A escalada da violência doméstica contra mulher durante a pandemia da covid-19 no discurso da ONU Mulheres

Cintia de Freitas Rodrigues Loureiro

Universidade de Brasília, Brasil
cintiafrodrigues@gmail.com

Viviane Resende

Universidade de Brasília, Brasil
resende.v.melo@gmail.com

Trabajo recibido el 26 de agosto de 2021 y aprobado el 20 de octubre de 2021.

Resumo

Este artigo analisa o comprometimento na ação discursiva da ONU Mulheres Brasil (@onumulheresbr) em textos de posts do Instagram sobre a escalada da violência doméstica contra mulheres durante a pandemia da covid-19. A categoria analítica de modalidade, conforme propõe Fairclough (2003) baseado em Halliday (2014), assim como conceitos e categorias dos estudos decoloniais (Ballestrin 2013, 2017; Lugones 2014) e dos estudos de gênero (Akotirene 2019; Carneiro 2011; Crenshaw 1990) foram utilizados na análise discursiva dos dados. A investigação aponta que o organismo internacional empregou esforço discursivo para mostrar comprometimento tanto com as informações e posicionamentos que comunicou quanto com a noção de obrigação e necessidade sobre os aspectos discutidos sobre violência doméstica nos posts analisados. No entanto, a opção por tratar problemas, ações e atores sociais de forma genérica atenua os efeitos apelativos das modalidades.

Palavras-chave: violência doméstica contra mulheres, pandemia, ONU Mulheres, análise de discurso crítica.

The escalation of domestic violence against women during the covid-19 pandemic in the UN Women’s discourse

Abstract

This article analyzes the commitment to discursive action in the UN Women Brazil’s Instagram posts (@onumulheresbr) on the escalation of domestic violence against women during the covid-19 pandemic. The analytical category Modality, as proposed by Fairclough (2003) based on Halliday (2014), as well as concepts and categories from decolonial studies (Ballestrin 2013, 2017; Lugones 2014) and from gender studies (Akotirene 2019; Carneiro 2011; Crenshaw 1990) were used in the discourse analysis. The investigation points out that the international organization used a discursive effort to show commitment both to the information and positions it communicated and to the notion of obligation and necessity on the aspects discussed about domestic violence in the analyzed posts. However, the option to deal with social problems, actions and actors in a generic way mitigates the appealing effects of the modalities.

Keywords: domestic violence against women, pandemic, UN Women, critical discourse analysis.

La escalada de la violencia doméstica contra las mujeres durante la pandemia del covid-19 en el discurso de ONU Mujeres

Resumen

Este artículo analiza el compromiso en la acción discursiva de ONU Mujeres Brasil (@onumulheresbr) en textos de publicaciones de Instagram sobre la escalada de violencia doméstica contra las mujeres durante la pandemia del covid-19. La categoría analítica de modalidad, propuesta por Fairclough (2003) con base en Halliday (2014), así como conceptos y categorías de estudios decoloniales (Ballestrin 2013, 2017; Lugones 2014) y estudios de género (Akotirene 2019; Carneiro 2011; Crenshaw 1990) se utilizaron en el análisis discursivo de los datos. La investigación señala que el organismo internacional utilizó un esfuerzo discursivo para mostrar compromiso tanto con la información y posiciones que comunicaba como con la noción de obligación y necesidad sobre los aspectos discutidos sobre violencia intrafamiliar en las publicaciones analizadas. Sin embargo, la opción de tratar problemas, acciones y actores sociales de manera genérica mitiga los efectos atractivos de las modalidades.

Palabras clave: violencia doméstica contra la mujer, pandemia, ONU Mujeres, análisis crítico del discurso.

1. Introdução

No primeiro semestre de 2020, o Brasil e todo o mundo começaram a registrar os efeitos secundários da pandemia da Covid-19. Além das centenas de milhares de vidas perdidas, há a depressão econômica e uma realidade silenciosa e também mortífera: o aumento de casos de feminicídios e de violência doméstica contra mulheres.1 Isoladas em casa e com convívio intenso com os parceiros, as agressões contra brasileiras alcançaram níveis alarmantes. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) divulgou que, em abril de 2020, quando o isolamento social imposto pela pandemia já passava de 30 dias, a quantidade de denúncias de violência contra mulheres recebidas pela Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência - Ligue 180 saltou quase 40% em relação ao mesmo período de 2019.

Neste contexto, a violência doméstica pautou um volume considerável de debates nas redes sociais. De acordo com nota técnica2 do Fórum Nacional de Segurança Pública, houve aumento de 431% nos relatos de brigas entre vizinhos no Twitter entre fevereiro e abril de 2020. Uma filtragem com foco apenas nas mensagens que indicavam a ocorrência de violência doméstica resultou 5.583 menções.

Além de usuários e usuárias de redes sociais, contas institucionais ligadas ao poder público, empresas privadas, organismos internacionais e organizações da sociedade civil também focaram esforços comunicacionais sobre o aumento de casos de violência doméstica contra mulheres. Diante deste cenário, investigamos a ação discursiva na rede social Instagram, da ONU Mulheres, entidade ligada à Organização das Nações Unidas e que tem atuação no Brasil, diante do crescimento da violência doméstica durante a pandemia da Covid-19. Neste artigo analisamos especificamente a modalidade nos textos dos posts do órgão, com o intuito de observar o comprometimento da instituição em seu posicionamento e ação discursiva. Como decisão metodológica para a composição de corpus, limitamos o recorte temporal a cinco meses, de março a julho de 2020, para a coleta de dados dos posts do perfil.

Neste artigo, tomamos o arcabouço teórico-metodológico dos estudos críticos do discurso (ECD), com o suporte teórico também dos estudos decoloniais e dos estudos de gênero, como parte de investigação em andamento baseada na análise situada de textos. A pesquisa é relevante também por seu enquadramento na crise social de disseminação mundial de uma nova doença e de esforços contínuos de governos de todo o mundo para controlar e amortizar os efeitos de curto, médio e longo prazos da Covid-19.

A emergência mundial de saúde também lançou luz sobre a profundidade e a gravidade de problemas sociais vivenciados por mulheres de todas as nacionalidades. De acordo com a ONU Mulheres3, na saúde elas estão na linha de frente no atendimento médico e social, representando 70% da força de trabalho nestes setores em todo o mundo. Com isso, estão também mais expostas ao novo vírus. As mulheres também são maioria no mercado informal e no trabalho doméstico, ocupações de alta vulnerabilidade. No ambiente familiar, a maior quantidade dos serviços domésticos é realizada por mulheres, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística4. Exaustas e confinadas dentro de casa por conta do isolamento social imposto pela pandemia, elas ainda estão mais suscetíveis à violência doméstica.

Com este artigo, queremos contribuir para compreensão do papel de um organismo internacional com atuação no Brasil a respeito do embate ideológico em torno de gênero e de caminhos para uma comunicação contra hegemônica, cidadã, humanizada e empática. Para isso, além desta introdução e das considerações finais, organizamos o artigo em três seções: na primeira assumimos perspectivas sobre poder, gênero e interseccionalidade; em seguida, apresentamos nossa abordagem em estudos críticos do discurso neste artigo e definimos o escopo analítico; por fim, na terceira seção, apresentamos nossas análises.

2. Poder, gênero e interseccionalidade

Sabemos que somente uma perspectiva discursiva não é suficiente para discutir o problema da violência doméstica contra mulheres no Brasil, assim como o nível de desigualdades ao qual as mulheres brasileiras estão submetidas. Por isso, buscamos também o suporte de conceitos e categorias dos estudos decoloniais e dos estudos de gênero para compreender o atravessamento dos componentes classe, gênero e raça na prática e nos eventos discursivos investigados. Também foram necessários levantamento sobre o contexto da criação da ONU e reflexão sobre o papel deste ator global para analisar o discurso institucional da ONU Mulheres no Instagram, seu posicionamento e comprometimento com as questões levantadas.

A criação da nova organização internacional ocorreu após o fim da Segunda Guerra Mundial, com países enfrentando graves dificuldades em busca de se reconstruírem economicamente. Com apoio de 50 nações, a missão da ONU à época era unir os países e afastar a possibilidade de uma outra guerra mundial. Com o passar das décadas e parcerias com fundos, agências e organizações, o Sistema ONU ampliou sua atuação, hoje com foco assumido de construir um mundo mais sustentável e frear a mudança climática, entre outras metas estruturantes.

Com presença no Brasil desde 1947, a ONU apoia o governo brasileiro com “projetos de cooperação internacional, no desenvolvimento de capacidades humanas e institucionais para enfrentar os desafios da superação das assimetrias sociais e econômicas, o exercício pleno da cidadania e dos direitos humanos”, entre outras iniciativas, que têm como guia os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável5 estabelecidos pela instituição. Entre os objetivos está a Igualdade de Gênero6, especificamente “Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”. Em 2010 foi criada a ONU Mulheres, que enuncia esforços para promoção da liderança e participação política das mulheres; empoderamento econômico; fim da violência contra mulheres e meninas; paz e segurança e emergências humanitárias; governança e planejamento, e normas globais e regionais.

No âmbito dos estudos decoloniais, Ballestrin (2017) propõe um resgate histórico sobre como a hegemonia dos EUA, tanto econômica quanto militar, foi projetada mundialmente. Para Ballestrin, a construção da ONU (1945) e a queda do muro de Berlim (1989) simbolizam essa projeção internacional. Com isso, o colonialismo europeu teria dado lugar ao imperialismo estadunidense, o que causou uma ruptura no continente americano. Com a ausência de colônias formalmente constituídas, “o imperialismo passou a se movimentar de uma maneira mais informal e nebulosa” (Ballestrin 2017, 516), agora por força do capitalismo e seus tentáculos econômicos. A autora também aponta que “à movimentação de estados individuais ou agrupados soma-se uma miríade muito heterogênea de atores que conectam o local e o global, transnacionalmente” (p. 526), inaugurando a agenda política da governança global:

a imperialidade subjacente à governança global oferece um imenso universo de possibilidades que atravessa as grandes agendas internacionais e sua instrumentalização para fins imperiais –democracia, direitos humanos, segurança, desenvolvimento, meio ambiente, cooperação, ajuda humanitária, combate ao terrorismo. Ou seja, muito mais que ações imperiais evidentes, frequentemente lembradas pela sua semelhança com o velho imperialismo, especialmente a partir do 11 de setembro de 2001 –invasão, intervenção, transferências de armamentos, criação de zonas de conflito, exércitos mercenários, bases militares (Iraque, Afeganistão, entre outros)–, a imperialidade pode ser manifestada em agendas pacíficas e colaborativas. Nos casos acima, nota-se, a impunidade mediante as violações do direito internacional, dos direitos humanos e das decisões da ONU é o que permite o pensamento de países com configuração de Império e dos limites desse próprio sistema de proteção (Ballestrin 2017, 528).

Esta reflexão ajuda a pensar sobre o papel estratégico de organismos internacionais, a exemplo da ONU, na dinâmica da geopolítica global.

Ainda no campo dos estudos decoloniais, o Grupo Modernidade/Colonialidade (M/C), formado por intelectuais latino-americanos situados em diversas universidades das Américas, foi um dos primeiros a inserir a América Latina no debate pós-colonial, no final dos anos 1990. Como herança deste movimento, temos os conceitos centrais de colonialidade do poder, colonialidade do saber e colonialidade do ser, e noção de “giro decolonial”. Desenvolvido primeiramente pelo sociólogo peruano Aníbal Quijano, o termo “colonialidade do poder” busca explicar como as relações entre colônias e metrópoles não foram extintas com o fim das administrações por meio do colonialismo.

Numa expansão do termo, o controle do gênero e da sexualidade é apontado como fazendo parte destes entrelaçamentos estruturais de poder. Assim, as classificações de raça, gênero e trabalho são basilares no processo de constituição do capitalismo mundial colonial/moderno (Ballestrin 2013). Isso significa que nossas experiências são generificadas, racializadas e situadas também nas relações de classe e de trabalho. Para Ballestrin (2013), apesar de a colonialidade aludir diversas formas de opressão:

nem todas as situações de opressão são consequências do colonialismo –veja-se a história do patriarcado e da escravidão–, ainda que possam ser reforçadas ou ser indiretamente reproduzidas por ele. Em suma, ainda que não haja colonialismo sem exploração ou opressão, o inverso nem sempre é verdadeiro (Ballestrin 2014, 90).

Para a autora, estruturas de poder basilares como patriarcado e escravidão não foram inauguradas com o processo de colonização, mas existiam antes dele. Porém, ainda que diversas formas de escravidão existissem ao longo da História, foi na modernidade europeia que se deu a invenção sem precedentes de “um sistema mercantil em que seres humanos viravam mercadoria e seu comércio resultava em vultosos lucros” (Schwarcz e Starling 2015, 65). Também as opressões baseadas em gênero, ainda que desgraçadamente presentes em muitos contextos espaço-temporais, encontrou na colonial-modernidade novas formas de expressão, em “exercícios de poder concretos, intrincadamente relacionados, alguns corpo a corpo, alguns legalistas, alguns dentro de uma sala onde as mulheres indígenas fêmeas-bestiais-não-civilizadas são obrigadas a tecer dia e noite, outros no confessionário” (Lugones 2014, 948).

Como lembram Feijó e Resende (2020), um marco de início da reflexão centrada no gênero nos estudos decoloniais é o texto de Ochy Curiel publicado em 2007. Curiel (2007, 93) sustenta crítica aos estudos decoloniais, afirmando (sobre Mignolo, Quijano, Dussel) que “[e]mbora coloquem a raça como critério para a classificação de populações que determinam posições na divisão sexual do trabalho, apenas mencionam de passagem seu relacionamento com sexo e sexualidade, além de não se referirem às contribuições de muitas feministas na criação desse pensamento”. No mesmo ano, María Lugones (2007) entrou em produtivo diálogo com as noções de colonialidade do poder, de Quijano, de diferença colonial, de Mignolo, e de colonialidade do ser, de Maldonado Torres, fundamentando seu próprio conceito de colonialidade de gênero, depois ampliado na proposição de um feminismo decolonial (Lugones 2014).

Lugones (2014) problematiza a inclusão do controle do gênero no conceito de colonialidade do poder e defende o uso do termo “colonialidade do gênero”. Para a autora, o gênero foi introduzido pelo elemento colonial. De acordo com esse quadro pensado por Lugones, os homens europeus brancos burgueses eram civilizados; portanto, plenamente humanos. Já os colonizados eram não-humanos e, por isso, não tinham gênero, sendo identificados como machos e fêmeas: “Machos tornaram-se não-humanos-por-não-homens, e fêmeas colonizadas tornaram-se não-humanas- por-não-mulheres” (Lugones 2014, 937). Lugones defende que, ao contrário da colonização, a colonialidade do gênero está conosco e pode ser percebida quando pensamos na “intersecção de gênero/classe/raça como construtos centrais do sistema de poder capitalista mundial” (p. 939).

Este conceito de interseccionalidade ao qual Lugones faz referência, marco do ativismo negro, é uma lente analítica sobre a interação estrutural e suas consequências. “Nos mostra como e quando mulheres negras são discriminadas e estão mais vezes posicionadas em avenidas identitárias, que farão delas vulneráveis à colisão das estruturas e fluxos modernos” (Akotirene 2019, 63).

O conceito de interseccionalidade foi sistematizado, inicialmente, por Kimberlé Crenshaw (nos artigos “Demarginalizing the intersection of race and sex: a black feminist critique of antidiscrimination doctrine, feminist theory and antiracist politics”, de 1989, “Mapping the margins: intersectionality, identity politics, and violence against women of color”, de 1990-91). A incidência cruzada do racismo e do patriarcado nas práticas de violência contra mulheres negras está na proposição analítica de interseccionalidade estrutural apresentada por Crenshaw, em que a autora defende que políticas públicas para mulheres em situação de violência doméstica levadas para abrigos, por exemplo, precisam considerar raça, gênero e classe.

Na maioria dos casos, a agressão física que leva as mulheres a esses abrigos é apenas a manifestação mais imediata da subordinação que elas experimentam. Muitas mulheres que procuram proteção estão desempregadas ou subempregadas e um bom número delas são pobres. Os abrigos que servem a essas mulheres não podem se dar ao luxo de lidar apenas com a violência infligida pelo agressor; eles também devem confrontar as outras formas de dominação multicamadas e rotineiras que muitas vezes convergem para a vida dessas mulheres, dificultando sua capacidade de criar alternativas às relações abusivas que as levaram a abrigos em primeiro lugar (Crenshaw 1991, 1245, tradução nossa).

Para Crenshaw, esse fardo carregado por mulheres pobres, negras e em situação de violência interage com vulnerabilidades preexistentes para criar mais uma dimensão de destituição de poder.

Já na categoria de interseccionalidade política, a autora discute a politização da violência doméstica, em que o cruzamento de elementos de raça e cultura, mas também concepções de vida pública, vida privada e ética comunitária, podem contribuir para a supressão da violência doméstica. Haveria uma hesitação de mulheres não-brancas em chamar a polícia, devido a uma falta de confiança para submeter sua vida privada ao escrutínio e controle de uma força policial que é frequentemente hostil, o que também é fato no contexto brasileiro.

Ao falar sobre o racismo estrutural no âmbito do poder público, Akotirene (2019) defende que as queixas das mulheres negras sofrem estigmatização por morarem em espaços considerados perigosos, vendidos pela mídia tradicional como pontos onde há criminalidade. “A polícia que mata os homens no espaço público é a mesma que deixa as mulheres morrerem dentro de suas casas – o desprestígio das lágrimas de mulheres negras invalida o pedido de socorro político, epistemológico e policial” (Akotirene 2019, 69).

Outra questão levantada pela autora é sobre mulheres, muitas vezes, buscarem o fim do ciclo da violência doméstica, mas sem necessariamente desejar a prisão de seus companheiros, “levando em conta a marca colonial conter a privação de liberdade”. Isso mostra, segundo Akotirene, traços de elitismo e racismo na própria Lei Maria da Penha (Lei N.°11.340, de 7 de agosto de 2006).

Para Carneiro (2011, 15), a ausência de políticas públicas direcionadas às pessoas negras libertadas após séculos de escravidão fez perdurar uma questão essencial acerca dos direitos humanos no Brasil: “a prevalência da concepção de que certos humanos são mais ou menos humanos do que outros, o que, consequentemente, leva à naturalização da desigualdade de direitos”. A autora defende que tanto o mito da democracia racial (ao pregar a miscigenação) quanto a perspectiva de lutas de classes (ao privilegiar a perspectiva analítica das lutas de classes para a compreensão das desigualdades sociais) têm em comum “a invisibilidade da intersecção de raça para as questões dos direitos humanos, da justiça social e da consolidação democrática, elementos que dificultam a erradicação das desigualdades raciais no Brasil” (Carneiro 2011, 19).

As autoras que convocamos nesta seção nos apontam a complexidade da chave analítica de gênero, que ganha potência nos entrecruzamentos decoloniais e interseccionais. Na próxima seção, buscaremos explorar como esta categoria pode ser produtivamente acionada nos estudos críticos do discurso, e em especial na pesquisa de que aqui tratamos.

3. Estudos críticos do discurso e a análise discursiva crítica na categoria de modalidade

Além do suporte teórico dos estudos decoloniais e dos estudos de gênero, também utilizamos conceitos e ferramentas analíticas oferecidas nos estudos críticos do discurso (ECD), para investigar, com base na análise situada de textos, a ação discursiva na rede social Instagram da ONU Mulheres, entidade ligada à Organização das Nações Unidas e que tem atuação no Brasil, diante do crescimento da violência doméstica durante a pandemia da Covid-19. Analisamos especificamente as modalizações nos textos dos posts do órgão, buscando cruzar essa ferramenta analítica às noções de colonialidade de gênero e interseccionalidade.

Em Discurso e mudança social (2001), Norman Fairclough concebe linguagem como uma forma de prática social, sendo o discurso um modo de agir sobre o mundo e sobre os outros, implicando a seguinte relação entre discurso e a estrutura social:

O discurso contribui para a constituição de todas as dimensões da estrutura social que, direta ou indiretamente, o moldam e o restringem: suas próprias normas e convenções, como também relações, identidades e instituições que lhe são subjacentes. O discurso é uma prática, não apenas de representação do mundo, mas de significação do mundo, constituindo e construindo o mundo em significado (Fairclough 2001, 91).

Na citação, estão presentes algumas das noções teóricas basilares nessa perspectiva dos estudos críticos do discurso: estruturas, práticas e eventos. Em um mapa ontológico do funcionamento social da linguagem que parte dos modelos de pesquisa crítico-realista de Bhaskar (1998) e discursiva de Chouliaraki e Fairclough (1999), Resende (2017) posiciona, no estrato do potencial, estruturas e práticas sociais, e, no estrato do realizado, eventos materializados num dado espaço-tempo, conforme a figura:

Figura 1. Resende (2017).

Os textos dos posts da ONU Mulheres, que estão no estrato realizado como parte de eventos discursivos em suporte digital, serão analisados para buscar compreender as questões levantadas na introdução deste artigo. Por meio dos textos e imagens dos posts, entendidos como eventos discursivos ligados a práticas sociais, é possível acessar “traços da ação individual e social que lhe deu origem e de que faz parte” (Vieira e Resende 2016, 22) e, assim, compreender o funcionamento da prática analisada. Interessa-nos, conforme já antecipado na seção anterior, observar como as estruturas de classe-gênero-racialidade-sexualidade se entrecruzam em discursos-estilos e gêneros-suportes, ensejando os textos que materializam também certas ações-relações, representações-identificações.

Para isso, mostrou-se produtiva a aplicação da categoria modalidade. Fairclough (2003, 166) entende que “aquilo com que você se compromete é uma parte significativa do que você é —portanto, as opções de modalidade em textos podem ser vistas como parte do processo de texturizar a autoidentidade”. O que a modalidade agrega de sentido a um discurso é importante não somente para a função identificacional da linguagem, mas também para a ação discursiva e a representação, pois gêneros-suportes e discursos-estilos são interconectados, separados apenas para a construção teórica e metodológica, mas nunca apartados na realidade.

Ao discorrer sobre esta categoria, Fairclough (2003) teve como base estudos de Halliday, para quem, por meio da linguagem, interagimos com outras pessoas no dia a dia para estabelecer e manter relações. Segundo Halliday (2014), esta interação, ou troca, entre os participantes acontece por meio de funções de fala. As duas principais —oferecer e solicitar— podem se realizar a partir da natureza do que está sendo trocado: informações ou bens e serviços. Essas duas variáveis, quando tomadas em conjunto, definem as quatro funções principais de fala: oferta, comando, declaração e pergunta. Estas, por sua vez, são correspondidas por um conjunto de respostas desejadas: aceitar (ou não) uma oferta, executar (ou não) um comando, reconhecer (ou não) uma declaração e responder (ou não) a uma pergunta (Halliday 2014, 135)7.

A modalidade denota significados relacionados ao julgamento, tomada de posição e ponto de vista das pessoas quando agem discursivamente nesses movimentos. Pode ser expressa nos seguintes graus: probabilidade, usabilidade, obrigação e inclinação. A modalidade epistêmica ocorre quando há troca de conhecimento/informação, quando “as informações podem ser expressas em graus de probabilidade ou usualidade” (Fuzer e Cabral 2014, 114).

Já a modalidade deôntica prevê ofertas ou comandos. “Em comandos, há graus de obrigação (...) em ofertas, há graus de inclinação” (Fuzer e Cabral 2014, 115). Essa categoria também pode indicar graus de julgamento das pessoas sobre o que dizem, que pode ser classificado como baixo, médio e alto. De acordo com Silva (2010):

A modalidade envolve vários graus e escalas, dependendo do grau de certeza expresso pelo falante sobre a validade de uma proposição ou o grau de pressão para que alguém realize uma ordem. Também pode expressar o grau de comprometimento do falante em relação à validade do que diz. Isso tem implicações importantes na análise de distintos gêneros. As proposições podem indicar o grau de responsabilidade do falante que pode expressar o seu ponto de vista de maneira subjetiva, ou pode expressá-lo de maneira objetiva, para que pareça ser uma qualidade do próprio evento (Silva 2010, 72).

Para dar vazão a esta dimensão discursiva, Fairclough (2001, 200) aponta que a modalidade pode se manifestar para além das palavras que funcionam como operadores da modalização, como verbos modais, adjuntos modais, grupos adverbiais e também algumas expressões que denotem noções de probabilidade ou usualidade. Os tempos verbais e as indeterminações também estão entre as possibilidades de operação dos mecanismos de modalidade nos textos. O uso do presente do indicativo, por exemplo, pode ser interpretado como uma modalidade categórica.

Com este entendimento sobre a categoria de modalidade, passamos na próxima seção à análise dos dados.

4. Análises

Neste artigo —parte de um estudo mais amplo— o foco é a ação discursiva sobre a escalada da violência doméstica nos posts do Instagram da ONU Mulheres. Analisamos, a seguir, como a modalidade nos textos está dialeticamente conectada com a ação discursiva da instituição, constituindo-0se mutualmente. Para isso, organizamos a seção analítica em duas subseções: análise estrutural e análise interacional. A primeira etapa corresponde à uma macroanálise realizada a partir da primeira aproximação com os textos e traz informações sobre a presença digital no Instagram do organismo internacional, assim como o conteúdo veiculado e o esforço comunicacional da conta institucional. A segunda concentra-se na análise textual.

4.1. Análise estrutural

A prática social em que se situa o recorte que compõe o corpus para este artigo é a prática de produção de conteúdo digital, de perfil institucional de organismo internacional, em rede social —neste caso, o perfil da ONU Mulheres no Instagram. A análise das postagens identificou os objetivos comunicacionais do organismo internacional como sendo a promoção de ações institucionais do órgão e de seus parceiros; campanhas informativas e serviços.

Os textos analisados são materializados no gênero-suporte (Resende 2017) post de rede social, cujas possibilidades e limitações podem variar de uma rede para outra, mas que também correspondem a um modo relativamente estável de interação em práticas sociais. Há linguagem tanto verbal quanto não-verbal nos posts coletados. As legendas são compostas por linguagem verbal e os banners que ilustram os posts são compostos por linguagens visual e verbal. Há coesão e complementariedade de informação entre os elementos constituintes para atingir os objetivos comunicacionais da organização.

Como se trata de uma conta oficial de um organismo internacional em rede social, os textos não são assinados, sendo a autoria atribuída à instituição. A produção desses conteúdos requer perfis profissionais específicos, com capacidade técnica para executar a produção das peças visuais e audiovisuais (banners e vídeos), assim como os textos das legendas dos posts —trata-se, portanto, de uso profissional de tecnologias discursivas. A análise das postagens aponta também que há um planejamento de conteúdo para o perfil, com objetivos comunicacionais específicos, delineados para programação, produção e publicação dos conteúdos digitais. Para a circulação do conteúdo digital, são necessários, em termos da atividade material: computador ou celular, acesso à internet e conta aberta no Instagram. Além do texto para a legenda, também são produzidos na atividade banners, textos para compor as imagens, vídeos, textos para legendagem dos vídeos.

A audiência primária do conteúdo do perfil da ONU Mulheres no Instagram são as/os 242 mil seguidoras/es do perfil (números de 30 de abril de 2021). No entanto, usuárias e usuários do Instagram que busquem pelos termos das hashtags (#VozesDasMulheresSobreCovid19 #RespostaCovid19 #coronavírus) também poderão encontrar os posts. O conteúdo pode, ainda, ser compartilhado a partir do Instagram para outros suportes, como WhatsApp, Facebook, Twitter, etc.

4.2. Análise interacional

Os 28 posts selecionados para análise neste artigo foram publicados no perfil no Instagram da @onumulheresbr entre os dias 15 de março e 31 de julho de 2020. O Instagram é um aplicativo de rede social lançado há 10 anos que se firmou pelo seu apelo ao conteúdo visual, com foco, primeiramente, em fotos e, posteriormente, também em vídeos. Ao longo dos anos e com ascendente popularidade, o app passou a disponibilizar novas funcionalidades. Hoje, para publicar um post, é necessário fazer o upload de um arquivo de imagem ou de vídeo, com a opção de inserir ou não legendas. No caso do perfil analisado, tanto o conteúdo visual quanto o textual são bem explorados. Contudo, para esta análise, o escopo será o conteúdo textual da legenda e dos banners estáticos que trazem texto em sua composição.

Numa macroanálise inicial dos textos coletados, com o objetivo de mapear a ocorrência das principais palavras dentro do assunto levantado nos posts (violência doméstica contra mulheres no contexto da pandemia da Covid-19), a figura 2 foi elaborada com auxílio de um software online de produção de nuvens de palavras:

Figura 2. Nuvem de palavras: conteúdo verbal das publicações de @onumulheresbr (elaboração própria).

A nuvem aponta que as palavras mais frequentes nos posts analisados foram: mulheres (100), violência (59), contra (24), doméstica (20), pandemia (18), gênero (15) e coronavírus (14). Essas primeiras palavras são analiticamente pouco significativas, já que sua alta frequência decorre da própria decisão metodológica do estudo, na delimitação do corpus por critério temático. Além delas, também estão entre os léxicos mais utilizados as palavras negras (14), situação (14), resposta (9), social (9) e apoio (8), mais significativas porque permitem desenhar sentidos específicos que aqueles temas (violência, mulheres, covid) ganham nas publicações estudadas. A partir deste levantamento, iniciamos de forma mais atenta a microanálise dos posts, sempre com atenção ao contexto em que as palavras mais frequentes apareciam nas frases.

A legenda do post a seguir, publicado em 24 de março de 2020, é iniciada por uma pergunta que traz dados de fonte não identificada seguida de oração com modalidade epistêmica de probabilidade (destaque nosso): “Medidas de isolamento devido ao #Covid19 podem aumentar os riscos de violência doméstica”. A presença de modalidade na oração projeta o que pode acontecer de negativo com as mulheres em isolamento devido à emergência mundial de saúde. A organização se coloca, dessa forma, na posição de conhecimento, e, portanto, de capacidade de previsão do futuro, de alerta social.

O que na postagem anterior se projeta a partir de conhecimento de fonte não explicitada, e tomado então como conhecimento legítimo ou universal, é amplificado no post a seguir, em que a emergência da violência contra mulheres e meninas já não é uma projeção de futuro, mas uma demanda (“indispensável”) de prevenção:

Figura 3. Banner em publicação de @onumulheresbr de 24/03/2020 (conta de @onumulheresbr no Instagram).

No texto do banner, a modalidade é deôntica de obrigação: “É indispensável oferecer serviços de atenção a mulheres vítimas/sobreviventes de violência durante a pandemia e desenvolver modalidades que facilitem o acesso delas aos serviços” (destaques nossos). A oração apresenta alto valor de julgamento ao utilizar modalidade categórica do presente do indicativo (“é”) e ao apontar a necessidade (“indispensável”) de continuar oferecendo rede de apoio a vítimas de violência de gênero. Essa necessidade encontra suporte no comentário de @onumulheres (na imagem, na lateral esquerda) sobre a experiência de violência das mulheres latinas e caribenhas. O comentário se inicia com “Você sabia que”, o que aponta uma autoidentificação baseada em conhecimento por parte da organização, é uma modalidade epistêmica (socialmente apreciada) de oferta de informação. No entanto, tanto a forma de se referir às mulheres em situação de violência quanto aos serviços que elas devem procurar são muito vagas. Não há um direcionamento concreto para qual serviço procurar e a reflexão sobre a possibilidade de acesso a esse serviço por parte de todas as mulheres. Essa superficialidade é um padrão encontrado em nossa análise que vamos discutir ao longo desta seção.

No que se refere às modalizações presentes no corpus estudado aqui, foram mapeadas instâncias modais não polares em 28 posts, sendo: 18 do tipo epistêmica de probabilidade; 11 deôntica de obrigação; e uma ocorrência de modalidade epistêmica de usualidade. Este levantamento apontou os primeiros indícios de comprometimento com as informações repassadas pela ONU Mulheres nas publicações no Instagram e que o reforço discursivo também inclui indicações de necessidades e obrigações.

O quadro a seguir organiza excertos do mapeamento de modalidades epistêmicas em nossa análise. Adiante também são organizados fragmentos de textos em que mapeamos modalidades deônticas.

A

Medidas de isolamento devido ao #COVID-19 podem aumentar os riscos de violência doméstica.

B

O impacto econômico da pandemia Covid-19 pode dificultar que uma mulher deixe o parceiro violento, assim como pode aumentar o risco de exploração sexual.

C

Elas estão mais expostas à violência de gênero e ao tráfico. Estes riscos podem aumentar devido às restrições de mobilidades internas e externas e à falta de documentação, o que torna mais difícil o acesso delas a serviços de saúde e medicamentos.

D

Neste momento de necessária reclusão, as mulheres podem estar sujeitas à violência de maridos, companheiros.

E

O risco de violência contra as mulheres tende a aumentar quando famílias em contextos de violência domésticas são colocadas sob tensão, isolamento e quarentena.

F

O distanciamento social não pode significar isolamento nem abandono das mulheres.

G

O confinamento pode fazer com que situações de violência doméstica ou exploração sexual contra as mulheres apareçam ou piorem.

H

Essas maravilhosas aqui em cima, são algumas das integrantes do Comitê de Mulheres Negras rumo ao planeta 50-50 em 2030. Este projeto, que é parceiro da @onumulheresbr, vem pensando em sustentabilidade no mais amplo sentido da palavra e priorizando a vida das mulheres negras, que é comprovadamente o grupo que vem sendo mais afetado diante da pandemia por Covid-19.

Quadro 1. Mapeamento de modalidades epistêmicas de probabilidade no corpus (destaques nossos; elaboração própria).

No quadro 1, organizamos oito das orações em que há modalidade epistêmica de probabilidade, apontando comprometimento com a verdade sobre o que é discutido em relação ao problema social da violência doméstica. A definição de modalidade epistêmica como “comprometimento com a verdade” deve ser entendida com ressalvas: a perspectiva de verdade ou falsidade de uma afirmação factual é sempre posicionada. Portanto, quando usamos este termo, estamos identificando a estratégia discursiva de modalidade utilizada para que informações sejam representadas como (mais ou menos) verdadeiras.

Esta seleção acima foi feita para agrupar os fragmentos em que o principal foco da ação discursiva é alertar para os efeitos da pandemia da Covid-19 na vida de mulheres. Entre as possíveis consequências, algumas já registradas oficialmente por órgãos públicos, estão: aumentar riscos de violência doméstica (A); aumentar o risco do parceiro se tornar violento e de exploração sexual (B); maior exposição à violência de gênero e ao tráfico (C); aumento do risco de violência por parte de maridos e companheiros (D); aumento do risco de violência contra mulheres (E); aumento de abandono de mulheres (F); surgimento ou agravamento de situações de violência doméstica e exploração sexual (G); atentado à vida de mulheres negras, o grupo mais afetado na pandemia (H). A modalização epistêmica de probabilidade mais frequente nesses casos é com “poder” (ou “tender”), vinculado a “aumentar”, “dificultar”, “estar sujeita” e o léxico do risco. Há também modalidade categórica em C, com o uso do presente do indicativo (“estão” e “torna”). Assim, o que essas modalizações realizam é ênfase sobre situações de violência já postas, em termos de tendência diante das limitações impostas pela pandemia, seja pelo necessário isolamento, seja pela precariedade anterior e agora agravada.

Os principais fatores, de acordo com os textos, para a escalada de violência contra mulheres são identificados como: medidas de isolamento; impacto econômico; restrições de mobilidade; reclusão; contextos de tensão, isolamento e quarentena; distanciamento social e confinamento. Os textos da ONU Mulheres atribuem relação de causalidade entre o contexto de isolamento e o aumento da violência doméstica, sem um aprofundamento maior sobre a raiz do problema social da violência de gênero. Em apenas um dos casos destacados acima (excerto H) há reconhecimento da violência interseccional.

Numa escala de força argumentativa com modalidade epistêmica, podemos apontar como maior comprometimento com a verdade justamente o trecho em H, com o advérbio “comprovadamente” sendo um operador modal enfático. A instituição defende que a vida de mulheres negras deve ser priorizada, por ser o grupo mais afetado pelos efeitos da pandemia. Neste excerto, o reconhecimento da interseccionalidade, ou seja, do atravessamento de estruturas de poder em mulheres negras, é o que respalda a força argumentativa na ONU Mulheres.

Já o trecho em que há menos força na modalidade epistêmica seria E, pois o verbo “tender” sugere menor probabilidade do que “poder”, empregado nos outros casos. O verbo modal “poder” foi empregado seis vezes com força argumentativa de consternação e preocupação. Apesar dessa força argumentativa de consternação, o elemento modalizador mitiga o fato já então presente do aumento da violência, que é expresso não como fato já concretizado, mas como probabilidade. As exceções são os trechos em F e em H. No primeiro caso, a modalização aqui é articulada à negação (“não pode significar”), o que funciona como uma chamada à intervenção social; no segundo caso, já vimos, a modalidade epistêmica é de reforço da realidade narrada sobre a violência que se reconhece como “afetando” as mulheres negras especialmente.

Nestes exemplos analisados de modalidades de probabilidade, a fonte das informações é a ONU Mulheres. Como organismo internacional ativo do campo dos direitos humanos das mulheres, que reúne especialistas no tema, esta autoria nos textos traz o peso da autoridade da própria instituição.

No quadro a seguir, estão reunidos trechos em que há ocorrência de modalidade epistêmica retirados de posts que divulgam canais de denúncias contra violência doméstica e conscientizam sobre o apoio às mulheres em situação de violência.

I

Ah, você pode me acionar também no Google Assistente. Basta dizer: Ok, Google, falar com Robô ISA.

J

Bate-papo será sobre violência doméstica e familiar em tempos de pandemia #Covid19 e sobre a ISA.bot, robô que pode ser acessada no Messenger da Página IsaBot no Facebook, e ativada, por escrito ou verbalmente, por “OK Google, falar com Robô Isa” no Google Assistente.

K

Então, se você conhece alguém ou você mesma está passando por alguma situação de violência e não sabe o que fazer ou a quem recorrer, eu posso te orientar.

L

Somos todas e todos responsáveis e podemos apoiá-las e oferecer ajuda.

M

Em tempos de distanciamento social, você pode fazer a diferença positiva em acolher e apoiar as vítimas da violência doméstica e familiar.

Quadro 2. Mapeamento de modalidades epistêmicas no corpus (destaques nossos; elaboração própria).

Os trechos I, J, K, L, M também apresentam modalidade epistêmica de probabilidade a partir do uso do verbo “poder”, mas o emprego desta força argumentativa direciona não só para conscientizar e contextualizar a atual situação no contexto social no momento de emergência mundial de saúde, mas também corresponde a um chamado para agência individual e coletiva.

I, J e K são textos extraídos de posts cuja ação discursiva principal é de divulgação da ferramenta online ISA.bot, que recebe denúncias de violência doméstica contra mulheres. Em I e K, é a voz do robô que apela à audiência em primeira pessoa (“me”, “eu”), apresentando-se e explicando o funcionamento da ferramenta, além de instigar a audiência a denunciar casos suspeitos de violência contra mulheres. Os fragmentos L e M também agem discursivamente no sentido de conscientizar sobre o contexto de pandemia e a importância de apoiar, oferecer ajuda e acolher vítimas da violência doméstica. De acordo com L, “somos todos e todas responsáveis”, uma modalidade categórica, portanto devemos agir. Nesses dois excertos, trata-se então de convocar à ação, o que faz com que a modalidade epistêmica esteja de fato realizando uma força deôntica.

No quadro seguinte, estão organizados alguns trechos em que há modalidade deôntica de obrigação, que aponta o grau de necessidade de ações preventivas e enérgicas:

N

É indispensável oferecer serviços de atenção a mulheres vítimas/sobreviventes de violência durante a pandemia e desenvolver modalidades que facilitem o acesso delas aos serviços.

O

Trabalhadoras do setor de saúde, trabalhadoras domésticas, mulheres na economia informal, migrantes, refugiadas e mulheres em situação de violência são algumas das mulheres mais expostas ao COVID-19 e precisam ser envolvidas em todas as fases da resposta e nas tomadas de decisão nacionais e locais.

P

O que governos, empresas, meios de comunicação e sociedade civil devem fazer para responder à crise?

Q

Que ações devem tomar governos, empresas, sociedade civil e meios de comunicação na resposta ao aumento da violência contra as mulheres, resultado do distanciamento social?

R

Todas e todos temos de agir para proteger as mulheres em situação de violência.

S

Priorizar medidas de prevenção à violência contra mulheres e meninas e fornecer assistência a elas, deve ser parte central das ações de resposta à pandemia da #COVID19.

T

Responder às necessidades das mulheres em situação de violência deve ser prioridade de todas as pessoas.

U

#FicaEmCasa é uma recomendação que todes devemos seguir, mas sabemos que a casa também é um lugar perigoso para muitas mulheres.

V

Devemos enfrentar o racismo denunciando o tratamento desigual por parte de órgãos ou pessoas que prestam serviços de saúde e de proteção social, pois no polo inferior estão as mulheres negras.

Quadro 3. Mapeamento de modalidades deônticas de obrigação no corpus (destaques nossos; elaboração própria).

De acordo com os fragmentos acima, a ação discursiva evidencia o posicionamento da ONU Mulheres de que providências (com uso do léxico “resposta”) devem ser tomadas por parte de: serviços de atenção a mulheres vítimas/sobreviventes de violência; autoridades nacionais e locais; governos, empresas, meios de comunicação e sociedade civil. Há diversas instâncias, contudo, em que o ator da ação demandada não é estabelecido ou é um ator geral (todes), inespecífico. Há demanda de ação, mas ela não se dirige a uma responsabilidade que possa ser reconhecida, na maioria dos casos.

Nos excertos O e S, há nova ocorrência de reconhecimentos à violência interseccional pelos modos de referência às mulheres. Como ações a serem priorizadas estão: oferecer serviços de atenção a mulheres vítimas/sobreviventes de violência durante a pandemia e desenvolver modalidades que facilitem o acesso delas aos serviços; envolver trabalhadoras do setor de saúde, trabalhadoras domésticas, mulheres na economia informal, migrantes, refugiadas e mulheres em situação de violência são algumas das mulheres mais expostas ao COVID-19 em todas as fases da resposta; priorizar medidas de prevenção à violência contra mulheres e meninas e fornecer assistência a elas; responder às necessidades das mulheres em situação de violência; denunciar o tratamento desigual por parte de órgãos ou pessoas que prestam serviços de saúde e de proteção social às mulheres negras. Há também os casos em modo interrogativo, nos quais as ações demandadas não são esclarecidas, ficando claro apenas que alguma ação deve ser tomada.

A partir do uso dos verbos “dever”, “precisar” e “ter de”, o organismo aponta para a responsabilização de instituições e atores sociais, com alto grau de obrigatoriedade para as ações a serem tomadas sugeridas pela ONU Mulheres, como “temos de agir para proteger as mulheres em situação de violência”. Esses processos pedem por medidas para que os efeitos da pandemia parem de recair sobre as mulheres. Como as atribuições de responsabilidade são muito genéricas (todes, nós ou enumerações que abarcam um conjunto bastante amplo de atores), o que se estabelece é uma responsabilidade geral, ampla, e por isso pouco apelativa a setores ou autoridades mais específicas.

Ainda assim, em colocações como “devemos enfrentar o racismo”, o verbo “dever” potencializa o verbo “enfrentar”, denotando também uma alta carga de obrigatoriedade no posicionamento institucional nos textos. Outras formações verbais encontradas no Quadro 3 vão nesta mesma direção: “precisam ser”, “devem fazer”, “devem tomar”, “temos de agir”, “devemos seguir”. Os casos elencados no quadro apontam o aparente paradoxo entre expressões de alta modalidade e ações/atores genéricos, o que mitiga o efeito apelativo dessas modalidades.

5. Reflexões finais

Retomamos agora o objetivo principal que ensejou o artigo, que é investigar o grau de comprometimento do discurso da ONU Mulheres nos textos analisados. A presença de modalidade no corpus analisado (28 posts) neste artigo registra maior realização do tipo epistêmica de probabilidade (18), seguida do tipo deôntica de obrigação (11) e uma ocorrência de modalidade epistêmica de usualidade.

A elevada ocorrência de modalização epistêmica e deôntica aponta alto grau de comprometimento com as informações e posicionamentos comunicados e com a necessidade de que as recomendações apresentadas pela instituição sejam seguidas, auxiliando a consolidar o discurso institucional que permeia de modo transversal as publicações.

Quanto à modalidade epistêmica, é possível observar uma relação de causalidade entre o contexto de isolamento e o aumento da violência doméstica atribuída no discurso da ONU Mulheres, mas sem um aprofundamento maior sobre a raiz do problema social da violência de gênero e com poucas alusões à violência interseccional.

Já na análise de orações com modalidade deôntica, o uso dos verbos “dever”, “precisar” e “ter de” auxilia o organismo a apontar para a responsabilização de instituições e atores sociais, com alto grau de obrigatoriedade para as ações sugeridas pela ONU Mulheres. Esses processos pedem por medidas para que os efeitos da pandemia parem de recair sobre as mulheres. No entanto, há recorrência de ações e atores genéricos, o que tem um efeito mitigador da apelação.

Como organismo internacional de grande poder simbólico, político e econômico, a ONU Mulheres tem o potencial de ser um importante ator social para o combate à violência de gênero no mundo, embora ainda simbolize a forte influência dos Estados Unidos na geopolítica internacional. Por isso, sua ação não pode se limitar a manter discursos já conhecidos, muito menos figurar como obstáculo para superar a violência de gênero. Nossa investigação aponta ausências importantes na ação discursiva da instituição no Instagram na busca dessa agenda colaborativa e vamos debatê-las também reconhecendo nosso papel de colaboração para que a prática social analisada (produção de conteúdo digital no Instagram de um organismo internacional) seja um meio de superar o problema da violência de gênero.

Sabemos que a escalada de violência doméstica durante a pandemia é um problema global, mas acreditamos que sua abordagem deve ser conectada à realidade local para que a ação discursiva seja menos limitada. Como já foi apontado, os aspectos da violência doméstica foram discutidos pela ONU Mulheres, na maioria das vezes, de forma genérica, sem aprofundamento sobre suas causas, e isso indica, entre outros fatores, a baixa recorrência de reflexões sobre a violência interseccional registrada no Brasil neste contexto de pandemia.

Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021 apontam que a violência de gênero no Brasil é interseccional: mulheres negras representam 61,8% das vítimas de feminicídio em 2020; 36,5% de vítimas fatais são brancas; 0,9%, amarelas; e 0,9%, indígenas. Do total de vítimas, 74,7% têm entre 18 e 44 anos. As mulheres jovens, pardas e pretas também foram as que mais registraram ocorrência de casos de violência doméstica recebidos pelos canais de denúncia do governo federal em 2020 (Ligue 180 e Disque 100)8. É preciso que estes dados sobre violência interseccional fiquem em primeiro plano, não sejam esquecidos, nem normalizados. A experiência das mulheres brasileiras deve ser o fio condutor para propor essa discussão. Não podem ser ignoradas também a história do Brasil, colonial e escravocrata por séculos, e a necessidade de reparação da injustiça social consequência deste modelo de exploração. Este entendimento sobre as raízes do problema social estudado a partir do contexto brasileiro poderia potencializar a ação discursiva da ONU Mulheres, aprofundando o engajamento e comprometimento.

Isso implica basear o planejamento de comunicação da prática analisada em dados locais, perfis de pessoas em situação de violência brasileiras, vozes localizadas, contexto local, manifestação da violência interseccional local, etc. Esta preocupação deve ser uma constante em todas as publicações.

Este obstáculo se relaciona com outro: o paradoxo entre expressões de alta modalidade e ações/atores genéricos, o que mitiga o efeito apelativo na ação discursiva. Em várias publicações analisadas, a voz institucional da ONU Mulheres se impõe com bastante afinco para chamar atenção para a violência doméstica contra mulheres, mas constatamos que a falta de endereçamento de ações e nomeação de atores sociais atenua a força argumentativa, restringindo seus potenciais efeitos. Ao colocar pressão para que alguém faça algo, é necessário elucubrar sobre quem deve fazer o quê. É de nosso conhecimento que as postagens têm objetivos diversos e não devem se limitar à cobrança de ações. Porém, nas publicações em que o foco é chamar atenção para a necessidade de tomadas de decisão ou mudança de direcionamento de ações, é necessária a preocupação em como atribuir responsabilidades no lugar da escolha pela responsabilização não específica.

Isso nos leva a outro ponto de reflexão: as possibilidades e limites do gênero-suporte analisado (postagens na rede social Instagram). Avaliamos que a presença digital da ONU Mulheres é sólida e foi construída a partir de uma ação comunicacional profissional, como discorremos em nossa análise estrutural, mesmo o Instagram impondo possibilidades finitas e com limitação de espaço para a publicação de textos verbais e visuais. Esses limites são sublimados a cada dia pela criatividade dos produtores de conteúdo desta rede social. Portanto, também é importante ficarmos atentas a este outro contexto (o digital) para possibilitar o uso de todos os recursos semióticos no Instagram.

Com estas reflexões, feitas a partir da análise apresentada e discutida, buscamos contribuir para a melhor compreensão da prática de produção de conteúdo digital no Instagram sobre problemas sociais no contexto brasileiro.

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1 Entendemos que a violência doméstica não é restrita à violência de homens contra mulheres, pois extrapola os limites da cisheteronormatividade. Contudo, neste trabalho concentramos o olhar sobre a violência doméstica praticada por homens contra mulheres.

2 A nota técnica “Violência Doméstica durante a pandemia de covid-19” pode ser acessada emhttps://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2018/05/violencia-domestica-covid-19-v3.pdf. Acessada em 27 de abril de 2021.

3 Informações da notícia “COVID-19: Mulheres à frente e no centro”, sobre Declaração de Phumzile Mlambo-Ngcuka, vice-secretária geral da ONU e diretora executiva da ONU Mulheres, podem ser acessadas em http://www.onumulheres.org.br/noticias/covid-19-mulheres-a-frente-e-no-centro. Acessado em 16/11/2020.

4 Informações da notícia “Em média, mulheres dedicam 10,4 horas por semana a mais que os homens aos afazeres domésticos ou ao cuidado de pessoas” podem ser acessadas em https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/27877-em-media-mulheres-dedicam-10-4-horas-por-semana-a-mais-que-os-homens-aos-afazeres-domesticos-ou-ao-cuidado-de-pessoas. Acessado em 16/11/2020.

5 As Nações Unidas no Brasil: https://brasil.un.org/pt-br/about/about-the-un. Acessado em 21/08/2021.

6 Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/5. Acessado em 21/08/2021.

7 Os movimentos interativos da linguagem na Linguística Sistêmico-Funcional são realizados dentro do sistema de MODO. As orações neste sistema podem se apresentar como sendo interrogativas, declarativas e imperativas, e são constituídas de dois componentes: o modo e o resíduo. Neste primeiro componente, estão o sujeito e o finito da oração. O sujeito é quem pratica uma ação e o finito é o componente que traz os sinalizadores de tempo, polaridades (positiva ou negativa) e modalidade (entre o sim e o não) dos falantes.