,37

SIM

Campo x HCM-7 sem adaptação (trecho 2)

-4,34

2,73

22

2,080

-7,47

SIM

Campo x modelo proposto (trecho 3)

-0,08

0,15

14

2,160

-2,14

NÃO

Campo x HCM-7 sem adaptação (trecho 3)

-0,39

0,31

14

2,160

-4,67

SIM

Considerações finais

Nesta pesquisa, foram desenvolvidos modelos de tráfego para estimar a velocidade média de viagem (ATS) e a porcentagem de veículos em pelotões (PF), que compõem a formulação da densidade de veículos em pelotões (FD) em trechos de rodovias de pista simples com faixas adicionais. Vale ressaltar que a FD é atualmente utilizada pela 7ª versão do HCM (TRB, 2022) para estimar o nível de serviço em rodovias de pista simples.

O método proposto nesta pesquisa para obtenção dos modelos propostos foi composto pelas etapas de: i) coleta de dados de tráfego; ii) calibração do simulador Aimsun Next; iii) execução de experimentos de simulação; iv) desenvolvimento dos modelos de tráfego a partir dos resultados da simulação; v) estimativa dos valores de FD com os modelos propostos para as condições observadas em campo; e vi) comparação dos valores de FD provenientes dos modelos propostos e dos valores obtidos em campo.

Importante mencionar que os trechos observados possuem características geométricas distintas entre si, com o trecho 3 (Figura 4) possuindo as rampas mais íngremes. A etapa de calibração do simulador de tráfego foi uma parte importante do trabalho, haja vista que os esforços para obter uma boa modelagem dos trechos reais e hipotéticos passam não somente pela aplicação do Algoritmo Genético desenvolvido, mas também pela estimativa das velocidades desejadas e pela calibração dos caminhões típicos brasileiros (Tabela 1).

Os experimentos de simulação foram realizados com o Aimsun Next mantendo-se a estratégia realizada no desenvolvimento do método proposto pelo HCM-7 (Washburn et al., 2018) e pela adaptação de parte do método realizado para o Brasil para segmentos sem faixas adicionais (Oliveira e Bessa Jr., 2022).

Importante mencionar que o modelo proposto neste artigo é de aplicação mais simples do que é visto no HCM-7, o que pode implicar numa maior difusão do método para diferentes tipos de usuários dos modelos. Além dos modelos propostos neste trabalho serem mais simples do que os que são vistos no manual americano, foi possível perceber, também, que o método desenvolvido nesta pesquisa produziu valores de FD mais próximos dos observados em campo do que com a utilização do método HCM-7 sem adaptações. Essa conclusão reforça a necessidade de uma adaptação do método do HCM-7, ou a produção de outros modelos locais, em acordo com as condições observadas em rodovias de pista simples brasileiras.

Como sugestões para trabalhos futuros, recomenda-se:

Aumentar do conjunto de dados de tráfego, ampliando o número de trechos de rodovias de pista simples brasileiras; importante ter comprimentos de faixas adicionais com tamanhos maiores do que alguns observados neste trabalho, especialmente em relação às observadas na BR-040 entre os km’s 96 e 105;

Reavaliar a calibração do Aimsun Next, tendo em vista a possibilidade de aumento do conjunto de dados; e

Adaptar o método do HCM-7 para análise de rodovias de pista simples brasileiras com faixas adicionais, uma vez que o manual americano possui um forte apelo nacional e mundial, sendo necessário, muitas vezes, apenas o ajuste das tabelas e das formulações básicas apresentadas no método original.

Agradecimentos

Os autores agradecem à FAPEMIG (processo TEC-APQ-03818-18) e ao CNPq (processos 315001/2021-6 e 439250/2018-8) pelo apoio financeiro. Agradecem, ainda, à CAPES, pelo suporte à pesquisa.

#Referências bibliográficas

»AIMSUN (2020). Aimsun Next 20: Dynamic Simulators User’s Manual. Barcelona, Espanha.

»Al-Kaisy, A.; Freedman, Z. (2011). Empirical examination of passing lane operational benefits on rural two-lane highways. 6th International Symposium on Highway Capacity and Quality of Service. Procedia Social and Behavioral Sciences, 16, 340-351.

»Al-Kaisy, A.; Jafari, A.; Washburn, S. S. (2017). Measuring performance on two-lane highways – Empirical investigation. Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, 2615(1), 62-72.

»Al-Kaisy, A. et al. (2018). Traffic operations on rural two-lane highways: a review on performance measures and indicators. Transportation Record Record: Journal of the Transportation Research Board, 2672, 66-74.

»Amaral, F. et al. (2021). Avaliação do efeito de faixas adicionais de subida em segmentos de rodovias de pista simples. Transportes, 29(2), 2359-2359.

»Bessa Jr., J. E. (2015). Medidas de desempenho para avaliação da qualidade de serviço em rodovias de pista simples no Brasil. Tese (Doutorado), Universidade do Estado de São Paulo, São Carlos.

»Bessa Jr., J .E.; Setti, J. R. (2011). Derivation of ATS and PTSF functions for two-lane, rural highways in Brazil. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 16, 282-292.

»Bessa, J. E., Jr.; Setti, J. R.; Washburn, S. S. (2017). Evaluation of models to estimate percent time spent following on two-lane highways. Journal of Transportation Engineering Part A: Systems, 143(5), 1-9.

»Bessa Jr., J. E.; Setti, J. R. (2018). Evaluating measures of effectiveness for quality of service estimation on two-lane rural highways. Journal of Transportation Engineering, Part A: Systems, 144(9), 04018056.

»Choocharukul, K; Sinha, K. C.; Mannering, F. L. (2004). User perceptions and engineering definitions of highway level of service: an exploratory statistical comparison. Transportation Research Part A, 38, 677-689.

»CNT (2022). O Transporte move o Brasil: Propostas da CNT ao País. Confederação Nacional dos Transportes. Brasília, DF. Disponível em: https://cnt.org.br/propostas-cnt-transporte. Acesso em: 14 de julho de 2023.

»Demarchi, S. H.; Setti, J. R. (2000). Análise de Capacidade e Nível de Serviço de Segmentos Básicos de Rodovias utilizando o HCM 2000. Universidade Estadual de Maringá e Universidade de São Paulo.

»Figueiredo, M.; Seco, A.; Silva, A. B. (2014). Calibration of Microsimulation Models – The Effect of Calibration Parameters Errors in the Models Performance. Transportation Research Procedia, [S.L.], 3, 962-971.

»Harwood, D. W.; Gilmore, D. K.; Richard, K. R.; Dunn, J. M.; Sun, C. (2008). Passing Sight Distance Criteria. NCHRP Report 605.

»Harwood, D. W.; Gilmore, D. K. e Richard, K. R. (2010). Criteria for passing sight distance for roadway design and marking. Transportation Research Record, 2195, 36-46.

»Jain, M.; Gore, N.; Arkatkar, S.; Easa, S. (2021). Developing Level-of-Service Criteria for Two-Lane Rural Roads with Grades under Mixed Traffic Conditions. Journal of Transportation Engineering, Part A: Systems, 147, 04021013:1-04021013:13.

»Maldonado, M. O.; Herz, M. Galarraga, J. (2012). Modelación de operación en carreteras argentinas y recomendaciones de ajustes al Manual de Capacidad HCM 2010. Transportes, 20(3), 51-61. https://doi.org/10.4237/transportes.v20i3.556

»Melo, R. A.; Setti, J. R. A. (2003). Faixas adicionais para aclives de rodovias de pista simples brasileiras: uma adaptação dos critérios da AASHTO. Transportes, 11(2), 41-48.

»Moreno, A. T., Llorca, C.; Lenorzer, A.; Casas, J.; Garcia, A. (2015). Design criteria for minimum passing zone lengths: operational efficiency and safety considerations. Transportation Research Record, 2486, 19-27.

»Moreno, A. T.; Llorca, C.; Washburn, S. S.; Bessa Jr., J. E.; García, A. (2018). Operational Considerations of Passing Zones for Two-lane Highways: Spanish Case Study. Promet-Traffic & Transportation, 30(5), 601-612.

»Moreno, A. T. (2020). Estimating traffic performance on Spanish two-lane highways. Case study validation. Case Studies on Transport Policy, 8(1), 119-126.

»Oliveira, J. K. S. (2021). Adaptação do HCM-6 para análise de rodovias de pista simples sem faixas adicionais no Brasil. 100f. Dissertação (Mestrado em Geotecnia e Transportes), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.

»Oliveira, J. K. S; Bessa Jr., J. E. (2022). Adaptation of the HCM for the analysis of two-lane rural highways without passing lanes in Brazil. Transportes, 30, 1-15.

»Penmetsa, P.; Ghosh, I.; Chandra, S. (2015). Evaluation of performance measures for two-lane intercity highways under mixed traffic conditions. Journal of Transportation Engineering, 141(10), 1-7.

»Silva, F. (2019). Determinação do impacto de zonas de ultrapassagens proibidas e de faixas adicionais de subida em segmentos de rodovias de pista simples. 185f. Dissertação (Mestrado em Transportes), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.

»Silva, F. A. E.; Bessa Jr., J. E.; Costa, A. L.; Cunha, A. L. B. N.; Andalício, A. F.; Velho, D. M. C.; Nazareth, V. S. (2021). Avaliação do efeito de faixas adicionais de subida em segmentos de rodovias de pista simples. Transportes, 29, 1-16.

»Silva, F. A.; Bessa Jr., J. E.; Costa, A. L.; Cunha, A. L.; Velho, D. M. C. (2022). Analysis of no-passing zones to assess the level of service on two-lane rural highways in Brazil. Case Studies on Transport Policy, 10, 248-256.

»TRB (2000). Highway Capacity Manual 2000. Transportation Research Board. Washington D.C.

»TRB (2010). Highway Capacity Manual 2010. Transportation Research Board. Washington D.C.

»TRB (2016). Highway Capacity Manual, 6th Edition: A Guide for multimodal mobility analysis (HCM). Transportation Research Board. Washington D.C.

»TRB (2022). Highway Capacity Manual, 7th Edition: A Guide for Multimodal Mobility Analysis. Transportation Research Board. Washington D.C.

»Van As, S. C., y A. Niekerk (2004). The operational analysis of two-lane rural highways. Proceedings of 23rd Southern African Transport Conference. Pretoria, South Africa.

»Washburn, S. et al. (2018). Improved Analysis of Two-Lane Highway Capacity and Operational Performance. Final Report for NCHRP Project 17-65 National Cooperative Highway Research Program, TRB, Washington, Web-Only Document 255.

Ana Carolina Felício Bicalho / anacarlfbicalho@gmail.com

Engenharia Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais. Atua na área de Engenharia de Tráfego e na área de Infraestrutura Rodoviária.

Thais Berger Barbosa da Silva / thais.berger@hotmail.com

Mestranda em Geotecnia e Transportes pela Universidade Federal de Minas Gerais, com graduação em Engenharia Civil pela mesma instituição. Atua na área de Engenharia de Tráfego.

Juliângelo Kayo Sangi de Oliveira / juliangelosoliveira@gmail.com

Mestre em Geotecnia e Transportes pela Universidade Federal de Minas, com graduação em Engenharia Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, com graduação sanduíche pelo programa Ciência sem Fronteiras em Rose-Hulman Institute of Tecnology – EUA.

José Elievam Bessa Júnior / elievamjr@gmail.com

Graduado em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Ceará (2006). Mestre (2009) e Doutor (2015) em Engenharia de Transportes pela Escola de Engenharia de São Carlos. É Professor do Magistério Superior na Universidade Federal de Minas Gerais, lotado no Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia. Atua, principalmente, nos seguintes temas: Simulação de Tráfego, Capacidade viária e nível de serviço, Controle de tráfego urbano, Operação de transportes e Planejamento dos transportes.